Tal como em Toy Story os brinquedos ganham vida e consciência, também George Orwell em o “Triunfo dos Porcos” dá voz e consciência aos animais da quinta. Numa realidade bastante diferente e em contextos opostos, encontramos em Orwell uma fábula complexa, que apela sensibilidade ao leitor que folheia o seu livro, para que este consiga entender que aquilo que lê não passa de um retrato daquilo que vive fora daquelas subtis páginas. Escrito em 1945, como crítica à revolução Comunista em 1917 na Rússia, é uma obra que fica na memória, intemporal, por mais que o tempo passe fará sempre sentido. Como tal, é uma obra que se enquadra em qualquer padrão que possa ser definido para descrever o que é a tão complexa Cultura.

Dentro de uma quinta bastante tradicional, comum, os animais apenas produzem, trabalho de sol a sol, não passam de formas de sustento da humanidade e, os humanos lucram com o trabalho forçado dos pobres animais.

Tal como uma greve de trabalhadores nos dias de hoje, encontramos uma revolução pela quinta, onde os animais se empoderam de coragem e atingem quem os mal trata, o homem. Homem este que os alimenta mal, apenas com uma ínfima parcela daquilo que os animais efetivamente produzem. Chicoteiam. Berram. Assim como os deixam dormir sob condições meteorológicas nada agradáveis. No fundo, o homem só quer saber dele, da sua sobrevivência na Terra, o resto pouco importava.

Após um sonho do velho e respeitado Major, já quebrado pelo tempo que correu nele, conta o seu sonho a todos os animais, onde os mesmos seriam libertos desta escravidão, que tinha por inimigo o homem. Tomando conta da situação, os animais organizados mandam de lá para fora os homens, e prometem tratar-se bem, trabalhar apenas e só o necessário para o sustento, comida nunca iria faltar a nenhum animal! Um sonho, uma utopia, na verdade.

Será isso muito diferente de lutar por condições de trabalho melhores? Lutar para que quem está no poder olhe para lá do seu umbigo?

Mas o problema não está no homem, mas em alguns. Os poderosos. E isso percebemos no desenrolar do dia a dia desta fábula.

Os animais conquistaram a quinta e tinham tudo para que o sonho do velho Major fosse concretizado ao estilo da Disney, com um final feliz. Mas o poder sobe e alimenta um ego que não se quer ver rebaixar. Surge a “Quinta dos Animais”, onde a felicidade, o hino e a paz viram estilos de vida. A inveja paira noutras quintas, pela capacidade de organização e a vitória que os animais obtiveram.

O que os animais não contaram, é que alguns fossem mais animais que outros. E isso é um pouco como nos dias de hoje, lutamos por igualdade, mas apenas quando nos toca na pele, porque quando o assunto é do vizinho, o problema que se resolva sozinho. Na quinta, os porcos eram inteligentes, mandavam, davam ordens, alteraram ideais por conveniência. Quem lambia botas estava safo, quem não, que Deus estivesse com ele. Quem faz o bem, não o idolatra por atenção. Sabe apenas, que a sua parte no mundo estará cumprida um dia. Afinal, todos viemos cumprir algum objetivo.

Assim, o “Triunfo dos Porcos”, é uma crítica social no seu fundo, mudamos de partido, mudamos de figura de poder, mas vivemos em loop neste andamento social a que chamamos vida, e tudo, graças a uma arte antiga de bem falar. Por algum motivo já na antiguidade clássica Platão não tinha por admiração e agrado os sofistas.

E assim, uma crítica com anos, enquadra-se nos dias de hoje, devíamos ler com mais atenção os termos e condições impostos pela vida.