Um ano após o início da nova fase da tensão russo-ucraniana, a revista The economist informou que o contingenciamento de energia entre maio de 2022 e maio de 2023 havia eliminado mais europeus que a crise sanitária de Covid-19.
Essa informação causou espanto em toda parte. Na Europa sobretudo, mas especialmente fora dela. Acreditava-se que, após o choque inflacionário do início do conflito, tudo havia sido resolvido, notadamente entre europeus. Imaginava-se que produtos alternativos tivessem sido postos à disposição de todos. Entendia-se que, após um ano, a letalidade do conflito estivesse circunscrita ao chão de batalhas euroasiático. Mas, não. Pelo visto, não.
Os insumos energéticos russos foram sendo substituídos por outros provenientes do resto do mundo. Especialmente dos Estados Unidos da América. Mas vieram a preços impeditivos aos europeus. Preços que os cidadãos comuns não conseguiam saldar.
Diante disso, começou-se a perceber a extraordinária dependência frente aos hidrocarburos russos. Notadamente do gás natural.
O impacto da redução ou ruptura integral do fornecimento desse gás a variados países europeus pôde ser notado em variadas áreas. Desse a produção industrial até realidades domésticas.
De maneira que, se a crise de 2020-2021 avivou a necessidade de criação ou restauração de alguma soberania sobre produtos sanitários, o contencioso eslavo lembrou a todos – não simplesmente aos europeus – da necessidade de soberania energética. Um fundamento decisivo para das nações. Perscrutado desde a noite dos tempos e reorientado a partir da Revolução Industrial.
A Revolução Industrial, iniciada no século XVIII, ampliou a produtividade, a produção e a demanda por insumos energéticos. O século XIX internacionalizou as tendências inicialmente inglesas e depois europeias. Pouco a pouco o mundo inteiro submergia ao encanto das máquinas, do maquinário, da produção e da produtividade. Nesse sentido, novas fontes de energia passaram a ser diuturnamente procuradas.
Como tudo tende a ter um começo modesto, a descoberta do petróleo se deu de maneira rudimentar.
O ano era 1854 e o local, os Estados Unidos da América. George Bissel, um advogado de Nova Iorque, considerou que o “óleo de Sêneca” encontrado e distribuído no noroeste do estado da Pensilvânia poderia substituir o óleo de baleia e de cachalote em vias de extinção. Sem maiores questionamentos, encarregou o reputado químico Benjamim Silliman para analisar as potencialidades do produto. Das primeiras impressões adveio a convicção de que o novo óleo poderia, sim, substituir os demais como fonte de energia além de parecer ser bastante útil como lubrificante de máquinas. Especialmente as têxteis em amplo uso na época.
Logo em seguida, o químico considerou relevante a destilação e o fracionamento dos componentes do produto a partir da variação de temperatura e condensação. Entusiasmados com os resultados, George Bissel e Benjamim Silliman lançaram as bases para a criação da Seneca Oil Company. Nada mais nem menos que a primeira companhia de petróleo que se tem notícia. Um empreendimento do empresário James Townsend. Restava saber se o produto era viável, abundante, constante. Em confirmação dessas hipóteses, no dia 27 de agosto de 1959, o coronel Edwin Drake perfurou o primeiro poço de petróleo na cidade de Titusville, também na Pensilvânia para demonstrar que a possível abundância do produto. Estava, assim, inaugurada a temporada infinita de caça ao ouro negro.
Pensilvânia em 1859, Cáucaso do Norte em 1883, Sumatra em 1885, Texas em 1901, Oklahoma em 1908 e México em 1910. Em seguida, o mundo inteiro virou o limite. 150 anos depois do achado George Bissel e Benjamim Silliman, mais de 120 países do mundo possuem algum tipo de exploração de petróleo em seu território.
Superadas as dúvidas e hesitações do primeiro momento, novos desafios foram se impondo. Multiplicar a produção e o acesso ao novo produto foi o propósito de toda uma geração de norte-americanos. Poucos anos depois da fundação da Seneca Oil Company e da perfuração do primeiro poço de petróleo, John D. Rockefeller percebeu a fragilidade logística do negócio. Notou que o seu transporte era demasiado precário e perigoso. Seu empenho conduziu a construir o primeiro oleoduto em 1879. Três anos depois ele fundaria sua própria petroleira. A Standard Oil que forneceria querosene para o importante invento de Thomas Edison iluminar toda Manhattan.
Na senda de sua postura visionária com relação ao hidrocarburo, ele ainda abriria o primeiro posto de gasolina do mundo em 1907, vários anos antes da massificação dos inventos de Henry Ford. Diversas investidas empresariais mundo afora foram realizadas nesse entremeio nesse seguimento. Marcus Samuel fundaria a Shell Company. William Knox d’Arcy, a Anglo-Iranian [ou Anglo-Persian] Oil Company. Tempos depois, British Petroleum. Callouste Gulbenkian foi se aproximando da Irak Petroleum Company. E assim progressivamente.
Mesmo assim, o petróleo ainda não havia superado a supremacia do carvão. Às voltas de 1914, o carvão representava 92,6% da energia primária consumida no planeta. A Grande Guerra iniciaria a modificação desse paradigma. Winston Churchill, desde 1911, havia proposto à Royal Navy a implantação de motores a vapor nas frotas. Com a guerra, o petróleo virou, portanto, instrumento estratégico das forças inglesas. Outro fator importante foi mobilizado por Phillipe Pétain nas batalhas da França. Nas agruras de Verdun, o oficial francês impôs o uso do petróleo como diferencial; e funcionou. E, por fim, o ingresso dos norte-americanos no conflito alterou, realmente, toda a concepção do uso do petróleo para nunca mais se regressar.
O imediatamente após 1918 deu lugar a um conjunto importante de decisões sobre o recurso. As terras médio-orientais recaíram quase inteiramente sob o domínio anglo-saxão. Mas os demais aliados desejavam melhor organizar o mercado. Conseguintemente, organizaram a primeira discussão diplomática multilateral sobre o assunto que resultaria nos acordos de San Remo de 1920 cujo objetivo foi deliberar sobre a gestão das reservas dispostas no território no antigo Império Otomano que deixou de existir durante a guerra.
Decidiu-se, assim, que os poços petrolíferos de Mossoul, no Kurdistão, ficariam sob a autoridade de Bagdá – leia-se, sob o domínio inglês – ao passo que aos franceses caberia parcelas importantes da Irak Petroleum Company. Os norte-americanos ficaram de fora dessas negociações pelo fato de não terem ratificado o tratado de Versalhes.
Os anos de 1920 observaram a multiplicação de postos de exploração de petróleo em todas as partes o que causou uma superprodução do produto. Essa superprodução afetaria todos os envolvidos. Inclusive e sobretudo os norte-americanos. Esse problema impulsionou a necessidade de uma nova rodada de negociações que, desta vez, ocorreria no castelo de Achnacarry, na Escócia, em 1928. Dessas negociações emergiram dois acordos. Um sobre a exploração do Oriente Médio. Outro sobre a organização do mercado mundial.
O primeiro redefiniu a partilha das reservas médio-orientais. Na região da Arábia Saudita a prospecção seria livre. As demais áreas médio orientais seriam divididas proporcionalmente entre British Petroleum, Shell, Companhia Francesa de Petróleo, as cinco Majors norte-americanas e pelo Calouste Gulberkian.
A segunda reuniu as sete principais companhias do setor – Standard Oil, Royal Dutch Shell, British Petroleum, Mobil, Texaco, Gulf Oil e Chevron – para se chegar a um acordo de preços. Decidiu-se que o preço de referência seria do petróleo bruto extraído do golfo do México. Além disso, as companhias fixariam cotas de distribuição em todas as regiões. Estava, assim, realizada a cartelização do produto. Uma operação em cartel que funcionaria plenamente até 1949 e resistiria em fragmentos até a grande crise de 1973.
O entreguerras foi um momento de acomodação, reflexão e expansão. A segunda Grande Guerra ampliou ainda mais a convicção planetária sobre a imperiosidade do petróleo como nova fonte de energia. Mas precisou-se passar 1945 para que o mundo das minas de carvão fosse superado pelo mundo movido pelo ouro negro.
Depois de 1945, os desafios da recomposição do mundo eram gigantescos e demandavam muita energia. A Europa e o Japão estavam fisicamente em ruínas. O restante do mundo também ressentia as agruras das batalhas. A economia em geral seguia desequilibrada desde 1929. O mercado de trabalho dos principais países havia sofrido diversas distorções. O desemprego era massivo todas as partes.
A tensão ideológica entre o Mundo Livre e a União Soviética intentava mascarar a gravidade da situação. Mas os tempos difíceis eram uma realidade. A arquitetura de instituições internacionais ancorada nas Nações Unidas teve papel importante na tentativa de harmonização da situação. As instituições de Bretton Woods, notadamente o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, foram também decisivos para orientar caminhos. Mas foi o Plano Marshall que acelerou a recomposição social e economicamente do mundo. Especialmente a partir da reconstrução da Europa.
A reconstrução física do continente europeu demandou quantidades extraordinárias de energia. Leia-se: de petróleo. Nesse momento, a logística transcontinental do produto ainda era precária. O transporte mais utilizado era o navio tipo T2, utilizado pela US Navy durante a guerra, com capacidade de 18 mil toneladas e 48 pessoas na equipagem. Tratava-se de uma embarcação inequivocamente lenta, cara e com frota reduzida.
Imensos esforços no campo tecnológico foram realizados para a superação desse quadro. Europeus e japoneses se juntaram aos norte-americanos nas pesquisas de melhoramento. Poucos anos depois, os resultados foram nítidos. Em meados dos anos de 1950 já existiam petroleiros com capacidade de 100 mil toneladas. Anos depois, viraram frequentes aqueles com 300 mil toneladas. Um pouco antes da Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando do fechamento do canal de Suez, os japoneses já dispunham de unidades com capacidade de 500 mil toneladas e desenhavam um de 1 milhão de toneladas. Tudo isso também impactou na construção de novos portos e infraestruturas portuárias.
As principais rotas que singravam da Ásia Oriental e da Oceania para o Japão e os demais países emergentes o faziam através dos estreitos de Malaca e Sonde. O canal de Suez fazia parte desse sistema alimentando a integralidade da Europa. O petróleo do Cáucaso saída pelo estreito de Bósforo e reunia para o norte da África. As rotas secundárias envolviam decididamente a baía de Maracaibo para o hidrocarburo venezuelano e a baía de Campeche para fazer circular a produção proveniente do México.
Esse aumento significativo do valor estratégico do produto circulando pelos mares levou autoridades civis e militares a criar aparatos de segurança e vigilância para todas as passagens essenciais – Ormuz, Malaca, Formosa, Bad El Manded, Suez, Gibraltar, Cabo, Bósforo. Nesse sentido, foram a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte e seus aliados ocidentais passaram a securitizar todas essas passagens. Do lado soviético, os avanços mais significativos foram ao encontro dos países saídos da descolonização na África a partir dos anos de 1960-1970 com o apoio de Moscou especialmente na gestão da exploração do recurso.
Somadas às inovações navais, a logística do produto também contou com a ampliação extraordinária da quantidade e da qualidade de gasodutos e oleodutos pelo mundo inteiro. Somente em solo norte-americano foram construídos mais de 1 milhão de quilômetros de dutos com esse fim.
O conhecido choque de 1973 foi, em verdade, a soma de várias variantes da degradação desse sistema de gestão do petróleo construído após 1945. Essencialmente, a demanda dos países da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico foi multiplicada por três entre 1945 e 1973. Esses mesmos países eram responsáveis por 50% do consumo mundial. Grande parte deles foi ficando muito vulnerável em função das importações. A Europa e o Japão, por exemplo, chegavam a importar de 70 a 90% de petróleo vindo de todas as partes para aplacar as suas necessidades. Essa situação imprimia, portanto, desafios geoestratégicos e geopolíticos importantes a todos eles.
A nacionalização do canal de Suez em 1956 foi um momento de efervescência na discussão sobre essa dependência. As principais companhias do cartel criado em 1928 começaram a ser intensamente hostilizadas e criticadas pelas companhias independentes ou aliançadas à OPEP – Organização dos Países Produtores de Petróleo, criada naqueles tempos. Isso conduziu a três acordos entre 1971 e 1972 que iriam modificar estruturalmente a realidade do mercado.
O primeiro acordo foi pactuado em Teerã em fevereiro de 1971 e teve por meta a elevação de 20% no preço do petróleo. Desde 1945 que o preço do barril ia estabilizado no preço de US$ 2 para permitiu as benfeitorias da reconstrução da Europa e recomposição do mundo. Especialmente os países de fora do eixo ocidental e extremo ocidental protestavam amplamente sobre esse quesito. Dois anos depois, em 1973, o preço do barril tinha dobrado. Indo de US$ 2 a US$ 4. Essa apreciação harmonizou espíritos. Com os primeiros impactos da saída dos norte-americanos dos acordos de Bretton Woods em 1971, em 1972 ocorreriam os acordos de Genebra que imprimiriam um indexador ao preço do petróleo bruto. Ainda em 1972, um terceiro acordo teve lugar em Nova Iorque onde se decidiu pela ampliação do capital nacional nas filiais de companhias petroleiras instaladas em solo pátrio.
Esses três acordos visaram conter a fúria alimentada pelo espírito de nacionalização emergido da Guerra dos Seis Dias, de 1967. A Argélia, nessa onda, havia nacionalizado 51% de seu petróleo e 100% de seu gás natural em fevereiro de 1971. Sadam Hussein, tão logo chegou ao poder, nacionalizou 100% do petróleo iraquiano. Em julho de 1973, a Líbia do coronel Gaddafi fez o mesmo. Os acordos entre as companhias tentaram impedir o efeito cascata da nacionalização e das externalidades do conflito entre o Israel e o mundo árabe.
Entretanto, em outubro de 1973, o rei Fayçal da Arábia Saudita determinou o fim das negociações entre as companhias e a imediata nacionalização integral de setores petroleiros pelos países árabes assim como a valorização súbita do preço do produto. Tudo com o objetivo de retirar forçar a evacuação dos israelenses do território palestino ocupado depois de 1967. O preço do barril de petróleo, nesse intento, praticamente quadruplicou. Foi de US$ 2 ou 3 ou 4 para US$ 11,3 o barril. O impacto disso sobre os ocidentais foi imenso.
Foi quando o presidente francês Valery Giscard d’Estaing sediou em Rambouillet a reunião entre os chefes de estado das principais economias liberais do mundo para se encontrar saídas para esse imenso problema. Mas, pelo visto, sem muito sucesso. A partir de 1979, com a Revolução Iraniana, o Golfo Pérsico acentuou a sua instabilidade e os países divergentes decidiram por um novo aumento no preço do barril do petróleo que chegaria aos US$ 32 em outubro de 1981.
Essa conjuntura conduziu o presidente Ronald Reagan a sancionar, na primeira quinzena de seu primeiro mandato, a Executive Order 12287 que impunha a imediata liberalização do mercado petrolífero norte-americano. Essa medida, certo, aumentaria a dependência energética norte-americana que em 1973 já era de 1/3 de sua demanda. Em contraponto, promoveria uma liberalização em cadeia com o intuito de amplificar a concorrência, fragilizar a OPEP e diversificar as plataformas energéticas.
Em verdade, desde 1945 que o debate sobre o futuro do petróleo estava instalado. Alarmistas prometiam e até juravam o fim do recurso. Em 1956, um químico da Shell teorizou o Peack Oil. Ou seja, a antecipação empírica do fim do recurso. Desde então tiveram início estudos para a diversificação e a reorientação do uso do produto.
O gás natural já era uma realidade desde 1951. Primeiro na França, em Lacq. Depois em Groningen, na Holanda. Não tardou a se proliferar os locais de extração desse gás. União Soviética, China, Japão, Brasil, Bolívia, Argélia. O carvão também seguiu em uso. Especialmente na siderurgia e na produção de eletricidade. A energia nuclear – mesmo com o trauma causado pelos acidentes de Three Miles Island, nos Estados Unidos da América, em 28 de março de 1979 e de Chernobyl, na Ucrânia, em 26 de abril de 1986. E, por fim, a energia renovável – hidráulica, eólica, solar, geotérmica, marinha. A partir de 1973, a necessidade dessa diversificação começou a se afirmar. Mas depois de 1981 ela foi imposta a todos os países que desejassem seguir com alguma soberania energética.
Em nome dessa soberania, depois de 1981, os norte-americanos e seus aliados ampliaram consideravelmente as reservas de petróleo em todas as partes com o aval da Agência Internacional de Energia. Para securitizar essas reservas, foram criadas forças de projeção rápida. No caso norte-americano, essas forças reuniram notadamente os marines e foram estacionadas nos três polos principais de armazenamento do produto – Ásia Central, Oriente Médio e África do Norte. Aos europeus aliados dos norte-americanos a proteção das reservas ficou a cargo da OTAN ou de alguma força nacional suplementar. No caso da França, por exemplo, existem forças francesas estacionadas na África e na Ásia simplesmente com esse fim. Aos divergentes, especialmente Rússia, China e Venezuela, também se impuseram esforços de realinhamento e adaptação.
A partir de 1984, a liberalização do mercado proposta pelo presidente Reagan começou a produzir externalidades positivas aos norte-americanos que não tardaram a centralizar, sem maiores concorrentes, o mercado mundial da energia. O America is back virou mantra no setor. Tudo seguiu sem maiores turbulências nos anos seguintes.
O fim da União Soviética precipitou o alardeamento do fim da história. O fim da história incorporou a sensação de liberdade. Essa sensação de liberdade ganhou expressão com a liberalização e integração geral dos mercados. Viveu-se, por curtos períodos, depois de 1989-1991, o entusiasmo com uma globalização alegre. As crises bancárias do México e da Ásia começaram a inverter essa motivação. Mas a turbulência maior teve início na China, em 1997.
Em 1997, os chineses apresentaram um extenso e ambicioso plano rodoviário projetando a construção de 500 mil quilômetros de estradas asfaltadas e 200 mil quilômetros de autopistas modernas ao europeu e norte-americano. Seu plano era quinquenal. Queria-se dá-lo por finalizado no início do novo século. Tudo isso pressionou consideravelmente a demanda chinesa pela oferta mundial de hidrocarburos. Essa pressão causou uma extrema volatilidade de preços. Em 1999, por exemplo, o preço do petróleo chegou a US$ 9. Nos anos seguintes, ele oscilou a US$ 60.
Estados Unidos da América, China e Rússia ingressaram no novo século como os principais atores do mercado mundial de energia. Especialmente do petróleo. Em 2003, a China já havia ultrapassado o Japão na demanda de hidrocarburos e já era o segundo maior importador mundial de petróleo. Após os “apagões” no fornecimento de eletricidade na Califórnia em 2000 e no nordeste norte-americano em 2003 e 2004 e a penúria permanente de combustíveis ocasionada pelos efeitos do furacão Katrina no golfo do México em 2005, os norte-americanos voltaram a repensar a sua estratégia energética. Mas as modificações verdadeiramente decisivas ocorreram na Rússia.
A presidência de Boris Iéltsin, bem ou mal, serviu para a transição da União Soviética para a Rússia entre 1991 e 2000. A partir da presidência de Vladmir Putin, especialmente o setor energético russo, passou a ser uma prioridade nacional. Entre 2002 e 2003, o estado russo voltou a controlar a Gazprom sendo proprietário de mais de 51% de seu capital. Logo em seguida foi a vez do grupo Iorgus, especializado em logística de produtos energéticos, passar ao controle da estatal Rosneft. Entre 2006 e 2007, a maior parte das empresas estrangeiras, europeias e norte-americanas, que adquiriram porções do setor energético russo foi literalmente expulsas do território. Além disso, os russos passaram a internacionalizar as suas principais companhias ampliando a sua presença na Europa, na África e na Ásia. Diversos acordos para a construção de gasodutos e oleodutos foram estabelecidos com variados países.
A crise financeira mundial de 2008 e todos os eventos sucessivos que desembocaram na nova fase da tensão russo-ucraniana tiveram por pano de fundo a questão energética. Mais uma mostra de que os fundamentos contam. Que o mundo não é plano. E que aparências enganam.