Quantas foram as vezes no decorrer de nossas vidas que erramos com algo ou alguém, e um algo ou alguém nos magoaram de tal forma que nunca conseguimos de fato superar essa dor? Acredito que ninguém está isento de passar por esta vida sem cometer tamanho erro ou sentir a dor que é ser ferido.

Nossa dor na maioria das vezes acontece logo nos nossos primeiros anos, com nossos pais, irmãos, família, amigos e até com nossos parceiros num nível romântico. Ultimamente tenho pensado muito na minha vida no geral, com as perguntas mais absurdas possíveis. A terapia tem me feito questionar, acho eu, pois venho falando em voz alta os traumas, os medos, os sonhos e as dores, isso deixa as pessoas mais reflexivas.

Talvez esteja apenas na crise dos quase 30 anos, apesar do meu lado racional reconhecer as pequenas vitórias que antes via apenas como obrigações, me vejo presa nas coisas que eu não tenho, nos sonhos desmanchados, da dureza da vida adulta, da solidão que a mesma trás.

Achei que nunca viveria um amor romântico, e tive a experiência, olhando agora com outra atitude, não sei se era amor, talvez o querer tenha me feito ver mais do que de fato tinha, e aquele que achei que nunca amei, vejo como pai dos meus filhos que nem queria, hoje não estamos sequer nos falando, mas quando penso num futuro, é ele que eu vejo. Não sei se acharemos o caminho de volta um para o outro, talvez esse de fato seja o nosso tão inevitável ponto final, e aqui estou eu. Pensativa, magoada, saudosa e nostálgica. Talvez o fato de estar tão sozinha ultimamente, numa rotina exaustiva em que fico remoendo dores, passos e futuro.

Aqui agora, escrevo numa sala de espera do aeroporto rumo a família que não vejo por tanto tempo, penso nele, no nosso futuro, nas coisas que eu queria acertar, nos sonhos profissionais que ainda não realizei. Enquanto penso nesse futuro e no que falta nele, penso no passado, nesse passado, de infância atropelada e privada, encaro lembranças felizes e dolorosas. Me pergunto onde é que erro tanto, em qual parte me torno intragável para afastar relacionamentos, não é possível que tudo, em todos os níveis, me deixa sempre sozinha, abraçada em lágrimas. Às vezes me pergunto se não desistir logo nos primeiros alertas, evitaria tanta dor, ser compressiva a ponto de ser feita de idiota e chegar num ponto que eu me torno meu maior inimigo. Sendo aquela que não cumpre com a própria palavra.

Como que se perdoa? Como posso me perdoar por todas as vezes em que não me ouvi e prolonguei cenários que vai contra o que acredito? No final disso tudo, perdoar é fácil, me perdoar é que não consigo. Enquanto escrevo é que entendo isso com a maior clareza possível, que saudades de quem eu era, quem eu fui antes do trauma dos 20 e poucos, 20 e tantos. Me perdi de mim mesma, e agora, pensando em tudo, não consigo me encontrar. Deveria ser mais fácil nessa altura da vida, ainda mais agora, prestes a entrar de férias com todas as responsabilidades das próximas semanas colocadas em modo avião.

Sinto que estou presa nesse looping ridículo de dor e sofrimento que eu mesma me coloquei, sem saber como sair, sem saber como escolher melhor, como me escolher, como me amar e não me entregar ao desespero e ter recaída numa fase deprimida. Eu tento, tento e tento, a mente é traiçoeira demais.

Busco pesar na balança da vida as coisas boas que tenho, ainda assim, me sinto uma farsa de uma versão barata de alguém que um dia fui.

Lembrança - substantivo feminino Recordação; aquilo que está guardado na memória; o que recorda uma experiência já vivida; o que expressa uma situação já passada.

Queria de fato conseguir sair de mim mesma por um tempo, parar de sofrer pelo que não pode ser mudado, abraçar o novo, recomeçar e reconectar comigo mesma. Ser alguém melhor por mim e para mim, mas agora sinto o peso de um domingo, onde todas as minhas escolhas me perseguem, um medo do futuro sempre incerto, onde tudo parece resultar em fracasso.

Comecei a escrever isso numa sala de aeroporto, terminando sentada no meu antigo quarto, numa noite de domingo com o mesmo sentimento de remorso me comendo viva por dentro, parece que dessa vez voltar para casa parece errado, tudo fora do lugar, nada me pertence, a dor das lembranças e a ansiedade com a volta me atingi com mais força. Tudo dói, tudo me cansa, sinto-me uma intrusa, invadindo um espaço que não é meu, talvez nunca tenha sido. Quero me sentar num canto, sem falar com ninguém, me perder num imenso e escuro vazio.

Voltar para casa me gerava ansiedade, rever família, recarregar e renovar tudo, depois de um dos anos mais difíceis. Agora aqui, só me sinto fora do lugar. O peso sou eu.