Como professora de Inglês, algo que procuro sempre lembrar aos meus alunos é sobre o efeito global de saber se comunicar com a língua franca. Não se aprende inglês somente para que possa se comunicar com americanos, ler os ingleses, ou discutir com irlandeses. Uma língua global permite que qualquer um de nós, a qualquer momento, possa ir a qualquer ponto do mundo e -na teoria- nos comunicar. Nos permite entender sobre búlgaros, húngaros e tchecos, ler literatura islandesa e assistir filmes japoneses. Permite que um mundo inteiro e suas milhares de nuances sejam mais próximas. Milhares de brasileiros sentem isso na pele ao pesquisar empregos online. Inglês é listado como uma necessidade, afinal, é assim que empresas seguem se internacionalizando.

Fiquei chocada com a proposta atual de substituir a disciplina de língua inglesa no ensino básico pelo ensino de espanhol. Não consigo pensar em uma ação mais retrógrada e míope. O Brasil ainda é um país monolíngue, geralmente falando. E uma vez que uma parte enorme da população raramente aprende sua própria língua materna com excelência, o Espanhol não seria uma adição, mas sim uma substituição. Não podemos falar sobre ensino trilíngue no momento. Sejamos realistas.

Por que espanhol? Em que momento a língua dos nossos vizinhos passou a ser mais importante do que o inglês? Mais falada, mais relevante, mais útil? Na realidade, nunca. E provavelmente nunca será. É falada por muitos, de fato, mas esse nunca foi o critério usado ao selecionar uma língua franca - basta examinar o francês (como o nome indica, a língua internacional original - menos de 4% da população a fala). Os próprios espanhóis incentivam o ensino do inglês nas escolas.

Novamente, porém, o Gigante Latino procura uma solução para um problema inexistente - ou pior, procura piorar as coisas ao invés de melhorar. Não é nenhum segredo que a educação no Brasil sofre, e muito. Na minha ingenuidade, gosto de acreditar que quando esse tópico tão importante é discutido em Brasília, fala-se sobre o treinamento dos professores, a expansão da verba voltada às escolas públicas, construção de mais universidades, projetos que ajudam os estudantes a concluirem seu ensino básico, ajuda psicológica aos jovens. Nada disso! Contra qualquer sensatez, necessidade ou proeza, anuncia-se a vontade de excluir uma matéria - por inteiro - e substituí-la com algo tão inútil que gera ânsia no estômago de qualquer um que preza pelo pensamento crítico.

Pensemos então sobre alguns argumentos que tive o azar de ouvir.

Estamos cercados por hispano-hablantes

Basta olhar para um mapa e considerar a Europa ou o sul da Ásia; continentes inteiros constituídos por países pequenos (menores que nossos estados, em sua maioria); cada um com sua língua. Estar “cercado” por uma língua não é um argumento válido nem relevante. Se fosse, a existência de países multilíngues não seria possível. Inclusive, esse fenômeno pede a valorização da tal língua. O português vale menos por existir no meio de tanto espanhol? Consideremos também uma alternativa mais lógica de pensamento: na América do Sul, devido ao tamanho do Brasil, a língua predominante é o português - não estariam os hispanos cercados por nós?

Pensamentos anti-Americanos

Não vem ao caso - nem para esse texto, nem para o argumento que procura fazer. Inglês, primeiramente, não é uma exclusividade dos americanos, e reitero: do modo que existe, permite conversas globais, empregos a distância, e coexistências mais interessantes. Qualquer observador da História tem que concordar que devemos incentivar formas de comunicação internacionais - não somente entre governos, mas entre pessoas regulares. Qualquer comunicação se inicia pelo idioma.

Como professora, estudante de linguística, e apreciadora de culturas alheias, sou e sempre serei a favor do aprendizado de línguas - todas e qualquer uma. Para honrar suas origens, para ler um autor em sua forma nativa, para se mudar para um canto novo, ou simplesmente porque a sonoridade te encanta. Aprender um idioma é uma das experiências mais ricas que existem. Como dizia um querido professor no meu curso de língua russa: aprender uma língua é como aprender uma nova forma de ver o mundo. Mas, antes da curiosidade, vem o pragmatismo - que começa, indiscutivelmente, com o inglês.