Um dia pensei em sair do mundo, mas não em definitivo, não pedi que ele parasse para eu descer, pois não quero sair dele, por nada nesse mundo, gosto daqui e aqui quero ficar por muito tempo, mais precisamente cento e quinze anos, só quis sair um pouquinho para ter uma visão melhor disso tudo, o famoso olhar de fora, como se eu não fizesse parte do todo.

Não encontrei o meio de realizar meu desejo, aviões não resolveriam meu problema, um foguete para me levar ao espaço custa caro e os que fazem essa viagem turística vão ali e voltam logo, não dá tempo de ver nada, só de sentir a falta de gravidade e não era isso que eu queria, desejava ficar um tempo maior observando essa grande bola azul que gira em torno do sol. Mas não me frustrei por isso, eu sabia que encontraria um meio de realizar esse meu desejo.

Já quis ser astronauta, acho que toda criança já quis isso na vida, eu assistia Os Jetsons, Jornada nas Estrelas, assisti muitas vezes Star Wars, li sobre o espaço, mas não consegui ser nem piloto de avião, como a maior parte das crianças também não. Hoje já não quero ser astronauta, nem piloto, viajo através da minha mente, escrevendo meus contos e poemas por aí, criando amores ou falando das verdadeiras desventuras amorosas que vivi.

Mas ainda não tinha conseguido sair do mundo, nem escrevendo, nem imaginando estar em algum ponto do espaço observando seu movimento. Minha mente ainda não tinha alcançado essa proeza, talvez porque eu desconheça a astrologia, seja um completo analfabeto nessa matéria, ou, talvez, nem tanto, pois conheço algumas constelações, as Três Marias e o Cruzeiro do Sul, quando consigo identificar onde é o Sul. Desastre total, eu perdido pelo espaço. Lembrei agora que assistia também a Perdidos no Espaço.

Parece que estou te enrolando, caro leitor, mas, creia, não é nada disso, pode ser que um pouco, mas não é essa minha intenção, com certeza. Estou procurando um meio de relatar como foi a experiência de sair do mundo e ficar observando isso aqui lá de longe, com o olhar de quem vê tudo, mas, no meu caso, sem interferir, afinal eu nunca quis ser Deus, cada um na sua e eu na minha humilde condição de homem, criatura Dele.

Vamos lá, afinal esse texto é para contar essa história, fictícia, dou esse aviso para quem me chamar de mentiroso, sendo que a história não é mentirosa. Uma ficção não é uma mentira, é apenas uma história irreal, contada por alguém que de alguma forma buscou os fatos narrados nas sombras de sua mente, bem lá no fundo, onde poucas pessoas chegam e só um escritor consegue alcançar, muito melhor do que ser astronauta, porque eu posso ficar lá nesse lugar o tempo que eu quiser, enquanto o astronauta tem que voltar quando mandam.

Um dia, querendo sair do mundo, mas sem intenção de ir embora para sempre, porque acredito que o para sempre, sempre acaba, como diz a canção, eu me deixei viajar com os meus pés no chão, ou estava deitado, não me lembro direito, sei apenas que fechei meus olhos e comecei a pensar em nada, num vazio escuro, onde vaguei flutuando, sem me apoiar em nada, só ia subindo ou em linha reta, não pude definir isso.

Era uma viagem da qual eu poderia voltar a qualquer momento, bastava eu abrir meus olhos, pois não estava dormindo, ouvia tudo à minha volta, mas os sons foram ficando longe, muito longe, fiquei um tempo perdido onde estava, devido ao escuro e à falta de um destino certo, eu não estava meditando, estava buscando ver o mundo de outro lugar, sei lá de onde, lá de cima ou entre as pessoas, não importa.

Fui nessa, comecei a ver as pessoas, cada uma envolvida em suas coisas, elas não me viam, mas eu conseguia sentir cada uma delas, via o que faziam no seu mais íntimo e o que deixavam de fazer, me assustei um pouco com algumas dessas pessoas e com outras não tive surpresas. Continuei, não era isso que eu queria ver. Então vi uma guerra, que era travada pela paz, não entendi direito, guerra pela paz? Vi gente inocente morrendo, perdendo sua identidade e sofrendo em nome da paz, reforço.

Seguindo mais à frente vi líderes em uma grande mesa discutindo a paz, mas ameaçavam um ao outro com mais guerra, usando armas mais poderosas e destrutivas e não chegavam a um acordo, ou melhor, só um acordo se deu nessa reunião: uma nação venderia ou doaria armas a outra para que conseguisse a sua paz destruindo a nação inimiga, não gostei do que vi e saí daquele lugar triste com tudo e todos ali presentes.

Em outra parte da minha viagem vi homens escavando a terra, procuravam por ouro e petróleo, para mover o mundo, mas esse mesmo petróleo causava poluição e destruía a terra e causava doença em seus habitantes. Vi pessoas destruindo matas, em busca do ouro, para ter fortuna, assim como quem buscava o petróleo, queriam ficar ricas e expulsavam pessoas, que, empobrecidas, seguiam para lugares desolados e insalubres.

Vi que algumas pessoas não queriam essa destruição, pediam seu fim, lutavam protestavam contra, mas suas vozes eram caladas de diversas formas. Elas eram assassinadas, presas e forçadas a se calarem por ameaças feitas por quem devia lhes proteger. Envergonhado do que vi, decidi não continuar a viagem, mas já era tarde. Ainda vi rios morrendo, peixes sendo extintos, animais da floresta também sendo dizimados e tive medo da fome que se avizinhava das pessoas.

Tentei voltar dessa viagem, não conseguia mais seguir, estava triste e não podia fazer muita coisa para mudar o mundo, estava de mãos amarradas, minha boca foi amordaçada e meus olhos vendados. Me pegaram. Quem eu devia denunciar me jogou em um lugar mais escuro do que onde eu estava no início da viagem, senti frio e fome, fui injuriado e maltratado. Só depois me deixaram voltar, voltei e nada fiz para parar seus crimes, eu era parte disso, não por eu querer. E pouco ou nada fiz ou faço para reverter essas tragédias do mundo.