A ideia de que o universo pode ter uma estrutura fractal, onde o todo se repete em escalas menores, fascina cientistas, filósofos e artistas há décadas. A similaridade estrutural entre o cérebro humano e a rede cósmica do universo ganhou destaque com os estudos de Franco Vazza e Alberto Feletti. Eles publicaram resultados surpreendentes que apontam conexões visuais, estatísticas e estruturais entre esses dois sistemas, que parecem tão distintos.
O que é um universo fractal?
O termo "fractal" foi criado pelo matemático Benoît Mandelbrot nos anos 1970 para descrever formas geométricas irregulares que se repetem em diferentes escalas. Um fractal pode ser visto em estruturas naturais, como brócolis, costas marítimas, árvores e flocos de neve, e em construções abstratas, como redes neurais ou mapas galácticos.
Quando esse conceito é aplicado ao cosmos, a ideia é que o universo em grande escala pode ter uma organização com padrões similares, do nível subatômico à vastidão das galáxias. A "teia cósmica" é a estrutura em larga escala do universo, composta por filamentos de matéria escura, gás e galáxias interligadas, como os nós de uma rede tridimensional.
Em 2020, o astrofísico Franco Vazza, da Universidade de Bolonha (Itália), e o neurocirurgião Alberto Feletti, da Universidade de Verona, publicaram na revista científica Frontiers in Physics um estudo inovador, intitulado "The Quantitative Comparison Between the Neuronal Network and the Cosmic Web".
A proposta do estudo era ambiciosa: comparar a estrutura do cérebro humano, especificamente o córtex cerebelar e a rede neuronal, com a estrutura em grande escala do universo. Os pesquisadores usaram simulações computacionais de ponta do cosmos e imagens microscópicas do cérebro humano. Eles analisaram a densidade, complexidade, número de conexões e distribuição de matéria dos dois sistemas.
Entre os resultados mais impressionantes da pesquisa estão:
Similaridade de estrutura: ambos os sistemas apresentam redes formadas por "nós" (neurônios ou galáxias) interligados por filamentos (axônios ou filamentos cósmicos).
Proporção de matéria ativa: no cérebro, cerca de 30% da massa é composta por células ativamente conectadas, e o restante é fluido e suporte. No universo, apenas cerca de 30% da matéria visível compõe galáxias e estrelas, enquanto o restante é matéria escura e energia escura.
Densidade de informações: os dois sistemas armazenam e transmitem informações em padrões organizados, não caóticos, com escalas logarítmicas que se repetem.
Propriedades fractais e auto-organização: o cérebro e a teia cósmica se organizam de maneira auto-similar, seguindo princípios de crescimento que podem ser descritos por leis matemáticas semelhantes.
Os autores do estudo também criaram imagens comparativas entre fatias do córtex cerebral e seções da simulação do universo. Visualmente, as semelhanças são impressionantes: redes finas ligando pontos brilhantes, com espaçamentos regulares e padrões de ramificação semelhantes.
Essa semelhança levou muitos a especularem que o universo poderia funcionar como um cérebro gigantesco, ou que o cérebro humano seria uma miniatura do cosmos. Embora sejam ideias mais próximas da metáfora do que da ciência comprovada, os dados quantitativos reforçam que as similaridades não são apenas visuais.
O estudo de Vazza e Feletti não afirma que o universo "pensa" ou que existe consciência cósmica, mas levanta questões fascinantes. Se a estrutura do universo e do cérebro obedecem a padrões parecidos, isso sugere que leis universais de organização podem reger sistemas complexos, independentemente da escala ou função. A auto-organização de grandes sistemas, como o universo e o cérebro, pode seguir princípios comuns, o que abre caminho para a aplicação de teorias de redes, inteligência artificial e neurociência à cosmologia. A colaboração entre um neurocirurgião e um astrofísico mostra o potencial da ciência interdisciplinar e revela que a união de áreas aparentemente desconectadas pode mostrar novas verdades sobre o mundo.
Apesar do entusiasmo com o estudo, é preciso ter rigor científico. Especialistas afirmam que as semelhanças estruturais não indicam uma equivalência funcional. Além disso, o conceito de "universo fractal" ainda é debatido. Observações recentes mostram que, em escalas suficientemente grandes, a distribuição de galáxias tende à homogeneidade, o que contradiz a ideia de que o universo seria um fractal infinito.
No entanto, dentro de certos limites de escala, a distribuição de matéria no universo parece seguir padrões fractais, o que valida em parte a hipótese e dá espaço para mais pesquisas.
Mesmo com as limitações, a proposta de Vazza e Feletti é uma das mais intrigantes da ciência recente. A ideia de que nosso cérebro, um universo interior, tem padrões parecidos com o universo exterior é profundamente poética. O estudo nos lembra que a natureza pode seguir princípios comuns em escalas muito diferentes. A pesquisa nos convida a repensar os limites entre o micro e o macro, o biológico e o cósmico, o interior e o exterior.
Mais do que respostas definitivas, o universo fractal oferece uma nova perspectiva sobre a nossa existência: estamos imersos em padrões que se repetem e que nos conectam com o todo. Talvez isso nos ajude a entender que, mesmo em nossa individualidade, fazemos parte de algo muito maior e misteriosamente semelhante a nós mesmos.















