Desde cedo que se vai notando o descrédito do politicamente correcto, subvertendo-o e reduzindo-o à ínfima narrativa putativa e binomial das narrativas dos nossos dias… Do wokismo ao radicalismo balofo e pós nazi a diferença é basicamente nenhuma - enquistam-se ambos em bolhas mais gritantes ou menos estridentes… Dejá vu…
Da narrativa quotidiana difícilmente se extrai algum caminho que possa vingar… Antes se entranha o silêncio já não cúmplice, mas assumido do tédio e do encolher de ombros… Talvez que seja só o declínio inominável do binarismo sem tempo para outras via mais ternárias e aprendentes…
Depois de extasiantes e loucas correrias a desaceleração desponta e talvez isso seja importante, mesmo decisivo para refletir e tentar alcançar algum pudor cartesiano, minimamente lógico e consentâneo com os momentos e mementos que vivemos neste planeta assolado por tanta dúvida e incertezas, talvez por demais impróprio para consumo…
Desacelerando implica documentando, registando e proba e prontamente registando. Implica sobretudo paciência que tanto hoje falta em todo o lado… Implicaria, se plausível e exequível, alguma liberdade e escolha, de ritmo aleatório, para além do já e agora binários na contundência e na imposição de limites…
E bem mereceria o escriba mais crónico do que cronista algum tempo de sossego… Mas e estará alguém disposto a conceder a graça, a mercê antiga do sossego a alguém nos tempos de desassossego que temos que viver?
Desajustado dirão, neurodivergente, por certo, e inconformista o narrador destes quotidianos globais não é nenhum génio ou herói - apenas e tão só um sobrevivente à enxurrada de ruído que nos assalta… Ou tão só mais um judeu errante penando em reinos ou califados nada tolerantes quando ansiava pelo Alhambra de Córdova mais pausado e dado à aceitação das diferenças…
Distante e irrealista, por certo… talvez não tanto como possa parecer… Visionário, muito provavelmente… Mas igualmente observador menos enviesado pelo in the bubble, talvez mais sólido porque calmo e não necessitado da adrenalina do ofegante repórter ou dos sucessivos directos nas diversas pantalhas que se espalham e empalam tudo à nossa volta… Este eterno errante narrador de mil e uma noites e estórias de encantar terá de permanecer quedo e silente?
Será que isso ainda é o preço que tem de pagar pelo seu sossego e paz de espírito ou só pela liberdade expressiva de tentar não alimentar a velocidade ?
Desacelerando na bruma destes dias tumultuosos e carregados de incertezas não significa desmaterializar ou erodir a narrativa, não cerceia o cronista ou o impede de narrar…Também não o endeusa ou torna em oráculo délfico e tronitruante, apenas e talvez revele o escriba destes dias ora de espanto ora de expectativa… Tantas vezes danado de tanta convulsão e por ela desmerecido e esquecido…
Condicionado pela agrura e volúpia do tempo acelerado, observador que de alguma forma regista o fluir desse tempo, divaga e cria narração singela e humilde na imensidão da vaga de informação ou procura reduzir o espectro da observação a pequenos territórios e facetas do que narra…
Por certo que tende ao silêncio cúmplice da incompreensão enviesada pelo próprio espaço e ângulo de observação, pois das leis da Física não se pode libertar, mas mesmo por isso não se deixa aprisionar ou deter, antes ruma e resiste navegando na curiosidade do fluir contínuo da vida que o determina e invectiva a continuar…
É escriba, cronista, narrador, leitor, observando e observando-se em múltiplas dialécticas expressivas ou mais silentes… Pelo menos não desistindo de o tentar…
E desacelerando nesse fluir acaba por expressar todas a dúvidas e meandros da criação literária ou somente tímida de sequer exprimir mais do que a própria expressão vai conseguindo… E o perigo de desfalecer na raiva dos instantes impostos acaba na intensidade e sofreguidão com que expressa dúvidas, mais do que acalenta esperanças…
É destas parcas palavras que, frequentemente, sobrevive ao frémito da urgência que comanda os quotidianos contemporâneos e ousa tentar exprimir o combate ao silêncio censurado da minimalização individual ao ditatorial imenso poder da turba cacofónica agora tribalizada ao chatbot, às fábricas de trolls dominantes e impantes nas suas pírricas vitórias ao milisegundo bitizado do algoritmo elétrico, binário e vertiginosamente reinante…
O que é difícil é resistir à insolência do imediatismo imperial dos dias de cólera e espanto que ora vão correndo…
O que é insano é a triste rendição à metódica imposição aos limites dessa própria expressão livre de restrição e censura…
Helás, a História não morreu fukuyanamente, apenas se transfigurou noutros tipos de morte mais agridoce e mediatizável…
O que é desafio é reduzir ao mínimo haiku a soberba do balbuciar minimalista, mas tentativamente criativo do narrador, poeta dos dias e dos tempos de todas as escolhas e de todas as torrentosas narrativas… E ainda capaz…
Do Frémito Da Deriva,
Do vazio Da página,
Nas madrugadas Irrompe O verso Só,…
Na aurora Dos Dias Ficando A linha Ténue Do Verso Irredutível…