O despertador tocou bem cedo. Eram 8h quando ela se levantou da cama e abriu todas as cortinas do loft. “Entra sol, entra!”, rejubilou Sílvia. Estava bem-disposta e com vontade de começar logo a trabalhar. Às 9h tinha uma marcação no cabeleireiro. Sentia o seu cabelo desleixado, certamente que levaria um raspanete do Gerard.
Chérí! — Anunciou, entusiasmado, ao vê-la — Meu deus, esse cabelo!
Arranjou logo um cadeirão em frente ao espelho para Sílvia se sentar e envolveu-a numa capa.
— Ia-te perguntar como estás, fofa, mas o teu cabelo confessou-me tudo. Está a precisar de um arranjo, está sim senhor. Tem que descansar mais!
Sílvia gostava muito de Gerard, fazia maravilhas com os cabelos e já a tinha desenrascado inúmeras vezes; valia o dinheiro que cobrava. Era a minha primeira escolha quando se tratava de cabeleireiros.
— Arranja-me Gerard! Tenho um casamento hoje.
— Quando não têm, menina. Têm um, dois, às vezes três casamentos ao mês. Vive de organizar casamentos, mas também têm que descansar, linda.
— Como posso descansar! Este é o dia mais feliz da vida deles. Nada pode falhar.
Depois de ter lavado cabelo, o cabeleireiro desenrolou a toalha da cabeça da sua freguesa e começou a trabalhar: pente para aqui, tesoura para ali, secador. Alternava as ferramentas nas suas mãos à medida que precisava delas.
— E o seu? — Perguntou Gerard.
— O meu o quê?
— O dia mais feliz da sua vida? Quando chega?
— Há de chegar.
— Você não dá tempo para o amor. Assim não vai chegar nunca.
— Gerard, eu nem namorado tenho. Vou lá andar a pensar sobre isso.
— Querida! Com o penteado que vou fazer, vai ter homem fazendo fila.
Sílvia riu-se.
— Óh! — reparou o cabeleireiro. — No seu casamento quero um convite, viu. Timbrado e com envelope lacrado com cunho.
— Não te preocupes, és logo o primeiro.
Após uma hora no cadeirão, tinha finalizado o trabalho e com um passo tirou-lhe a manta envolta no pescoço e disse: “Et voilá!”.
Sílvia olhou-se ao espelho, virou a cara e o corpo, observou-se, de todos os ângulos: estava perfeito, Gerard nunca a desiludia.
No entanto não havia tempo para se deslumbrar, a manhã ainda era jovem e havia muita coisa para fazer.
Consultou a sua agenda, fez um par de telefonemas. O bolo estava a caminho, as mesas, os espaços e as decorações, estavam a ser montadas. O fotógrafo e o videógrafo estavam assegurados, o céu estava limpo sem qualquer ameaça de mau tempo. Tudo corria como programado. Sílvia ligou o motor da sua carrinha Peugeot e dirigiu-se para a quinta, onde se ia realizar o copo-d´água.
Era um batalhão de pessoas a trabalhar e outros a orientar. Alguns deles já trabalhavam com Sílvia há algum tempo. Muita coisa já estava composta, mesmo assim ainda havia carrinhas a descarregar. Ela, cirandava daqui para ali a coordenar tudo e a rabiscar a sua lista à medida que iam estando prontas.
Preparavam-se quatro zonas destintas: o minibar, a sala de refeições, a área da criançada que depois se transformaria no espaço da dança e música ao vivo.
Silvia vestiu-se, entretanto: um vestido leve, azul-claro, com saia pregueada que lhe salientava as curvas inferiores e um decote em V que lhe enriquecia o busto.
Por esta altura, os noivos deviam sair da igreja ao som da marcha nupcial e sobre uma chuva de pétalas de rosa e punhados de arroz.
Estava tudo pronto e começavam a chegar os convidados. Ela detinha-se à entrada do grande portão a conferir a lista e a verificar os convites.
Os convidados iam-se afastando e admirando a quinta, enquanto degustavam um copo de vinho, de Martini, um cocktail leve ou uma imperial servida no bar.
A salão de refeições compunha-se de pessoas que começavam a sentar-se nos lugares marcados. Os noives sentaram-se numa mesa de destaque ao centro do salão. Estavam sempre muito cúmplices e mal acabavam de cumprimentar uma pessoa, aparecia outra para os felicitar e estar um pouco à conversa.
Sílvia privava com alguns dos convidados, também era felicitada, principalmente pelos recém-casados que diziam estar tudo perfeito.
Depois dos convidados refastelado, a banda começou a tocar umas músicas leves atraindo as pessoas para a área de lazer, mas a primeira dança oficial era sempre concedida ao casal principal. Haviam preparado esta dança há muito tempo e era do conhecimento público que o noivo não era muito dado a danças. No entanto, agarrou a noiva pela cintura e começou a guiá-la. Os dois dançavam coordenadamente e os olhares cruzavam-se: cúmplices, íntimos, como se não houvesse mais ninguém na sala. Sílvia observava comovida e feliz. O casal terminou a dança com um beijo sentido de quem queria passar o resto da vida junto: na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza e Sílvia não conseguia esconder uma certa tristeza.
As frases de Gerard vinham-lhe à memória e pensava: “Quando chega a minha vez? Quando chega o dia mais feliz da minha vida?”.