Se traduzido visualmente, a "imagem mental" de um labirinto pode, instantaneamente, nos conduzir à vertiginosa queda que logo desemboca nas belezas, prazeres, medos, confabulações e questões infindas ligadas à existência humana e também ao fazer artístico. Título escolhido por José Bechara (Rio de Janeiro, 1957) para nomear a presente exposição, Deambulações no labirinto reúne um conjunto de obras inéditas do artista, sublinhado o caráter multidisciplinar de sua obra.
Trabalhando em distintos suportes, Bechara transita por seu labirinto auto arquitetado com a destreza de um grande mestre: suas obras, sejam no campo da pintura, escultura, fotografia e além, compõem um coeso "corpo da obra" de um artista que busca produzir em diferentes meios e, continuamente, experimentar em distintas esferas. Tal caminhada, aqui partilhada pelo artista com os visitantes, revela-se como a de um flâneur a transitar por um difuso e infindo labirinto de possibilidades do fazer artístico; labirinto de possibilidades tantas, tão erráticas quanto precisas, difusas mas também cartesianas.
Em suas telas, Bechara elege, como ponto de partida de seu processo, tecidos que funcionaram, anteriormente, como lonas de caminhão de viagem; telas nada convencionais que já se encontram impregnadas de história, de vivências, além de se distanciarem um tanto da superfície limpa e asséptica do canvas branco. Tratam-se de tecidos extensos, robustos, já marcados pelo tempo e repleto de manchas, áreas escurecidas, sinais do tempo e de sua existência.
Sobre estes tecidos, o artista insere, pictoricamente, tanto uma espécie de grade – linhas e traços que aludem à ordem do grid moderno – como também realiza pinturas com motivos geométricos – esferas, quadrados, retângulos e afins. Vale sublinhar, aqui, o uso tanto da tinta acrílica quanto o uso de matérias oxidadas, a fundirem-se e criarem, juntas, uma sobreposição de volumes, cores e texturas. A convivência destes dois elementos nos revela uma pintura repleta de signos de memória, constituídas a partir do gesto poético do artista, durante seu processo no ateliê.
Neste novo conjunto de trabalhos, Bechara nos apresenta também à possibilidade de experimentação que extrapola a mera superfície da tela e ganha seus contornos. Em trabalhos em pequena escala, o artista realiza uma série de obras em formatos circulares e além, de modo a criar uma relação metalinguística entre os diversos sinais geométricos existentes dentro de sua pintura e o formato dos próprios trabalhos em si.
Cria-se, assim, um coeso conjunto que, ora nos remete à difusão labiríntica citada no título da mostra pelo artista, assim como um grupo de obras capazes de nos lançar luz não apenas sobre a prática multidisciplinar de Bechara como nos catapultar a imagens oníricas, terrenas, siderais, labirínticas, cartesianas e por aí a seguir-se, sem fim aparente.
(Texto de Victor Gorgulho)