Este artigo descreve as características estruturais e produtivas da agricultura familiar em Moçambique, destacando o papel dessa modalidade agrícola na produção de alimentos, uso do solo, dependência climática e limitações tecnológicas. Além disso, são discutidos os desafios enfrentados pelos pequenos produtores rurais, especialmente no centro e norte do país. Com base nos dados secundários e a consulta bibliográfica de diferentes obras foi possível elucidar que a agricultura familiar é marcada por baixa produtividade, falta de infraestrutura e escassez de tarefas de extensão rural, facto que limita seu impacto socioeconômico.

A agricultura familiar é a forma predominante de produção agrícola em Moçambique, praticada por aproximadamente 98% dos pequenos agricultores (Minag, 2012). Caracteriza-se pela forte dependência climática, baixo uso de tecnologia e predomínio de culturas de subsistência, como milho, mandioca e feijão. Apesar de sua relevância econômica e social, enfrenta sérios desafios relacionados à infraestrutura, acesso a crédito, educação e mercado.

Este artigo tem como objetivo descrever as características estruturais e produtivas da agricultura familiar em Moçambique, identificar os principais desafios enfrentados pelos pequenos produtores e sugerir diretrizes para superar essas limitações. Para isso, utiliza dados secundários e informações de relatórios técnicos, artigos científicos e dissertações sobre o tema.

Estrutura produtiva e principais cultivos

Em Moçambique, a agricultura familiar ocupa cerca de 10% das terras aráveis disponíveis, cultivando em média menos de 2 hectares por unidade produtiva (Minag, 2012). Esta produção destina-se maioritariamente para o autoconsumo, com culturas básicas como milho ocupando maior parte da área de cultivo. No entanto, pequenas áreas de cultivo são destinadas ao cultivo de hortícolas e culturas de comércio como é o caso do algodão correspondendo cerca de 6%.

Mais de 80% da produção é realizada em regime de sequeiro, ou seja, sem irrigação controlada. Somente 3% das áreas cultivadas contam com algum sistema de irrigação (Liberman, 1998). Isso torna a produção altamente vulnerável às mudanças climáticas e variações sazonais de chuva.

De acordo com dados do INE (2019), indicam uma forte ligação entre a produção agrícola e os conhecimentos tradicionais locais, sendo aplicados na alimentação e medicina tradicional.

Dependência climática e baixa produtividade

A agricultura familiar moçambicana é altamente dependente das condições climáticas, sendo que as respetivas colheitas são realizadas de forma manual e obedecendo padrões informais motivadas pela falta de infraestrutura adequada (Minag, 2012). Menos de 10% dos agricultores utilizam fertilizantes químicos ou pesticidas modernos limitando de certa forma a qualidade dos respetivos produtos.

Por conseguinte, nota-se que a ausência de conhecimento técnico bem como o acesso a informações atualizadas sobre práticas agrícolas impede o aumento da eficiência produtiva. A maioria dos agricultores utiliza ferramentas rudimentares, como enxadas e catanas, e poucos têm acesso a tratores ou máquinas agrícolas modernas.

Segundo Liberman (1998), somente cerca de 11% dos agricultores familiares usam sistemas de irrigação e apenas 3,7% utilizam insumos agrícolas modernos, como sementes melhoradas e fertilizantes. Essa realidade reforça a baixa produtividade e a vulnerabilidade dos pequenos produtores.

Questões de gênero e distribuição de trabalho

Há uma divisão sexual do trabalho claramente definida, onde homens assumem o papel de chefes de família e responsáveis pelas decisões agrícolas, enquanto as mulheres participam ativamente nas tarefas de cultivo e cuidados domésticos (Minag, 2012). Essa dinâmica reforça desigualdades de gênero e limita o acesso das mulheres a recursos, crédito e formação técnica.

Apesar disso, as mulheres desempenham um papel central na produção agrícola, especialmente nas atividades de semeadura, capina e colheita. No entanto, enfrentam barreiras institucionais e sociais que dificultam seu acesso a terra, crédito e participação em programas de extensão rural.

Diferenciação regional e desigualdades no acesso a infraestrutura

Moçambique é um país marcado por grandes assimetrias regionais. Enquanto o sul do país apresenta maior desenvolvimento econômico e acesso a infraestrutura, as regiões centro e norte enfrentam déficits significativos em termos de estradas, energia elétrica, armazenamento de grãos e serviços de saúde e educação (Cândido, 2010).

Essas desigualdades afetam negativamente a produtividade agrícola e a capacidade dos pequenos produtores de comercializar seus produtos. Muitos agricultores vendem seus excedentes imediatamente e a preços irrisórios por conta da ausência de mecanismos de armazenamento adequado e pressão financeira. Essa prática prejudica sua renda e perpetua o ciclo de pobreza.

Conclusão

A agricultura familiar em Moçambique é marcada por uma estrutura produtiva tradicional, fortemente dependente das condições climáticas e com baixa produtividade. Deste modo, como forma de ultrapassar este diferendo torna-se importante um investimento em infraestruturas locais por forma a promover o acesso a tecnologias adaptadas às condições locais e fortalecer programas de extensão rural. Além disso, políticas públicas inclusivas devem ser implementadas para reduzir as desigualdades regionais e promover um desenvolvimento equilibrado em todo o país.

Referências

Bittencourt, E., & Bianchini, E. (1996). Agricultura familiar do agronegócio: importância e características. Cândido, M. C. A. (2010). Desenvolvimento sustentável e pobreza no contexto de globalização: O caso de Moçambique (Dissertação de Mestrado em Ciências Políticas e Relações Internacionais).
Cunguara, B., & Thompson, T. (2018). Mozambique: Desk Study of Extension and Advisory Services. Developing Local Extension Capacity (DLEC) Project.
INE – Instituto Nacional de Estatística. (2019). Relatório Anual de Indicadores Sociais e Económicos. Liberman, A. (1998). Dinâmica agrícola e uso de tecnologia em pequenas propriedades. Estudos sobre agricultura familiar.
MINAG – Ministério da Agricultura. (2012). Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Sector Agrário - PEDSA.
Mosca, J. (2014). Agricultura familiar em Moçambique: ideologias e políticas. Revista Nera, (38), 68–105.
Noda, E. (2006). Agricultura familiar na Amazônia, Segurança Alimentar e Agroecologia. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Coordenação de Pesquisa em Ciências Agoeconómicas.