Começo este artigo reconhecendo que este é um tema muito mais complexo e profundo do que aquilo que é falado e retratado no Brasil e em muitos outros países, pois é mais fácil falar de dados estatísticos do que de vidas humanas.

A realidade do Brasil hoje, está mais do que nunca marcada por um grande clima de descontentamento e até de não reconhecimento político e institucional da figura atual do Presidente da República. Este descontentamento é um sentimento comum, não só de um grupo generalizado de cidadãos nacionais, mas de outros países que tinham boas relações diplomáticas históricas com o Brasil.

O reconhecimento institucional de chefes de Estado, eleitos democraticamente, não é não apenas uma cordialidade entre um país e o outro, mas um padrão nas relações diplomáticas formais. Deixa de haver reconhecimento quando há uma rutura institucional como já aconteceu em diversos golpes de estado, a maioria fracassada, ao longo da formação da Democracia no Brasil, por exemplo.

As crises diplomáticas são cada vez mais frequentes e em escala e por isso hoje na cena internacional, outros países, com exceção de Cuba, Venezuela, Irão e China, sabem que com o governo brasileiro atual, não se pode e não se deve contar e isto é preocupante diplomaticamente. Se fosse para descrever a atual gestão, descreveria como sendo puramente ideológica e não estratégica e esta não é meramente uma opinião minha, mas transversal entre politólogos e líderes de vários países, os vizinhos à volta do Brasil que o digam.

As viagens que são realizadas ao longo do mandato presidencial, servem (ou deviam servir) para estreitar laços de cooperação, reforçar acordos e firmar pontes económicas entre os países. O que parece estar a acontecer com a atual gestão é precisamente o contrário, o atual Presidente da República quer afirmar e reforçar o seu protagonismo e popularidade, mas esvaziando cada vez mais os cofres do Estado e os brasileiros. Lula tem muita dificuldade em coordenar os interesses e os princípios, o que faz com que, nestes casos, os interesses prevaleçam sob os princípios.

No quadro político nacional, os dois maiores partidos são, à luz da Ciência Política, considerados como populistas, pois enquanto o PT e toda a esquerda assentam num populismo socioeconómico o povo deles é essencialmente o dos deixados para trás, os que se consideram vítimas do sistema, daí as medidas serem essencialmente de cariz socioeconómico que permitam ao seu eleitorado melhorar as suas condições de vida.

O populismo do PL e da direita é um populismo cultural ou identitário assente na identificação com os valores, com a história, com a tradição do Brasil, por isso, as medidas irem no sentido de melhoria de condições de vida, que na visão da Direita, estão a ser postas em causa precisamente porque há grupos elitizados que estão a beneficiar dos recursos próprios do Estado, que deixa de poder garantir os direitos dos brasileiros.

Para quem desconhece o que é populismo, ele não é nem um nome “feio” que se atribui a qualquer figura política e não é nem uma ideologia, isto porque recorre a vários pensamentos e matrizes ideológicas para construir uma narrativa. O populismo nada mais é do que a articulação do discurso consoante o momento em que se vive, é tendencialmente mais utilizado em períodos de crise, criticando o sistema e oferecendo milagres para as necessidades do povo. Ou seja, os populistas são aqueles vendedores de carros em segunda mão que prometem ter um grande negócio para nos oferecer, mas que na realidade eles nunca comprariam se estivessem no nosso lugar.

É possível haver populismo sem democracia? De acordo, com Margaret Canovan, uma politóloga britânica, é possível haver populismo sem democracia e este pode até destruí-la, instituindo uma nova forma de governo, mas não há democracia sem populismo, ou seja, é intrínseco à própria democracia.

É nos períodos de campanha eleitoral que assistimos ao expoente máximo do populismo, os programas eleitorais, os carros alegóricos com equipamentos sofisticados de imagem e som, as visitas aos lugares mais esquecidos, a roupa utilizada e o discurso político, são nada mais nada menos que meros instrumentos de persuasão de votos, o que faz com que no Brasil, o candidato que mais sorri ou tenha a gravata mais engomada, seja eleito. Ou seja, a imagem aliada às mentiras e promessas vazias, tornam-se na verdade absoluta para quem o defende, intitulando-o até como sendo “um do povo, um como nós”. Isto é resultado de uma acefalia cega, que faz com que os adorem mais até que os próprios familiares.

A meu ver, a democracia brasileira sempre esteve ameaçada e assiste-se hoje a uma tipologia diferente de democracia, uma democracia disfarçada, ou seja, aparenta ser uma democracia que afirma ser a promotora do diálogo entre todos, da inclusão, a criadora da paz, da estabilidade, da solidariedade e da unificação de todo o povo brasileiro, mas é na realidade uma ditadura moderna, que utiliza instrumentos de manipulação e de perseguição política aos seus opositores.

Não há hoje, uma tripartição clara e bem definida dos poderes mesmo que esteja expressa na Constituição Federal de 1988 (art.2º). O poder judicial manuseia a seu favor o poder executivo e este absorve, por meio de negociações de cargos, verbas e outras regalias, o poder legislativo. Eu acho que Montesquieu não iria achar muita graça à forma como tem sido hoje utilizada a sua teoria da separação de poderes de um Estado. A politização da justiça reforça a minha ideia de que quem é capaz de influenciar o modus operandi de dois poderes, tem o controlo absoluto de tudo o resto (quem faz as leis, beneficia delas).

Chegando à conclusão deste artigo, acredito que o Brasil ainda não recebeu uma luz divina para que ocorresse a mudança que o país realmente precisa. As principais figuras políticas do país vão envelhecendo e o sistema político vai envelhecendo com eles.

A atual lógica de reconstruir aquilo que foi destruindo nada mais é do que o populismo puro e barato, que é vendido a uma franja da sociedade frágil e desacreditada. Tanto a esquerda como a direita, não têm problemas de usar o populismo a seu favor para eleger o seu candidato e ele perpetuar-se no poder.

Ainda se está muito longe da ordem e do progresso, frase que se encontra na bandeira nacional do país. Assiste-se a uma degradação contínua das instituições, uma inversão dos valores morais e éticos, uma comunicação social manipuladora e corrompível, uma franja da sociedade deixada ao abandono e à pobreza, uma taxa de criminalidade que é das mais altas do mundo, um sistema de saúde público degradado e um sistema de educação público movido aos interesses ideológicos dos partidos políticos, que regista a taxa mais elevada de desistências escolares e de analfabetismo.

A legitimação e institucionalização do crime organizado e das diversas formas de corrupção é, a meu ver, um auxílio alternativo ilegal que beneficia quem está no poder e um prejuízo eterno para aqueles que gostariam de ter uma vida pacífica e de muitas oportunidades de crescimento e de progresso no seu próprio país.

Ainda assim, espero que se crie uma união no meio do caos, pois já assistimos a vários momentos que se repetem na nossa História e o fim nunca é bom. As guerras desumanizam, trazem ao de cima o espírito selvagem de cada ser humano, onde a sobrevivência individual vale mais do que a vida do outro. Não podemos compactuar com quem procura inverter moralmente e eticamente os nossos princípios, devemos sempre optar pela verdade e solidariedade, pois estes são os únicos caminhos que trarão esperança e futuro.

Termino com esta frase do eterno Papa Francisco nas Jornadas Mundiais da Juventude em 2023 em Portugal – “Só há um momento lícito em que posso olhar de cima para baixo uma pessoa, é ajudá-la a levantar”.