Não olho para o passado do meu país da forma como me ensinaram na escola, e penso que a grande maioria da minha geração e dos mais novos também não. Para nós, todas as discussões e picuinhices são essencialmente uma perda de tempo quando confrontadas com uma simples verdade: o colonialismo foi um crime, ponto final. Não importa que o nosso país tenha "descoberto" como o fazer, não somos capazes de nos orgulharmos disso e cantarmos acriticamente as mesmas canções dos nossos avós.

Sim, em Portugal a ideia dos "Descobrimentos" como um passado glorioso ainda é, por alguma razão, ensinada nas escolas. Que o facto de os portugueses terem tido um império ultramarino (que envolveu rapto, terrorismo, exploração e escravatura) foi, na verdade, positivo para a História, consubstanciado na frase "Demos mundos ao mundo".

A maioria dos jovens, e os que saíram recentemente da juventude, não concordam. E isso deve-se ao facto de vivermos uma vida muito mais pan-europeia do que os nossos antepassados, e de estarmos perfeitamente conscientes de como essa narrativa é insustentável a nível internacional.

Não se vê, na terceira década do século XXI, grandes grupos de franceses ou ingleses de meia-idade a cantar com orgulho a glória do imperialismo, sem que, consequentemente, sejam remetidos para os extremos da vida política. No entanto, em Portugal, a minha geração está resignada ao facto de que a maioria dos que nos precederam se sentirá assim até ao dia da sua morte, incluindo os que são moderados ou mesmo apolíticos.

Os últimos anos trouxeram este tema para a ribalta, e os debates em torno do assunto começaram a realizar-se nos meios de comunicação social e a nível institucional. Pessoalmente, sempre achei ridículo afirmar que se "descobriram" lugares que já tinham civilizações prósperas a viver neles. A resposta habitual é dizer que, na verdade, o que os portugueses descobriram foram rotas marítimas, e a isso respondo que a verdadeira descoberta foi a forma de utilizar essas rotas e práticas como a escravatura para explorar outros povos.

Recuso-me a perder-me em tomos antigos, discutindo os pormenores da história, quando as práticas passadas do Estado português e a sua criminalidade são tidas globalmente como factos indefensáveis. Além disso, penso que é um mau reflexo da sociedade portuguesa o facto de estas questões só recentemente se terem tornado controversas, sendo publicamente contestadas a um nível significativo.

Ainda para mais, o que é que o país mais pobre da Europa Ocidental ganha em agarrar-se a um conceito anacrónico de imperialismo glorioso? Um terço da juventude portuguesa saiu do país em busca das condições que desistiu de encontrar no seu país - um número desproporcional de jovens com formação académica avançada e com um elevado nível de escolaridade. Será que estes indivíduos anseiam pelos tempos do império português, das suas colónias e dos seus descobrimentos? Ou será que ambicionam os ideais de uma Europa moderna, uma visão que ainda não se materializou à sua porta, apesar das promessas e expectativas?

É uma forma de esquizofrenia institucional conservadora, uma vez que a capital do mesmo país, Lisboa, foi recentemente eleita Capital Europeia da Inovação, e que o país atrai o investimento estrangeiro ao posicionar-se como um país com visão de futuro. Esse mesmo país considera que qualquer contestação à doutrinação dos seus filhos para a gloriosa história de um passado imperialista (rotina que já não pegou em duas gerações sucessivas) é a invasão de uma mentalidade estrangeira, "woke".

Em última análise, pode ser o sinal de uma crise de identidade mais profunda, de uma nação que luta para encontrar o seu lugar nos dias de hoje, cambaleando de crise em crise, sem nunca fazer um balanço dos seus erros passados para estabelecer um plano adequado para o seu presente, ou uma visão para o seu futuro.