No mundo atual, constantemente, fotografamos, filmamos ou somos fotografados e filmados. Virou uma compulsão, qualquer coisa que fazemos ou vemos temos a vontade de registrar e (Ah!) postar em alguma rede social ou mesmo enviar em algum grupo privado. Produzimos uma enorme sequência de imagens de nossas vidas. Creio que será um grande legado de memórias para as gerações futuras das nossas famílias.

Mesmo aqueles familiares ou amigos que fogem um pouco a regra e não possuem redes sociais e não vivem constantemente fotografando ou postando nelas, não conseguem escapar, minimamente, daquele grupo privado de WhatsApp ou Telegram da família ou de amigos.

Pare e pense: Você possui momentos especiais gravados apenas em sua memória? Aqueles em que não teve a oportunidade de fazer um registro fotográfico, mas que possuem um valor inestimável? Aqueles em que foi surpreendido e, atônito e desprovido de ferramentas, apenas respirou e contemplou? Tenho alguns exemplos.

Morava no Rio de Janeiro quando numa manhã saindo para o trabalho, indo do Cosme Velho em direção a Lagoa Rodrigo de Freitas, pegando a alça de acesso ao Túnel Rebouças fui presenteado por um espetáculo da natureza. Este acesso ao túnel é uma área de mata, pois estamos aos pés da Floresta da Tijuca.

Era manhãzinha, ainda havia uma leve neblina saindo da mata e, logo no início da curva deste acesso, surgiu aos meus olhos centenas, milhares, centenas de milhares de pequenas borboletas azuis. Era como se todas tivessem acabado de nascer e estivessem alçando o primeiro voo naquela manhã. Ainda não existiam os celulares multimídias, então meu único pensamento era ter uma câmera fotográfica para registrar aquele momento tamanha era a sua beleza, um completo desbunde.

Por um acaso, quase milagre, estava alguns segundos sozinho naquela curva de acesso, então pude desacelerar e lentamente apreciar aquele presente da natureza! Minhas futuras gerações não terão o registro desta memória, mas eu a levarei para sempre!

Os anos passam, os filhos chegam, crescem e um dia, em uma praia em Salvador resolvemos ir caminhar no final da tarde. Ao final da caminhada de sete quilômetros de ida e volta, antes de voltarmos à casa, paramos na areia para descansar, conversar, desfrutar a vista do mar, o bater constante das ondas, observar as pessoas, simplesmente contemplar, deixar o tempo fluir.

De repente, na nossa frente numa leve diagonal à esquerda surge do horizonte, rente ao mar, uma enorme bola vermelha. Por alguns segundos ficamos em dúvidas sobre o que seria. Nos confundimos, falamos que era o Sol, para na sequência lembrar que seria impossível ser o Sol, pois este estava se pondo as nossas costas. Imaginamos ser um planeta, mas, pelo tamanho, também impossível. Por fim, concluímos que se tratava da Lua.

Num incrível espetáculo de cores avermelhadas o nascer da Lua estava coincidindo com o pôr do Sol, por volta das 17:45. Enquanto um se despedia a outra chegava, próxima, enormemente vermelha com um céu absurdamente alaranjado e azul claro ao mesmo tempo. Todos se perguntam “Alguém trouxe o celular?”. Mas, ninguém havia levado o celular. Pensamos em passar nossos números para alguma das pessoas que sacavam fotos (pareciam saber que aquele espetáculo ocorreria). Finalmente, desistimos e resolvemos apenas apreciar e registrar aquele momento eternamente em nossas memórias.

Voltando para casa nos prometemos que na caminhada do dia seguinte levaríamos algum celular. No outro dia nos demos conta da nossa ignorância e ingenuidade. O nascer da Lua vai mudando gradativamente ao passar dos dias, então, esta pequena diferença de minutos altera todo o efeito de cores e tamanho ocorrida pela coincidência do pôr do Sol e o nascer da Lua.

Nossos descendentes não terão o registro desta memória, mas desta vez, terão seus predecessores contando a mesma história e sensação, ao menos para as próximas duas ou três gerações!

Talvez seja isto que precisamos. Mais momentos de lembranças não documentadas. Lembranças verdadeiras que serão relatadas com entusiasmo autêntico para os amigos, familiares e descendentes. Memórias que podem até parecer efêmeras, mas que na realidade são eternas!