Constitui-se como facto um dado que seja verdadeiro, confirmado pela experiência empírica da análise e observação. Esta frase tem tanto de categoricamente assertiva como de uma proporcional vulnerabilidade à escala do universo. A “verdade” configura, em alguns contextos, a resistência contra as mudanças triunfantes, criando um impasse de esperanças frustradas, enraizadas numa desilusão generalizada que recusa racionalizar a realidade. A “verdade”, no entanto, pode efetivamente ser o filtro para uma maior clarividência sobre o mundo dentro de um prisma de ontologias. Converge sobre a realidade e a verdade absoluta, um princípio fraturante de causa e finalidade que necessita incessantemente de ser atravessado, ou desconstruído.

Segundo Walter Benjamin, a história é escrita pelos "vencedores". Pressupomos que os "vencidos" se reduzam à margem dos triunfos. Como então ter empatia pelos vencedores e vencidos? O que é a verdade?

Consubstanciamos a experiência e o amplo talento quando somos seduzidos a ultimar os eventos da vida. Obliterar ou ferir a memória e, por sua vez, a realidade dos factos. Derrubam-se, por efeito, as impressões, as diferidas individualidades, para assegurar o domínio que explica o homem e o seu contexto social, restando no fim as dicotomias que fundaram a instrumentalização da verdade e bipolarizaram o paradigma das crises.

A memória, que em si pressupõe vida, alcança-nos novamente sobre a medida do desencontro. Recuperamos a experiência de nos sentirmos nómadas. Parece que nos encontramos na mesma sala de espera, reconhecendo que perante as meta-realidades, somos, de alguma forma, a antítese. Teimamos em gerar gente com dúvidas, sobre a certeza de que a verdade é fruto das tradições, tanto na vida coletiva como na particular.

Num contexto civilizacional que nos permite compreender o tempo, a memória, o arquivo, como ministros da verdade e da realidade, alcançamos a capacidade de compreender o passado, presente e futuro através de uma consciência apurada, ainda que fragmentada, pelas totalitárias dicotomias que, de repente, nos descansam dos receios da verdade absoluta.

Repentinamente, apercebo-me de que somos resultado das fragilidades, das ambiguidades, dos erros e da magnífica possibilidade de divagar pela experiência criativa. Também somos resultado do antropocentrismo organizado e adaptado a uma estrutura social complexa, lembrada pela memória e perturbada pela herança material. Criamos compromisso com a matéria das coisas. Por via desse tato, massajado pelo espírito absoluto de Hegel, produzimos encontros invisíveis que se tornam materiais através da emoção. Um encontro que permanece no átomo da incerteza e repousa descansadamente sobre a vulnerabilidade que a arte procura retratar a partir das percepções e sensações, deslocadas do sujeito.

Considera-se, então, o seguinte: a empatia não se encontra na história dos vencedores, senão no próprio presente configurado pelos vencidos. As abstrações intrínsecas à "verdade" surgem por via de tensões antagónicas que se estabelecem a partir de juízos "universais e virílicos" emancipados por "tribunais" que decidem as valências da razão. Promovem-se interesses que nos ferem a dignidade humana, radicada numa esfera de egocentrismos, impedindo-nos de imaginar múltiplas e diferidas realidades.

À escala do cosmos, não somos especiais, mas procuramos sê-lo. Consumidos pela virilidade humana, devora-se a ideia de uma aparente sagacidade que resulta na opressão sobre a "diferença", de modo a fazer corresponder os bons costumes a que a tradição nos habituou. A doença gera-se, a começar pelo seu interior. Consome pacientemente a empatia enquanto alcança as suas intenções mais nefastas, que se plasmam sobre um campo virtual na qualidade de pergunta: Como se chega a ser o que se é?

No tribunal que o presente instaura para pensar construtivamente o passado, convocam-se os nómadas para que alcancem a voz e exijam os direitos de reclamar a memória e a herança. Empenham-se em estabelecer novas perspetivas e emancipar novas interrogações, que plasmam a antropologia contemporânea, proveniente dos discursos categoricamente progressistas, que acompanham o fluxo da democratização social e política, transcendendo à responsabilidade e valorização planetária subserviente do pensamento ecologista.

Repensar a narrativa das verdades passa pela substituição de modelos hierárquicos, pela reconciliação com um passado que não nos determina, pela união estrutural entre humanos e natureza, análoga à das mulheres e dos homens. À promoção da dignidade individual consubstanciada pela empatia e aceitação, assim como à interdisciplinaridade demarcada entre a política, ecologia, a ética e educação. Ao diálogo intercultural. À aceitação prudente da ciência e da técnica. À universalização da responsabilidade sobre o cuidado aplicado a todos os seres humanos e ao resto da natureza.

À semelhança das correntes ecofeministas, estabelece-se a ideia de que na base da preservação da natureza está radicado o princípio da justiça social. No mesmo sentido, semeiam-se os princípios reconstituintes da aproximação de uma verdade que opere o presente a partir da sustentabilidade, assente sobre o sentimento de esperança capaz de promover um futuro. Estaremos, então, isolados dos constrangimentos opressivos?