A vida em sociedade nos é muito conveniente por um lado, visto que o ser humano é um ser gregário por natureza, mas por outro lado apresenta alguns corolários que se tornam inconvenientes, particularmente no que tange ao aspecto da comunicação.

Jung encontrou na palavra latina persona (máscara usada por atores na época clássica) - a melhor expressão para designar a ‘máscara’ ou face que uma pessoa expõe para confrontar o mundo. Isto vai de encontro ao fato de que em qualquer sociedade, um meio de facilitar o relacionamento e intercâmbio é exigido; essa função é parcialmente efetuada pelas personas dos indivíduos em questão. A persona, muitas vezes é referida como o “arquétipo social”, envolvendo todos os compromissos próprios para se viver em uma comunidade.

Entretanto, se por um lado, a vida em sociedade exige que esbocemos ao mundo nossa face mais luminosa, como forma de colocar um freio às manifestações de agressividade e facilitar o convívio com os demais, por outro lado, ao nos “refinarmos” nesse contato, acabamos desenvolvendo estratégias de comunicação que ao invés de nos aproximar, pelos aspectos de metacomunicação envolvidos, tornam-se alienantes e contribuem para destruir vínculos, os quais se propunham a sanear.

Segundo Watzlawisck et alii. (1993), a metacomunicação designa a “capacidade de comunicar sobre a dinâmica da comunicação entre interlocutores”. Considere-se, pois, que toda comunicação tem um aspecto de conteúdo e um aspecto de comunicação, que nos diz como esta comunicação deve ser entendida (metacomunicação). “Isto é uma ordem!” ou “Estou só brincando!” são exemplos verbais de tais comunicações sobre comunicação. Outro exemplo seria: João está tentando dizer a Maria o quanto a ama enquanto olha para outra mulher. Assim, na dinâmica da comunicação é muito comum ocorrerem paradoxos e contradições. Tal conceito é amplamente utilizado no âmbito da Psicologia Sistêmica, no estudo e na compreensão da comunicação interpessoal.

A comunicação não verbal (expressões faciais, gestos, tom de voz) constitui uma forma de metacomunicação, já que a mesma classifica e elucida sobre a comunicação estabelecida entre duas pessoas. Neste sentido, o comportamento não verbal pode também transmitir uma mensagem sobre a comunicação entre os interlocutores.

Segundo os axiomas da comunicação humana, frequentemente a metacomunicação de natureza não verbal define o nível da relação dos indivíduos. Em outras palavras, o comportamento não verbal dá forma ao comportamento verbal, podendo confirmar ou adicionar-lhe informação, conforme o conteúdo da mensagem seja ou não congruente com o que transmite não verbalmente.

Da mesma forma, é possível metacomunicar através de linguagem verbal. Este tipo de metacomunicação tem como objetivo esclarecer o interlocutor sobre o sentido e significado da comunicação.

Quando se pretende salvaguardar uma mensagem ou esclarecer uma interpretação distorcida, recorre-se à metacomunicação verbal.

Portanto, muito cuidado com o que estamos dizendo, pois podemos ao mesmo tempo estar a “desdizer” o que acabamos de proferir. Ao interlocutor é sempre muito estranho e soa como esquizofrenizante receber duas mensagens com significado oposto ao mesmo tempo. Isto pode ocorrer tanto no âmbito social, profissional, pessoal ou no relacionamento de casais. O emissor da mensagem talvez não se dê conta da amplitude da comunicação e que ao receptor nada escapa. Um sorriso constante no rosto pode não ser sinal de boas notícias, mas simplesmente uma forma de amenizar e estabelecer entre as partes um campo relaxado para um conteúdo nem sempre tão bom.

Segundo Gomes (2018), no campo do relacionamento de casais, ainda que o parceiro seja ótimo, nós nos encarregamos de estragá-lo com uma comunicação imprecisa e confusa, porque daí o nosso parceiro facilmente se esquizofreniza e uma comunicação para ser otimamente esquizofrênica não precisa muita coisa além de alguns ingredientes que a envenenem, como: os duplos-vínculos, as metacomunicações, as mistificações, as confusões e os conflitos.

A pragmática da comunicação humana muitas vezes nos distancia e nos enlouquece ao invés de nos aproximar e levar a um fortalecimento de vínculos.

Uma estratégia supostamente mais saudável seria tentar ampliar o nosso campo de consciência e a nossa atenção (em outras palavras, estarmos “ligados”) sobre o que efetivamente estamos comunicando, e nada melhor para isso do que fazer a leitura da forma como o interlocutor está recebendo nossa mensagem, observando os sinais que o mesmo nos emite de volta. Em outras palavras, buscar mais coerência e consistência em nossa comunicação. Desta forma, talvez fosse mais interessante e mais honesto consigo mesmo, apenas sorrir quando efetivamente houver motivo para isto, o que não significa que vamos estar necessariamente de ‘cara amarrada’. Simplesmente sermos mais lineares com nossos próprios sentimentos.

A sofisticação da vida moderna nos leva a desempenhar papéis e a viver um mundo de aparências que se reflete na comunicação que, longe de nos aproximar, nos distancia e nos envenena. Neste caso, a máscara deixa de ser útil. Devemos aprender a discriminar em que momento é conveniente o uso da máscara e em que momento cabe dispensá-la. Até porque corremos o risco de nos identificarmos com ela e nos dissociarmos de nós mesmos.

Uma máscara é apenas e tão somente uma casca. O eu verdadeiro deveria ser sempre mais bonito e luminoso do que a casca. Trazer para a luz o eu verdadeiro através de coerência e consistência na comunicação, deveria ser um guia básico do relacionamento interpessoal. A vida em sociedade, no entanto, nos distancia de nós mesmos e nos leva a sermos o que não somos.

Recuperar a essência. Ser mais honesto consigo e com o outro. Esta pode ser uma nova rota. É sempre possível destacar-se da manada. Correr o risco de ser aquilo que se é. Ser você mesmo é sempre o caminho mais curto, mais fácil e gratificante.

A colheita de frutos raros faz parte desta jornada.

Referências

GOMES, J.C.V. - Kathy Isler: A arte de brigar para não se separar. O site do Psicólogo, 2018.
SAMUELS, A.; SHORTER, B.; PLAUT, F.: Dicionário crítico de análise junguiana. Rio de Janeiro, Imago Editora, 1.988.
Watzlawisck, P., Beavin, J.H., Jackson, D.O.: Pragmática da comunicação humana. Um estudo dos padrões, patologias e paradoxos da interação. São Paulo: Cultrix, 1.993.