As guerras, como feridas abertas que recusam cicatrizar, seguem sangrando em diferentes partes do mundo. A Ucrânia, ainda tentando recompor os cacos de sua soberania após anos de conflito com a Rússia, vê novas tensões surgirem à medida que alianças se testam e os civis pagam o preço mais alto. Em Israel e Gaza, os ciclos de violência e cessar-fogo voltaram a se alternar com trágica previsibilidade, cada vez mais intensos, com impactos profundos na estabilidade regional e emocional do planeta. No Congo, um conflito esquecido por muitos, mas devastador para milhões, continua a devastar comunidades com violência brutal e uma crise humanitária que pouco encontra espaço na mídia internacional.

Enquanto isso, a Terra — viva, furiosa e imprevisível — também se faz ouvir. Ondas de calor quebram recordes históricos, furacões surgem fora de época, e terremotos, como os que abalaram partes da Turquia, do Japão e da América Central nos últimos meses, relembram a humanidade de sua vulnerabilidade. As enchentes já não são mais eventos sazonais, mas sim realidades frequentes que afetam milhões, do sul da Ásia às Américas. A crise climática, longe de ser uma ameaça futura, é um presente urgente, e cada vez mais instável.

Diante desse cenário, o Relógio do Juízo Final — o símbolo criado pelo Boletim dos Cientistas Atômicos para medir o quão perto a humanidade está de sua autodestruição — segue mais próximo da meia-noite do que nunca. Em janeiro de 2025, os cientistas mantiveram os ponteiros a 90 segundos da meia-noite, refletindo um momento crítico sem precedentes na história moderna. É o mesmo nível de alerta declarado em 2023, mas com um peso que só aumenta à medida que os fatores de risco se multiplicam.

Em 2025, já não falamos mais em "mudança climática" como um fenômeno futuro — ela está aqui, implacável, batendo à porta de nossas casas, transbordando pelas janelas, infiltrando-se nas paredes das cidades. Os alertas que por décadas foram sussurrados por cientistas e ambientalistas se tornaram o novo alarme matinal do planeta. E, infelizmente, a maioria das respostas ainda é tímida, quando não inexistente.

O planeta parece respirar com um certo cansaço, como se cada novo dia trouxesse consigo mais um peso de incerteza. O nível de preocupação global é palpável — não mais um sussurro em fóruns acadêmicos ou manchetes passageiras, mas um grito constante nas conversas do dia a dia, nas salas de reunião da ONU, nas redes sociais e até mesmo nos corredores das escolas.

O aumento da temperatura global, que ultrapassou a marca simbólica de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais em vários momentos de 2024, não foi um pico isolado. Estamos diante de uma tendência firme e contínua de aquecimento. Isso significa mais do que calor insuportável nas metrópoles — significa colheitas fracassadas, desertificação de áreas inteiras, migrantes climáticos forçados a deixar suas casas em busca de sobrevivência, doenças tropicais avançando em latitudes antes consideradas seguras.

As enchentes se tornaram uma nova estação. Já não são mais emergências excepcionais, mas eventos recorrentes. Cidades como Daca, Lagos, Jacarta e até mesmo Nova Iorque e Londres, começam a revisar sua arquitetura urbana, sabendo que os mares sobem centímetro a centímetro, mas com força de tsunami. Tempestades tropicais e ciclones não apenas se multiplicaram, como se tornaram mais intensos, mais erráticos — suas rotas são imprevisíveis, e suas consequências, catastróficas.

O solo, saturado, já não absorve mais as águas com a mesma generosidade de antes. As florestas, sufocadas pelo calor ou devoradas pelas queimadas, perdem sua capacidade de regular o clima. E os oceanos, quentes e ácidos, matam lentamente as bases da vida marinha, provocando um colapso em cadeia que ameaça não apenas a biodiversidade, mas a segurança alimentar de bilhões de pessoas.

A grande dificuldade, neste cenário, não é apenas técnica — é profundamente política e moral. Como realocar milhões de pessoas? Como alimentar populações inteiras em meio a safras imprevisíveis? Como sustentar redes elétricas sob pressão constante de secas e tempestades? Como evitar que a escassez de recursos inflame ainda mais os conflitos entre países e dentro deles?

O maior desafio talvez seja psicológico e social: estamos preparados, como humanidade, para viver em um mundo em permanente estado de emergência? O sentimento de “normalidade” já não é o mesmo. Os calendários se reorganizam ao redor dos desastres. As prioridades mudam. As promessas de desenvolvimento sustentável colidem com a realidade de sobrevivência imediata.

A curto prazo, é difícil vislumbrar uma reversão. O carbono que aquece nosso planeta hoje foi emitido há décadas. Mesmo que desligássemos todas as usinas e motores agora — o que sabemos ser improvável — o impacto climático continuaria por muitos anos. A adaptação, portanto, deixou de ser uma escolha: tornou-se necessidade.

Resta-nos, porém, uma verdade dura, mas fundamental: o futuro não está escrito. A crise é inevitável — o colapso, não. E nessa diferença tênue entre ruína e reinvenção, mora a última esperança.