O conceito de imanência desponta como o pulso primordial que nos define, a noção de que tudo o que existe se desdobra a partir de dentro: um movimento incessante que não começa nem termina, mas que se desloca, transforma e sustenta. Inspirado pelas ideias do filósofo francês Gilles Deleuze apresentadas no seu último ensaio Immanence: A life (1997), no qual concebe um plano onde todas as coisas existem por si mesmas, a Galeria Pedro Cera tem o prazer de apresentar uma exposição que canaliza uma interação contínua de forças à procura de expressão. Num território onde cada elemento é moldado pelo seu próprio impulso interno, On immanence dá forma ao que persiste por dizer, traçando desejos vitais que ultrapassam a linguagem.
Enquanto conceito fundamental da metafísica e da ontologia, a imanência propõe uma imersão naquilo que Deleuze designa como “plano puro”, um planalto infinito sem divisão constitutiva que ressoa profundamente com o seu conceito de “uma vida”, introduzido no mesmo ensaio. Tratando-se de uma energia indeterminada e a-subjetiva que habita os “não-tempos” da existência morfológica, “uma vida” remete para aquilo que a sua obra seminal Mil platôs (1980) descreve como “matéria em movimento”, nomeadamente, uma força vital que deixa de ser qualidade de um sujeito para se transformar em pura imanência, fluindo pelos interstícios de todas as coisas. Vida e vitalidade tornam-se, assim, conceitos orientadores para todas as entidades e para tudo aquilo que entre elas persiste. Neste enquadramento, o corpo deixa de ser compreendido enquanto estrutura fixa, escapando às amarras do antropomorfismo para se reconfigurar enquanto lugar de possibilidade, como uma estrutura abstrata onde diversas intensidades se mobilizam. Que forma assume um ímpeto interior ao atravessar este corpo multiforme e abstrato? De que forma pode “uma vida” revelar-se através da sua matéria sensível? E como é que a matéria se pode tornar um corpo sensível?
On immanence propõe um olhar sobre artistas cujos trabalhos se transformam em forças vitais, condutoras e emissoras de potências que se sobrepõe e dissolvem, moldadas pela energia que circula no seu âmago. Insistindo na presença física, a exposição desenha-se como uma rede dinâmica de intenções, sensações e pulsos que escapam à rigidez da forma, desafiando noções tradicionais de estrutura corporal, resistência, pertença e inscrição, para se manifestar na sensualidade palpável do mundo material. Aflorando dimensões oníricas, a exposição cartografa circulações invisíveis num território de abstração, um espaço onde a sensibilidade inconsciente floresce, livre de contenção. Aqui, a plasticidade vibrante e a sinceridade emocional entrelaçamse para criar um plano visual de dissonância, inscrito em corpos de natureza e origem ilimitadas, portadores de uma ambição por discurso e afirmação.
No limite de um desejo sem idioma, On immanence sugere um espaço sensorial onde a comunicação se ancora naquilo que se torna apenas visível no domínio da pura intenção. Na ausência de atributos linguísticos, o que permanece é a energia em movimento, pulsando em silêncio ao resistir o esquecimento.