Inspirado no breve texto de Virginia Woolf, The death of the moth, o título desta exposição, Wandering Moths, amplia preocupações de longa data da artista Belén Uriel: a tensão entre os objetos de lazer manufaturados e os corpos para os quais são feitos; o uso do vidro e do metal para moldar formas quase orgânicas; e a poesia discreta que emerge da esfera do funcional.
No texto de Woolf, uma pequena mariposa embate repetidamente contra um vidro de uma janela, presa entre o interior protegido onde a autora escreve e a vastidão da paisagem pastoral de outono lá fora, carregada de energia — lavradores e cavalos a trabalhar nos campos; um bando de corvos a voar em uníssono pelos céus. Embora aparentemente trivial em comparação, a luta da mariposa capta toda a atenção da autora e desdobra-se numa reflexão sobre a inevitabilidade da morte e a frágil, mas insistente, vitalidade da vida.
Aproximando-se destes temas, há algo de existencial no corpo de trabalho de Uriel, relacionado simultaneamente com o domínio da morte, com a sensação de estar presa numa prisão de vidro e com a ideia de observar as infinitas possibilidades da vida a partir desse ponto de vista limitado. Sugerindo natureza e força vital, a verticalidade das esculturas expostas na galeria, como estelas solenes ou sinais ascendentes, bem como a relativa solidez dos materiais de que são feitas — alumínio, cobre, ferro, vidro e aço — conferem a estas silhuetas sombrias uma sensação de força e elevação. No entanto, ao mesmo tempo, a sua aparente rigidez é contrariada por lampejos de vida que estas peças insinuam a partir do seu interior. Algumas lembram formas orgânicas ou esqueletos, como em Shell (fittings), para a qual, aliás, Uriel virou mochilas comerciais do avesso e usou as suas estruturas internas como moldes. Outras, como Insecta, assemelham-se a uma mariposa ou borboleta e apresentam o que parecem ser articulações modulares ou exoesqueletos — pesados, preciosos, mas frágeis.
Uriel é conhecida por trabalhar com objetos produzidos em massa, concebidos para apoiar e proteger o corpo no exterior: mochilas, capacetes, sacos-cama, todos banais nos seus designs, discretos e feitos exclusivamente para funcionalidade. Ela transforma-os — um gesto que se tornou parte do seu léxico artístico — para lhes dar uma medida de alma através de manipulações da forma, como se os corpos para os quais foram feitos se tivessem, em troca, impresso neles. Contudo, o vocabulário de Uriel vai para além da forma. Opera através de uma série de oposições subtis — entre o produzido em massa e o singular, o protetor e o vulnerável, a frieza inerte do metal e do vidro, e o calor da experiência vivida.
Assim, a ideia de temperatura torna-se uma das formas através das quais estas tensões se manifestam, não apenas como propriedade física, mas como conceito de proximidade, contacto e energia trocada. Por mais frias e, de certa forma, inóspitas que as superfícies das esculturas possam parecer, são contrabalançadas pelas ideias que carregam: conforto, impulso vital, formas orgânicas. Em Back, por exemplo — a impressão fundida de algo que poderá um dia ter abraçado a curva de uma coluna humana — ecoa o ato de reter e emitir calor na sua forma de aspeto derretido. Esta sensibilidade aos limiares materiais também é evidente no processo de moldagem da artista. Em Janela, por exemplo, o que pode parecer patas de inseto surge preso entre dois painéis — recordando a mariposa retida no vidro da janela de Woolf — ou a emergir por baixo deles. Para esta obra, e para as esculturas de pé no centro do espaço, Uriel criou moldes a partir de quatro tipos diferentes de painéis isoladores. A sua prática envolve frequentemente a exploração de variações dentro de produtos padronizados, tirando partido da qualidade genérica dos bens de consumo; mas, por outro lado, confere-lhes uma nova vitalidade através das operações escultóricas que realiza sobre eles. O resultado é uma tensão inquietante entre o banal e o poético, onde o que é quase invisível ou insignificante se torna carregado de um papel quase alquímico — capaz de nos transportar para outro domínio, viajando da neutralidade para uma espécie de sacralização.
Partindo dos materiais centrais para a prática de Uriel e dos temas que privilegia, a exposição liga o universo do lazer e do ar livre à necessidade de proteção contra os seus riscos — incluindo o risco de perder o fôlego ou a vida — homenageando os nossos corpos, e os dos pequenos seres à nossa volta, pelo desejo de vaguear e explorar as possibilidades da vida, ainda que lutando no processo. Nesta série, as obras parecem envoltas numa aura que lembra amuletos ou conchas funerárias — formas de proteção que também confinam, carapaças que abrigam mesmo enquanto impedem. Estas ambivalências ecoam as dualidades mais profundas e inquietantes da prática de Uriel: uma atração por objetos que mediam entre vida e morte, recreação e existencialismo, o detalhe singular e a banalidade comum. O que emerge é uma linguagem escultórica em que o quase invisível nos leva a considerar os nossos rituais, estratégias de sobrevivência e o simbolismo que lhes atribuímos. Onde uma pequena mariposa — quem se importa — pode desestabilizar-nos e levar-nos a fazer as perguntas mais fundamentais sobre os próprios meios da nossa existência.
(Texto de Cristina Sanchez-Kozyreva)
















