Encontrei com ele esperando o elevador de serviço do prédio onde resido.
Tinha nas mãos dois volumes grandes, mas leves, embrulhados num plástico transparente, aparentando serem almofadões. Ao me ver, disparou um simpático sorriso na minha direção e fez um aceno com a cabeça. Rebati na hora com um “boa tarde” e exibi também meus dentes. Foi simpatia à primeira vista.
Era um rapaz de uns 25 anos, trajando calça preta, camisa azul de mangas compridas e sapatos brilhando tanto quanto o seu sorriso. É claro que não se pode julgar um homem pelo calçado, mas confesso que admiro aqueles que os mantêm sempre limpos e em bom estado.
Tinha algo especial no olhar daquele rapaz. Pareceu-me que sorria com facilidade, talvez por hábito, talvez por esperança. Era como se carregasse uma alegria reservada a quem acredita que pode mudar o próprio destino.
Estranhei o fato de que ele estava fazendo uma entrega, mas não vestia roupas de trabalho. Não era o fato de estar bem-vestido para um entregador. Era a postura ereta, a fala clara, o gesto educado. Em tempos de pressa e indiferença, ele parecia fazer questão de não passar despercebido. Enfim, havia algo de diferente naquele jovem.
Logo me perguntou:
— Por favor, este elevador atende a coluna 4?
— Sim. É este mesmo.
— Ah, que ótimo. Estou com um pouco de pressa…
Olhou para o relógio de pulso, objeto que muitos jovens de hoje talvez nunca tenham colocado no braço, já que o celular o tornou praticamente desnecessário. Ele me deu a impressão de que precisava controlar o tempo muito constantemente, daí o uso do acessório.
Muitas vezes vivemos como se o tempo fosse infinito e assim corremos o risco de descobrir tarde demais que os minutos são nossas moedas mais valiosas. Ali estava aquele moço, contando os seus com a atenção de quem sabe o preço do próprio esforço.
O elevador chegou, abriu as portas e estava vazio. Entramos juntos e a conversa prosseguiu:
— Tenho que concluir esta entrega e correr para não me atrasar no outro trabalho.
— Você tem dois empregos?
— É. Sou também corretor de imóveis e tenho um plantão daqui a uns 30 minutos.
— Dupla jornada não é fácil — comentei.
— Pois é. Tenho que pagar a faculdade que faço à noite.
Passou pela minha cabeça que aquele rapaz, com pouca idade, já tinha maturidade. Sabia que suas conquistas na vida não viriam por acaso ou por sorte. Estava disposto a encarar o trabalho duro e o estudo, mesmo envolvendo muito esforço e sacrifício. Três jornadas diárias. Desdobrava-se no plantio hoje pensando na colheita amanhã.
Há quem pense que viver bem é viver sem peso. Mas, às vezes, é o peso que nos dá densidade, que nos impede de sermos levados pelo vento. Levar a vida com leveza, sim, mas não com vazio.
Na realidade, cada um de nós tem a sua cordilheira, às vezes invisível aos outros, mas imensa por dentro. E é o esforço de hoje que costura os dias seguintes, já que não existe conquista sem cansaço.
Aquele rapaz estava no meio de sua íngreme escalada. Não havia vitimismo em sua fala, pelo contrário, contou essas coisas em tom de empolgação, se exibindo, mostrando orgulhoso a sua disposição para enfrentar a batalha em que estava empenhado.
Enquanto alguns exibem carros importados ou roupas de grife, aquele jovem exibia entusiasmo e persistência em direção à sua vida futura. Ali estava o valor do ser e não do ter, coisa rara em nossos dias.
— Está cursando que tipo de Faculdade? — perguntei, para desfrutar mais da sua exibição que tanto me agradava.
— Estou estudando Direito. Terceiro ano, sim senhor.
— Você está realmente fazendo direito… — afirmei e fiz uma pausa. — Fazendo tudo direito. Ele sorriu com os olhos.
Eu o observava como a uma semente recém-plantada. Era cedo para saber o que dali nasceria, mas o solo — ah, o solo parecia fértil. A vontade de crescer pulsava forte naquele rapaz.
Fiquei pensativo. Quando a gente sabe que tem uma montanha íngreme para escalar, adquire a consciência de que precisa se preparar, fortalecer as pernas, se alimentar bem, conhecer as técnicas, aprontar o espírito e capacitar-se para o desafio. E aí dá-lhe esforço, suor e dores, para que seja possível alcançar o objetivo de chegar ao topo.
Ao atingir o cume, porém, vem a recompensa: a autoconfiança também vai para as alturas, a autoestima se agiganta e aí sim vem a sensação de que a vida vale a pena.
Por outro lado, quando o que há pela frente não é desafiador, é plano ou ladeira abaixo, uma vida fácil, confortável demais, cheia de gratuidades e garantias, com colheitas sem plantio, então corre-se o risco de ir-se de qualquer modo, ou melhor, deixar-se ir. Não é levar a vida. É a vida leve que me leve…
Neste caminho podem ser poucas as alegrias verdadeiras, a vida plena e realizadora. Sobram apenas meros prazeres e distrações, que precisam ser numerosos já que duram pouco e alimentam uma insatisfação sem fim.
Faz pensar na ideia de que, enquanto o poço não seca, não sabemos dar valor à água.
O elevador já chegava no meu andar quando o moço sem poço arrematou a nossa conversa:
— Estou correndo atrás — e levantou as sobrancelhas, sorridente. Neste momento o elevador abriu a porta. Antes de sair, bati com a mão em seu ombro e disse:
— Nada disso. Você está correndo na frente!