Nos últimos anos, a desconfiança nas instituições políticas tem aumentado de forma alarmante, e isso é visível no crescente índice de abstenção eleitoral. A falta de ligação entre os eleitores e os políticos, aliada à perceção de que a política não responde às necessidades da população, tem levado muitos a se afastar do processo democrático. Mas o que está por trás dessa crise de legitimidade? Será que a classe política tem culpa na desvalorização do ato de votar?

Em regra geral, os países do norte da Europa apresentam melhores resultados no Índice Democrático pelo Economist Intelligence Unit (EIU), mas por quê?

Uma das possibilidades é serem países com uma forte cultura igualitária e de terem sido países pobres e austeros, mas com uma profunda tradição entre a sociedade e o poder político, para além de liderarem também o Índice de Desenvolvimento Humano na qual mede os níveis de riqueza e bem-estar e de serem dos países mais pacíficos do mundo.

Portanto tudo é perfeito nestes países, claro que não, olhando por exemplo para a demografia… A natalidade nos países nórdicos não é suficientemente elevada para garantir a manutenção do modelo social. E, a longo prazo, a sobrevivência dos próprios países. Precisam, por isso, de imigrantes agravando tensões já evidentes…, mas este é já um dos problemas da Europa em geral.

Na Europa, como por exemplo Espanha, Portugal, França e Reino Unido a taxa de abstenção tem vindo, em geral, a aumentar. Portanto este não é somente um problema de Portugal, mas como no resto da Europa. Portugal que nas primeiras eleições pós 25 de abril (1975) para as eleições para a Assembleia da República registou 8,5 % para em 2024 registar 40,2 %, um aumento muito significativo.

Será que este aumento significativo da abstenção ao longo dos anos reflete uma desconexão cada vez maior entre os eleitores e os políticos. A questão é: o que tem sido feito para reduzir essa abstenção? Propostas como o voto antecipado ou a imposição de multas para quem não vota têm surgido, mas será que essas medidas são suficientes para restaurar a confiança da população nas suas lideranças?

A verdade é que muitos portugueses, ao olharem para os seus governantes, sentem que a classe política não contribui de forma significativa para a diminuição da abstenção. Casos de corrupção, promessas não cumpridas e a constante troca de acusações entre partidos de diferentes espectros políticos têm apenas alimentado a descredibilização da política. Não faltam bons políticos, certamente, mas a imagem da classe política no geral está comprometida.

Como diz o ditado popular, "paga o justo pelo pecador". A falta de consensos e a ausência de uma visão clara e a longo prazo para os problemas do país são alguns dos maiores desafios. Por exemplo, como é possível que a falta de professores no sistema educacional ainda não tenha uma solução concreta? O que será do ensino português nos próximos anos? Será que a educação continuará a ser negligenciada, colocando em risco o futuro dos nossos jovens? A esta altura já se devia estar a planear a colocação de professores para setembro de 2025.

A ação política, quando ocorre, tende a ser reativa, muitas vezes surgindo apenas após uma crise ou tragédia. Essa falta de proatividade e de visão estratégica para resolver problemas estruturais contribui para o descrédito. Como já dizia Júlio César, “Há, nos confins da Ibéria, um povo que não se governa nem se deixa governar.” Uma política de constante improvisação e de soluções temporárias não é capaz de gerar a confiança que as democracias modernas exigem.

Além disso, a classe política em Portugal peca pela sua falta de proximidade com os cidadãos. Embora as autarquias desempenhem um papel importante, há uma clara desconexão entre o governo central e os eleitores. Ouvir os cidadãos de forma mais ativa, como através de referendos e consultas populares, poderia ser uma solução para melhorar essa relação. Isso poderia criar uma sensação de participação e de responsabilidade coletiva.

Ordinariamente todos os ministros são inteligentes, escrevem bem, discursam com cortesia e pura dicção, vão a faustosas inaugurações e são excelentes convivas. Porém, são nulos a resolver crises. Não têm austeridade, nem conceção, nem instinto político, nem experiência que faz o Estadista.

(Eça de Queirós)

Esta crítica continua a ser relevante, pois, apesar das boas palavras e das aparências, a classe política portuguesa muitas vezes falha em encontrar soluções concretas para os problemas reais da população. A solução para a crise de confiança política não passa apenas pela implementação de medidas como o voto antecipado ou a multa para os ausentes. É preciso, sim, que os políticos comecem a ouvir mais os cidadãos, a tomar decisões que beneficiem o país a longo prazo e a trabalhar com uma visão estratégica. Não basta governar no "aqui e agora", é necessário construir um futuro que seja sustentável para todos. Se a classe política não se renovar, o afastamento da população da política será irreversível.

Em última instância, a política precisa ser mais do que uma série de decisões institucionais e partidárias. Ela precisa ser uma prática genuína de compromisso com o bem comum, com a resolução de problemas reais e com o fortalecimento das instituições democráticas. Só assim conseguiremos restaurar a confiança dos cidadãos e combater a crescente abstenção eleitoral. A renovação da política começa por uma atitude de maior proximidade, de maior transparência e de um compromisso real com a resolução dos problemas do país.

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(Fonte: Índice Democrático pelo Economist Intelligence Unit (EIU))

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(Fontes de Dados: SGMAI - Base de Dados do Recenseamento Eleitoral (eleitores) | Escrutínio Provisório (votantes). Fonte: PORDATA)