Colocamos tudo numa só plataforma e lá vai ela, sem freio nem direção. Não entendemos nem queremos saber. Existe uma enorme desvalorização em torno de uma palavra que pode ser tudo, mas tudo já pode ser demais. Pode significar tudo, mas cuja amplitude frequentemente já se torna excessiva, desequilibrada. Há uma vulgarização, um desconforto, carregada de uma ambiguidade enorme, estonteante, desconfortável, em torno de algo que tem, efetivamente, um significado.
E por isso, falamos sem saber, falamos sem querer. Englobamos e confundimos. Queremos ser democratas e inclusivos, mas só excluímos.
Perdemos a noção do que estamos a fazer, até que as consequências comecem a ser implicadas na matéria. Até ser simplesmente impossível de ignorar.
E lá vem a história, uma história que se repete, por falta de noção e de estudo. Por falta de entender cultura e a implicância dela. Por englobar tudo numa bolha e não querer entender. Por assumir e presumir, sem querer, ou por autonomamente querer.
Cultura é tudo, mas tudo às vezes é demais, repito.
Afinal, vivemos tempos conturbados, mas ainda não sabemos. Uma maré paradoxal, sem rumo e carta marítima. Vivemos tempos de uma complexidade singular. Invulgar, até. Entre desdobramentos complexos, ideias pré-feitas, atos pré-concebidos, consequências impensáveis, e repetições num loop insaciável.
Estamos menos maturos, menos capazes, menos dedicados, pois afinal tudo é cultura. Pensar tornou-se cansativo. Estaremos perante as novas gerações do séc.: XXI. Não precisamos de nos preocupar. Afinal, tudo pode ser englobado numa esfera singular e sem categorização. Para que afinal?
Assumimos que podemos fazer de tudo, menos sair do planeta. E quiçá.
No entanto, navegamos numa maré paradoxal, acreditamos que tudo é um dado adquirido, enquanto somos assombrados por arquétipos inalcançáveis e metas idealizadas. Não queremos viver para um objetivo, mas não podemos abdicar dele. Estamos submersos em vidas virtuais, contemplados por sofisticas utopias de vida distópicas, obcecados pelo progresso e o máximo de liberdade individual, o que consequentemente não nos permite parar e considerar o impacto psicológico desta loucura de procura incessante.
Não entendemos a necessidade da organização cultural até então criada, não entendemos porque hoje somos assim, porque desvalorizamos um passado obsoleto em questões pesadas e complexas que hoje, não queremos sequer saber.
Somos mais do que isso, supõem.
Quem permanece fiel, quem resiste às mudanças sem noção ditadas pelas massas, é rapidamente colocado a um canto, como duas latas de cerveja de Lavet varridas num momento de limpeza do LAM.
A coincidência.
Existe uma censura velada, diferente das que marcaram outros tempos mais azuis. Hoje, ser censurado é ser empurrado para uma enorme irrelevância por não seguir uma nova narrativa dominante.
Enquanto jovens, carregamos o peso de objetivos irreais. Não será esse o problema? O medo. A ansiedade. As novas formas obrigatórias de vida. O não acompanhamento até à meta. O medo de falhar.
Somos constantemente desafiados por falsas vidas, criadas por inteligências artificiais que alimentam a ideia de que já não somos suficientes. Mas esquecemo-nos que a inteligência artificial é só um código criado com tudo o que a mente humana já fez. Programado para a engolir e cuspir em formato de resposta.
Toda esta trajetória é irrelevante quando se falar de falta de informação e pouca procura da mesma, gerando mentes incultas e pouco trabalhadas, contra mim falo.
Tudo isso, coloca-nos numa posição errada no tabuleiro, deixamos de ser um cavalo para um mero peão. Diz-se que queremos estar onde não estamos, seja em que fase for da vida. Por questões comparativas erróneas. E querendo mais, somos mal entendidos. Orgulhosos e ambiciosos, vistos com mau tom. Sabendo mais, somos cultos. Querendo menos somos demasiado conformados com este trajeto a que apelidamos de vida. Nada está delineado, porque a cultura deveria estar?
Afinal, objetivos são efetivamente a gasolina dos nossos motores de esforço. A falta dela é complicada na composição do corpo humano e fabrico do conhecimento. A generalização leva à insatisfação e a satisfação da caminhada é o que torna a vitória significativa. Quando um objetivo é alcançado, surge a necessidade de criar outro. Isso, faz a vida andar. Mas tudo isso é colocado em causa quando passamos a duvidar do nosso próprio eu. Portas sem fechadura que não pretendem arranjo. A vida é uma longa caminhada, queremos tudo, e podemos tudo. Faremos de tudo, menos sair do planeta. E quiçá, repito.
Ainda assim, o pessimismo parece ser uma constante. Problemas antes raros são agora encarados como normais e, novas formas de viver surgem com a mesma rapidez com que evitamos lidar com as consequências. Tudo é cultura, e cultura não se enquadra em nada disso. Tudo, já pode ser demais. Estamos a abrir portas para dilemas complexos, e quem se recusa a atravessá-las é prontamente censurado. Esta é a censura dos tempos modernos, não se identifica como azul, uma censura que marginaliza em vez de silenciar diretamente.
Nesta dinâmica, é como uma esfera de vidro que gira precariamente, apoiada num pequeno eixo de metal. Volátil, explosiva, mas jamais deixa de existir. O que enfrentamos hoje não é uma reinvenção cultural, mas sim a complexidade de uma sociedade em constante transformação. Vemos a vida como um dado adquirido e muitas vezes escolhemos brincar com uma esfera perigosa sem retorno, negligenciando o impacto que essa atitude tem sobre o nosso interior.
Englobamos tudo e generalizamos.
Estamos focados ou desconcertados?
Vazios, mas com sentimento pleno.
Fazemos de tudo, e quiçá, sairemos do planeta.