Obrigado, grazie, danke, merci, thank you, gracias. Independente do idioma que usamos, agradecer é um ato universal. Essa expressão simples e poderosa perpassa fronteiras culturais e emocionais, trazendo consigo uma ciência fascinante: a da gratidão. Além disso, gera a tão almejada felicidade individual, que ressoa e impacta positivamente a vida social.

É bastante provável que esteja pensando que agradece sempre, mas nem sempre a felicidade está ao seu lado. O ponto é que não basta falar de maneira corriqueira, é preciso atitude na grATITUDE e, pasme, isso pode ser treinado para se tornar um hábito, afinal, embora dito por muitos, a gratidão é uma emoção complexa e sinérgica que envolve a apreciação do que se tem e a noção de que as coisas poderiam ser diferentes, mas sem esbravejar diante da circunstância. É a habilidade de ver as coisas boas, mesmo que pequenas, em um cenário onde tudo parece caótico. Consegue fazer isso?

Muito além da moda, de acordo com a Psicologia Positiva1, ser grato é o atalho — cientificamente comprovado — para a felicidade. A palavra gratidão deriva da palavra latina gratia, que significa graça e, de fato, é de graça. Porém, a epistemologia e a definição do verbete no dicionário não consegue expor a força que essa palavra carrega, pois é simultaneamente emoção, sentimento, consciência racional e uma maneira de agir. De acordo com o Dr. Pedro Calabrez, existem três tipos de gratidão:

  • Automática: usa a palavra gratidão demasiadamente, mas sem experienciá-la de verdade;
  • Passiva: ocorre em momentos intensos e pontuais, como, por exemplo, quando é promovido no emprego, quando compra uma casa ou ganha um carro, entre outros momentos considerados relevantes pela sua magnitude;
  • Ativa: escolhe ser grato(a) não só nos momentos pontuais.

Mas afinal, por que sentir isso é importante?

Estudos realizados pela Universidade de Harvard comprovaram que quando nos sentimos gratos, nosso cérebro libera hormônios responsáveis pelo sentimento de prazer e bem-estar, reduz o estresse, amplia o foco de atenção para os aspectos salutares, diminui as dores físicas, aumenta a resiliência emocional, fortalece o sistema imunológico e melhora a qualidade do sono.

A neurociência tem se dedicado a entender os efeitos da gratidão em nosso cérebro a nível biológico. Sim, ser grato tem o poder de acionar todos os quatro hormônios da felicidade:

  • Serotonina: regula o humor, sono, temperatura corporal, apetite e o ritmo cardíaco;
  • Dopamina: produz a sensação de compensação, prazer e auxilia no controle do humor. Além do mais, estimula o cérebro a completar tarefas;
  • Endorfina: é o analgésico natural fabricado em nosso corpo. Sua produção acarreta em melhoria do humor, alívio da dor, fortalecimento da memória, ajustes na concentração, rejuvenescimento e bloqueio de lesões nos vasos sanguíneos;
  • Ocitocina: provoca sensação de calma, aumenta o sentimento de segurança e diminui o estresse.

Assim, as pesquisas revelam que a prática do agradecimento genuíno ativa o córtex pré-frontal, a região responsável pelo pensamento racional e pela regulação das emoções, bem como do desenvolvimento da capacidade de formular metas, planos, inibição de respostas inadequadas, reconhecimento, alinhamento e supervisão das conquistas comportamentais - motivacionais- afetivas, flexibilidade cognitiva, monitoramento de estratégias. Em suma, isso significa que quem agradece diariamente tem o privilégio de tomar decisões mais assertivas.

Outra área cerebral acionada é o núcleo de accumbens, incumbido de estruturar o sistema de prazer e recompensa neuroquímica, capaz de ativar a motivação e transformar toda essa gama de entusiasmo asseverativo, regida pela dopamina, em uma resposta atitudinal. Ou seja, quem é grato, planeja com mais facilidade para alcançar um objetivo; avalia situações com base na memória emocional para evitar possíveis danos; aprende e integra novas informações com mais facilidade; é surpreendido com a sensação de prazer e bem-estar.

Ao observar os mecanismos cerebrais ao ser exposto ao ato de agradecer e seus benefícios, como a disseminação e replicação da felicidade, é fácil concordar com a veracidade e ver a profundidade de citações antes consideradas corriqueiras, como, por exemplo, quando Arthur Schopenhauer disse: A nossa felicidade depende mais do que temos em nossas cabeças, do que nos nossos bolsos. Roberto Benigni afirmou:

Demonstrar gratidão com moderação é sinal de mediocridade.

Não há como negar que quando a vida é preenchida de gratitude, há autoconhecimento, controle emocional, automotivação, empatia, ética e relacionamentos saudáveis. Mas, como desenvolvê-la em um mundo que tal ato está quase em extinção? Como supracitado, é possível treinar e moldar os padrões do cérebro para sentir gratidão e torná-la um hábito.

Em 1960, o cirurgião plástico Maxwell Maltz definiu a duração de 21 dias para criar um hábito. Porém, posteriormente foi observado que os neurônios não são capazes de assimilar um novo comportamento nesse período de tempo. Estudos realizados na University London, apontam que leva em média 66 dias para transformar uma ação em praxe. E tudo bem esquecer de agradecer um dia ou outro, mas manter a rotina de agradecimento aumentará as chances de colher os benefícios da dinâmica. Para isso, crie um plano de ação (em que momento agradecerá?), reflita sobre o porquê almeja adquirir esse hábito, abra-se para as infinitas possibilidades que o simples ato de dizer “obrigado”, “obrigada” pode trazer a sua vida e agradeça os resultados, mesmo os ínfimos.

Lembre-se que ser grato não deve ser encarado como uma obrigação ou dívida eterna para ser feliz, pelo contrário, quando o comportamento é moldado para mostrar o apreço e reconhecimento genuíno por algo ou alguém, ser grato passa a ser uma atitude espontânea e prazerosa, tanto que logo estará agradecendo até pelos desafios que o transformaram em quem é hoje, passa a ver o aqui e o agora — o único tempo mental que existe e tem uma sensação de contentamento, pertencimento e acolhimento.

Seguem algumas sugestões simples e ao alcance de todos para exercitar a gratidão:

  • Anote ou verbalize, diariamente, cinco coisas pelas quais sente-se grato(a) em sua vida, mas escreva ou fale também o porquê isso te faz sentir assim;
  • Reflita sobre o que traz satisfação em sua vida no tempo presente;
  • Pense em novas fontes de gratidão. Coisas que ainda não faz, mas poderia passar a fazer e que lhe traria satisfação;
  • Procure realizar pelo menos um ato de gentileza por dia, pois a gentileza estimula a gratidão, que gera mais gentileza e mais gratidão, formando um círculo virtuoso;
  • Veja o lado positivo de tudo;
  • Faça elogios sinceros a alguém, pois elogiar é reconhecer que;
  • Agradeça tudo o que já possui, isso não significa que não possa almejar outras coisas, mas implica em reconhecer e apreciar o que tem;
  • Sorria para as pessoas. O sorriso demonstra, entre outras coisas, gratidão pelas pessoas, sem contar que é contagioso.

Sucintamente, a gratitude é, sem dúvida, o idioma universal da felicidade, capaz de unir indivíduos de diferentes etnias e culturas em um sentimento comum de apreço e reconhecimento, debruçando o olhar para o “eu” interior na construção do “nós”. A dádiva da gratidão transcende barreiras, promove harmonia e fortalece os laços entre as pessoas, tornando-as mais conscientes das interconexões. Além disso, respaldada por estudos da psicologia positiva e da neurociência, a prática genuína da gratidão demonstrou trazer inúmeros benefícios para o bem-estar físico e mental. Portanto, cultivar a gratidão em nossas vidas diárias é essencial para alcançar uma necessária transformação pessoal e, por sua vez, contribuir com o progresso e a harmonia da sociedade global.

E você, já agradeceu hoje?

Notas

1 Seligman, M. E. P., Steen, T. A., Park, N., & Peterson, C. (2005). Positive psychology progress: empirical validation of interventions. American psychologist, 60(5), 410.