O corpo é uma ferramenta potente e transformadora. Nele existe um universo de possibilidades inatas. Conhecer-se é primordial para que movimentos variados aconteçam. Entender seus limites e desafios para desenvolver habilidades, é estar aberto para um repertório vasto.

Se pararmos para uma análise simples, dos movimentos óbvios do nosso corpo, notamos que, para realizá-los precisa existir uma sinergia. Esse conjunto de informações, de ações e movimentos com o tempo vão se aprimorando, evoluindo para outras etapas, novos lugares. Basta atentar-se às inúmeras variedades que estão enraizadas em nosso ser, assim passamos a arriscar-se ao desconhecido, visando abrir caminho para o novo.

Atualmente, infelizmente, nos deparamos com esse corpo estacionado, estagnado, preso ao mundo virtual, mundo esse que o que se movimenta são as mãos. É devastador o que está acontecendo, vidas sendo vividas entre quatro paredes, sem cores, sem cheiros, sem sabor, sem emoções, sem o convívio social, tudo caminhando de forma imediatista, sem processos, sem experiências. O superficial se tornou fundamental.

Raízes não profundas, não são suficientes para dizer e entender, o que sou? Para qual direção vou?

E as perguntas frequentemente aumentam, grande parte delas, sem respostas, e, sem interesse algum em mergulhar nesse lugar, pois exige trabalho, tempo, dedicação e muita paciência!

Ao percebermos as crianças, quantos ensinamentos podemos tirar. A vida acontece de forma pulsante, presente! Seu corpo, como diz o educador Marcelo Bueno, crianças não precisam de coisas e sim presença:

Amor, cumplicidade no olhar, nos gestos. Comida da alma, escola, brincadeira muita sempre. Criança para ser quem ela pode ser. É ela que guia, que ensina, que inspira e que ensina o cuidado com o mundo.

Nesse conjunto de relações, de proximidade, de acontecimentos, que o corpo se nutre, a consciência vai se compondo de outras vidas, e o corpo vai ganhando grande intimidade, o interior vai fazendo parte do exterior regulando todas as vivências e expectativas desse corpo em formação, e nos encoraja à pergunta: Onde podemos ir?

É como se estivéssemos colocando água em uma jarra, deixando-a trasbordar. A criança, ao se perceber atuante, parte de um todo revolucionário, livre de julgamentos e controles, entende toda a formação do seu corpo, toda sua existência e funcionamento, que cada movimento define uma escolha, uma direção, um sentido de ser e estar no mundo.

Nada disso é possível vivendo somente entre quatro paredes, tanto para os adultos, mas principalmente para as crianças. Mantê-las no mundo real, ter um olhar neutro, apurado à todas as necessidades e interesses dos pequenos, trazê-los para perto, no lugar do colo, da atenção, da valorização, do afeto.

A família tem um papel fundamental na constituição do corpo da sua criança. Usando uma analogia, é como se fosse uma argila sendo moldada para a transformação de um vaso, exige esforço, escolhas e atenção. Colocar essas questões em pratica, nos traz uma reflexão do nosso próprio corpo, vamos compreendendo os limites, falas, postura, atitudes inadequadas, caminhos muitas vezes tortuosos, desafiadores, que só sabemos onde vai dar, passando por ele, pisando nas pedras, atravessando rios e tempestades, isso também e reconhecimento do corpo.

O enriquecimento humano, o movimento de crescimento, de descoberta de si, também está ligado ao conhecimento da dor. O sofrimento, aparentemente, gera impotência, somos engolidos por um sentimento de paralisia, fraqueza, não conseguimos enxergar uma solução, uma saída. Entretanto, é nesse movimento que nos faz parar que temos grandes aprendizados, resinificamos muitas marcas. Nesse processo intenso somos tomados por uma autorreflexão, como se fizéssemos um resgate de tudo que foi vivido, experenciado, seria uma autoanalise diante do problema. Nesse ponto, o conhecer-se ganha força e primeiro lugar nessa trajetória, pois construir e carregar uma história também é uma regressão para novos olhares e expectativas.

Rupturas fazem parte do viver, perdas, abandonos, desenraizamentos. O corpo vai ganhando mais flexibilidade e vai se adaptando a novos jeitos de ser e de existir com o mundo e com as pessoas. Essas vivências desenvolvem a capacidade de improvisações, o lidar com o Eu, com o outro, com o nós, é enfrentar situações imprevistas quase que diariamente. Desapegar também é algo importante dentro desse processo, de lugares, casas, objetos, pessoas, se fazer gente está ligado a isso.

O exercício é aprender a viver no presente, com intensidade, o aqui e agora, o momento, assim o corpo vai sendo marcado e alimentado, povoado por diversas experiências e habitado pelo ato de ler outros corpos, observar, escutar e aprender.