Comidas para alma me fazem feliz, porque me levam a profundas memórias afetivas da minha mãe. Comidas que curam qualquer tristeza, mal-estar ou melancolia, são essas as tais receitas simples e caseiras que ela fazia trazendo um imenso conforto.

Há de se ter pequenos gestos e situações que te salvam de você e te levam ao estado de profunda alegria. São pequenos momentos como um por de sol vermelho pelas terras do serrado ou a chuva fina da mata atlântica, que cai evaporando um cheiro de infância.

Sextas-feiras ao cair da tarde me fazem feliz, não porque a semana foi ruim, mas porque me prepara para experiências fora da rotina, e isso gera alegria. Talvez porque essas experiências me façam encontrar um amigo num diálogo longo, cujo relógio não é o dono do tempo.

Secar ao sol jogando conversa fora tem uma leveza que abranda o pensamento e confirma o presente. Curativo para as exigências de estar no futuro sem que ele seja o protagonista.

Fazer pequenos buquês de flores e espalhar pelos jarros da casa, alegram a vida. Talvez porque nos façam sentir tão lindas quanto elas. E mesmo as exigências e compromissos do cotidiano, nos levam a sensações gostosas, de dever cumprido, aula realizada, boleto pago, projeto entregue, reunião produtiva, viagem sendo planejada, tela do computador sendo reiniciada. São estes dentre outros pequenos detalhes do cotidiano e que muitas vezes não apreciamos, que trazem bocados de alegria.

Há felicidades incríveis espalhadas por aí! Traduzidas por alegrias momentâneas que nos invadem espontaneamente! Para além do mistério e inacessibilidade ao qual foi colocado injustamente esse sentimento, ele é possível por meio das sensações de alegria e da quebra de controle absoluto. Via de regra culpamo-nos pelos momentos felizes, e então nos permitimos roubar nossos próprios sentimentos, pensamentos e ações. Traímos nosso íntimo da natureza instintiva, agridoce e louca, bons elementos para tal felicidade.

Somos infiéis ao nosso legítimo pedido de socorro ao belo, leve e bom.

Para além de todas as explicações cientificas, psiquiátricas, neurológicas, médicas ou mesmo psicológicas categoria essa a qual pertenço, e considerando todos os trabalhos das sinapses neurais, homeostase, e apoio incondicional dos remédios estabilizadores de profundas inquietudes, e sobretudo sem menosprezar qualquer um desses elementos citados, apoio-me na possibilidade existencial que liberta. Me apoio na pulsão de vida, e esta deve suplantar a pulsão de morte.

Quando o externo te causa dor, volta-se para seu interior, e busque novas conexões, e isso significa a quebra da repetição..

As estatísticas mais nos apavoram com seus dados de queda de felicidade, que nos orientam sobre as possibilidades de recuperá-la.

As tratativas medicinais naturais e orgânicos são milenares, e nos fazem um convite a entrar no jogo do equilíbrio. E quando falamos de equilíbrio sempre haverá mais de um elemento com o qual precisamos lidar. Incrivelmente no tempo presente os indivíduos querem restringir esses elementos. Inevitavelmente o que te faz ser é o “Outro” que te causa, e esse não deve ser eliminado.

Nenhum sistema se mantém operando solitariamente por muito tempo, então estamos falando em cadeias de valores que podem se estruturar em rede, para ajudar a emergir indivíduos mais pulsantes, vivos e desejosos, antes que entremos sem volta na inteligência artificial.

Por que mesmo com tantas possibilidades medicinais, cientificas, de autoajuda ou espiritual não conseguimos sentir felicidade numa segunda pela manhã? Somos tão exigentes buscando a excelência que ficou impossível ver as pequenas porções de sentimentos alegres, que facilitam o fluxo do nosso batimento cardíaco vibrando na frequência das possiblidades que se apesentam, e consequente as conquistas. Nos tornamos míopes!

Apegados a intransigência de que a vida é tão gigantescamente odiosa, chata e medíocre, e a ela devemos nos submeter condicionados ao fracasso, doença, pavor, carência, tédio, medo e impedimentos, que deixamos que essas sensações guardiãs atentas da infelicidade, causem danosos estragos. Evidentemente que o nosso sistema biológico capta essa mensagem, e o corpo grita sua dor e sangra, nos rasgando inteiros.

Creio que as pequenas porções de alegria estão sendo subestimadas.

No mundo do amor a felicidade parece fugaz!

No mundo dos negócios parece incompetência!

No mundo das amizades parece ingenuidade!

O que transforma tudo numa grande bobagem de egos vazios em busca de uma felicidade absolutamente etérea.

Sob o risco de parecer aparentemente leviana, prefiro encontrar a sanidade a partir da ponta do meu novelo de lã, e ir esticando-o, e me deixando atravessar, na possibilidade de sentir a tal felicidade.

Nos vemos já, já!