Actualmente, as publicações científicas dependem de um grupo internacional e muito heterogéneo de editores, no qual se acotovelam sociedades científicas, editoras universitárias e empresas do sector privado, por vezes, muito influentes. Neste meio, a busca do lucro máximo parece sobrepor-se, manifestamente, à aspiração de outrora de fomentar as sinergias entre os estudiosos.

O que se constata então? Três países apenas (Estados Unidos da América, Reino Unido e Países Baixos) detêm 71,1% das publicações científicas revistas pelos pares (contra os 65,9% de há uma década), não podendo este valor ser equiparado aos seus investimentos em investigação e às suas produções científica e técnica. Em contrapartida, os colossos da ciência como o Japão, os países da CEI - Comunidade dos Estados Independentes, a França e a Alemanha detêm, apenas, 14,9 % das publicações científicas. Se compararmos o peso científico de um país (que é calculado de forma um tanto arbitrária, proporcionalmente à sua quota de publicações científicas) à percentagem de publicações que edita, deparamo-nos com diferenças flagrantes: 8,5% contra 2,5% no caso do Japão e 5,2% contra 2,6% no caso de França.

O inglês: única língua de publicação

O desequilíbrio existente resulta, claramente, da escolha de uma única língua de publicação – o inglês – o que, muito obviamente, faz convergir a edição científica para os países de língua inglesa ou para os que lhes são mais próximos, na sua zona de influência.

No que se refere aos investigadores portugueses, uma das consequências da anglomania nas ciências traduz-se pela sua propensão para ignorarem os trabalhos dos seus homólogos que publicam em português, tanto contemporâneos quanto provectos. Mas os estrangeiros não anglófonos também não são recebidos de braços abertos e, nas publicações norte-americanas, só podem publicar os textos que se coadunam com as teorias em voga nos países anglo-saxónicos, pelo que as ideias dos grandes inovadores são susceptíveis de serem depredadas ou rejeitadas.

Suportar tamanho ultraje não será pagar um preço demasiado alto por uma notoriedade que, inevitavelmente, não é dotada de grande valor?

Empresas da “nova geração” procuram diversificar

No entanto, muitas empresas da «nova geração» rapidamente se aperceberam da importância das línguas além do inglês, como acontece com o Yahoo que desde muito cedo adaptou os seus motores de pesquisa e os seus serviços em linha às necessidades dos seus clientes internacionais, traduzindo, sistematicamente, todas as informações textuais.

Um problema persiste ainda: como é possível concretizar a comunicação científica internacional com o máximo de eficácia? Em resposta à questão, basta observar as práticas antigas, do início do século XX, dos cientistas nos colóquios internacionais. Ressalva-se que se trata de uma época extraordinariamente fértil, na qual o progresso científico e técnico foi urdido qualitativa e quantitativamente. Com efeito, este é um período de revolução científica sem precedentes na bistória dos homens, considerando que aí se lançaram as bases de todas as aplicações modernas do electromagnetismo e da física nuclear. O multilinguismo – e não o monolinguismo – fazia a regra. Os participantes apresentavam os seus trabalhos na sua língua materna ou numa das principais línguas científicas da sua escolha, que geralmente pertenciam à mesma família da respectiva língua materna.

A criatividade depende da linguagem

Podemos contemplar o final do século XIX e o início do século XX com uma certa nostalgia, à luz da admirável safra de estudiosos que produziu, bem como das incontáveis invenções engendradas. As informações científicas fluíam livremente pela Alemanha, França e Inglaterra e noutros países e, ao invés de se revelar um inconveniente, o plurilinguismo apresentou-se, provavelmente, como um excelente catalisador dessa extraordinária inventividade e dessa época áurea da ciência.

O florescimento da criatividade científica depende da linguagem e das suas estruturas. Um cientista que abandone a língua que lhe é mais familiar, para realizar o seu trabalho, nunca poderá alcançar o seu pleno potencial criativo e as suas contribuições raramente irão além da esfera técnica. Se aspiram à qualidade e à originalidade, os investigadores devem interiorizar que a formulação dos pensamentos mais inovadores requer instrumentos de reflexão e de expressão que não se interponham aos seus locutores, devendo estes preservar o domínio das suas definições e dos seus instrumentos de representação.