Então um dia simplesmente você acorda. Percebe que aquelas reuniões em família não possuem o menor sentido. Que a televisão só existe para passar o tempo. E que todos nós nascemos para um dia morrer. Dai você se sente cansado. Cansado de estar buscando algo que não vai te levar a lugar algum. Porque você sabe que no fim nós todos vamos pro mesmo lugar. Mesmo aqueles que se dizem mestres. Mesmo aqueles que acreditam ser iluminados. Quando você para pra escutar percebe que eles não fazem a mínima ideia do que estão falando.

Você senta um pouco. Respira. Relaxa. Repousa e descansa. E quando se sente renovado levanta e vai em frente. Só que agora alguma coisa está diferente. Você olha pro lado e não vê ninguém. E então percebe que está sozinho.

Agora não da mais pra ficar falando de futebol, de novela, ou da vida do vizinho. Porque agora você só quer discutir ideias que tenham algum sentido e possam gerar algo de produtivo no mundo. Agora, você só quer falar de assuntos que as pessoas consideram chatos porque elas não compreendem e não tem o que falar.

Agora não tem mais como ficar debatendo política com os conhecidos, porque você já se deu conta de que o Sistema foi criado para que nada mude, e as coisas permaneçam iguais a como sempre foram desde o início dos tempos.

Agora, você não pode mais odiar o próximo por mais que ele mereça ser odiado. Não pode mais responder suas atrocidades com atos de violência tampouco desejar que ele seja atropelado na rua. Porque agora você tem a consciência de que ele é seu irmão. E que apesar das diferenças ideológicas e culturais, se você deseja que ele te respeite pelo modo de vida que você decidiu ter então tem que passar a respeitar o modo dele primeiro.

Agora você não pode mais explodir com alguém por essa pessoa ser incompetente. Porque você compreende que as pessoas possuem diferentes limitações, e que se você está a frente de outros isso é uma benção. E também uma tremenda responsabilidade.

Agora você não pode mais culpar alguém pelo seu fracasso. Porque você sabe que se quer alguma coisa bem feita tem que fazer você próprio. E que somente você pode se auto derrotar.

Você está sozinho. Você olha para os lados e não enxerga mais ninguém. Enquanto os amigos te contam das farras nos fins de semana, você só consegue pensar em como é que podemos parar a fome na África.

Enquanto eles postam fotos ostentando as comidas que estão se deliciando ou os animais qual estão bajulando, você só se interessa por fotos de locais isolados e pergunta a si próprio o por que não está lá. O sexo passou a não ter o menor sentido. O corpo grita, arde em prazer, e quando termina o fim da química você se arrepende do que fez porque sabe que aquilo nada mais é do que uma necessidade corporal. De que a pessoa que realmente nasceu pra se conectar com você está perdida em algum lugar, e que existem muitas poucas chances de você se encontrarem nesta vida.

Então você compreende o preço do despertar. E você também finalmente compreende o que é estar sozinho. É nesse momento que você percebe o quanto as pessoas são felizes vivendo na sua vil ignorância. A Matrix descrita na famosa trilogia americana contracenada pelo famoso ator Keanu Reeves. O mundo ilusório e gratificante que nos cerca. Repleto das mais variadas ofertas de luxúria e prazer para nos manter conectados. Amantes insaciáveis dessa posição débil de dreamers.

E também como demostrado na trilogia, uma vez fora da Matrix nunca mais você pode ser inserido novamente. Uma vez desperto você nunca mais consegue voltar a dormir. E apesar da intensa dor, do peso da responsabilidade, e da profunda solidão de se caminhar sozinho, nós, os despertos, sabemos do quanto é glorioso você poder abrir seu terceiro olho. Porque a consequência que acarreta o despertar – e que nada mais é do que o preço que pagamos, o Yin Yang da existência – é proporcionalmente superada pelo nosso sentimento de gratidão. Porque a vista do horizonte é muito mais belo do alto da montanha do que da beira da praia.