Desde 1988 atuando de forma sistemática na área ambiental, descobri com o passar dos anos a mentalidade fatalista e irresponsável da maioria das pessoas no lugar no qual eu vivo e trabalho.

São vários os casos onde profissionalmente alertei de forma exaustiva por meio da imprensa ou diretamente aos órgãos responsáveis, as causas, consequências, alternativas de combate para inúmeros graves problemas ambientais do estado do Rio de Janeiro, sem que na maioria das vezes tenha conseguido evitar o desastre anunciado preventivamente.

Não adianta, pois vivo numa cultura da arrogância, da soberba, da irresponsabilidade e principalmente da impunidade, principalmente quando o assunto é o ambiente e existem interesses econômicos que falam muito mais alto do que qualquer lei.

Inicialmente percebi essa distorção de caráter em Angra dos Reis no final dos anos 80 do século passado quando os manguezais eram destruídos pela especulação imobiliária visando dar espaço para marinas e loteamentos de luxo. Ao contrário de proteger esse importante ecossistema devidamente protegido por dezenas de leis, os representantes dos órgãos ambientais daquela época, funcionavam como verdadeiros agenciadores das construtoras legalizando o ilegalizável. Apesar de todas as denúncias públicas nunca soube de nenhum agente público preso e tão pouco processado. Felizmente, devido nossa atuação naqueles anos, alguns milhões de metros quadrados de manguezais da baía de Ilha Grande foram salvos e prosperam até hoje.

Assim foi quando alertei sobre a eminente mortandade de peixes que ocorreria no ano de 2000 em virtude do lançamento generalizado de esgoto nas águas da Lagoa Rodrigo de Freitas em plena zona sul do Rio de Janeiro. Foram diversas reuniões com a empresa estatal diretamente envolvida, que monopoliza até hoje, os serviços de fornecimento de água e tratamento de esgoto, com encaminhamento de relatórios, etc, etc, etc, mas que nada adiantaram que evitasse a catástrofe ambiental. Portanto no verão de três anos consecutivos, precisaram morrer mais de 400 toneladas de peixes para que a sociedade se mobilizasse enquanto os governos estadual e municipal se culpassem mutuamente pela responsabilidade daquele desastre previamente alertado e que finalmente a estatal fosse obrigada a parar de jogar esgoto nas águas da Lagoa por meio de uma série de obras.

Mais uma vez, foi quando alertei sobre as gigogas e a ecobarreira rompida em 2007 e 2016. Ninguém deu muita atenção ao alerta apresentado por meio da imprensa e as gigogas saíram da baixada de Jacarepaguá e foram parar nas praias da zona sul e até em Niterói, município localizado do outro lado da baía de Guanabara.

Depois foi a história do campeonato de surf em 2015 e 2016 que seria praticado bem na área de lançamento de esgoto e outros contaminantes provenientes das lagoas da baixada de Jacarepaguá. Alertei para o problema publicamente, mais uma vez por meio da imprensa, mas os organizadores alegaram que eu "queria aparecer", como sempre se diz no Brasil quando alguém ou algum grupo se vê contrariado em seus interesses econômicos. Deu no que deu, isto é, atletas passando mal, com diarréias, vômitos, febre, tudo em virtude do contato com as águas poluídas que escoavam das lagoas durante a maré baixa. Em 2017, em consequência das péssimas condições ambientais das águas, como alertado desde 2015, o circuito da etapa que ocorria na cidade do Rio de Janeiro, teve de ser transferida para outro município com águas menos poluídas.

Agora recentemente, ao ser informado pela imprensa que o mega evento de rock que ocorrerá nos próximos dias no Rio de Janeiro, com um mega público e que efetuará uma mega queima de fogos na lagoa de Jacarepaguá (destaco que no Brasil, tudo tem que ser mega, provavelmente por algum problema de natureza psico-social que até hoje não entendi, como se o pequeno não fosse belo), alertei preventivamente com um mês de antecedência sobre o seguinte problema. A queima de 4,5 toneladas de fogos associados com o mega show pirotécnico na abertura do mega evento de rock traria um estresse monstruoso aos animais silvestres que ainda resistem na região, podendo inclusive levá-los à óbito.

Parece que apesar das explicações e das alternativas sugeridas, tais como o uso de fogos que não emitissem ruído, mais uma vez o que mandou foi a soberba (eu faço e aconteço), o marketing por um "mundo melhor" (resta saber para quem?) e em resumo, de forma bem objetiva, que os animais comprem tampões de ouvido, pois o show tem que continuar.

No Rio de Janeiro tem sido assim, você avisa, dá alternativas, mas praticamente ninguém toma conhecimento. Triste viver e trabalhar na área ambiental num lugar onde o que interessa de fato é a festa e o que ela irá gerar financeiramente, independente do custo ambiental que tenha.

Quem sabe no dia em que capivaras, jacarés, lontras, gambás e demais aves pagarem ingresso, o show pirotécnico venha a ser menos barulhento. Até lá, que se dane a fauna!