Entre as muitas características singulares dos animais chamados de Humanos está o gosto por nomear, datar, etiquetar, significar. Todos têm nomes e números de identificação. O Museu que nasceu e foi batizado de Paranaense, em 1876, é o espaço por excelência das identidades paranaenses.

Em mais de 143 anos, o museu foi mudando com a paisagem, os costumes, as gerações. O que recolheu, guardou, protegeu, vem contribuindo para alterar a percepção que cada paranaense tem de si e do Outro.

Ephemera/Perpétua é o nome desta exposição. Duas palavras com o mesmo número de letras. O uso deliberado da grafia antiga para ‘ephemera’ revela uma escolha simbólica, remete ao passado. O sinal gráfico de uma barra pode significar ponte ou pinguela de ligação.

Ephemera/Perpétua é o nome desta exposição. Ao atualizar-se a ortografia altera-se o número de letras e só ligeiramente seu sentido. Se as dezesseis letras da expressão escrita como antes encaixam com um infinito duplo, duplamente efêmero e perpétuo, as quinze letras da grafia atual promovem outra simetria: o mesmo número de letras de Museu Paranaense.

Se os aeroportos dão lição de partir, como ensinou um poeta, os museus ensinam como a natureza e as culturas se enlaçam, perpétua e efemeramente, numa espécie de fita de Möbius.

Há imagens nas paredes de um museu. Como nas cavernas. Não são iguais. Mas não porque um escancara, e o outro, oculta; ou um é mágico e o outro científico. Diferem porque um museu, embora tenha seus fundamentos no mundo arcaico, é uma invenção moderna e não será nunca aquele rio de Heráclito, onde jamais alguém se banha duas vezes. Será talvez a terceira margem de algum rio, como o de Rosa, “pondo-perpétuo”.

O mergulho no Museu Paranaense pode ser uma aventura em que as águas dos rios se congelaram com todo o seu entorno num dia de muito frio em Curitiba. Formaram um enorme espelho ou diversos espelhos, de variados tipos e tamanhos.

O Museu Paranaense é uma espécie de livros de memórias. Não de façanhas, mas do que restou delas. Vestígios esquecidos que um coletorrecoletor ou caçador (daquele gênero muito particular que são os pesquisadores) colheu, classificou, deu sentido, pôs em exibição. Todo museu tem um quê de jazigo efêmero e de berço perpétuo.

Entre os insetos há os efemerópteros. Dizem os especialistas que é a ordem de insetos alados mais antigos que existe na atualidade. Passam a maior parte de sua vida como ninfas aquáticas. Nesse estágio sobrevivem de vários meses a quatro anos. Quando finalmente emergem já é a etapa final de sua vida, que costuma durar em torno de um dia (às vezes menos, às vezes mais), quase todo ocupado em copular. Há fósseis de efêmeros que datam de 300 milhões de anos.

Existe uma flor, a Gomphrena globosa, popularmente conhecida como Perpétua. Mesmo quando seca, mantém a cor e a forma.

Os museus, que são, de certa maneira, seres minerais e imateriais, às vezes emulam corpos de efemerópteros e o espírito de perpétuas. O filósofo Adorno opinava que “museu e mausoléu estão conectados por algo mais que uma mera associação fonética”. Felizmente, não é mais assim, ou não é só assim. O museu paranaense é um exemplo do viço e vigor em meio às tormentas. Como se plasmasse aquele poema de Drummond tão precisamente intitulado Memória:

Amar o perdido/ deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido/ apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão”.