Chico Buarque de Hollanda é o amor platônico de muitas mulheres. Talvez sejam os olhos azuis, o sorriso comedidamente malandro ou o charme que só se aprimora com o tempo, entre cabelos grisalhos e rugas que contam histórias. Mas creio que grande parte desse fascínio feminino por Chico esteja entranhado em suas letras, embebidas em poesia, desejo e ambiguidade. Ele transita entre o romântico trovador e o malandro cafajeste, aquele que sussurra ao pé do ouvido, puxa os cabelos e bagunça lençóis, sem nunca perder a ternura.

Há quem se identifique com seu eu-lírico feminino e há quem o critique, apontando o machismo de algumas de suas composições. Discussões à parte, é impossível negar que Chico é um dos grandes gênios da música brasileira. Um dos poucos que conseguem traduzir em palavras aquilo que muitas vezes sentimos e não sabemos explicar. Ao lado de Gil, Caetano, Tom, Vinícius, Nara, Bethânia, Elis e tantos outros, ele fez história – não só na música, mas na própria identidade cultural do Brasil.

Não sou especialista em Chico Buarque. Sou apenas mais uma entre Beatriz, Iolanda, Geni, Luísa, Angélica, Ana, Rita, Carolina e tantas outras que já batizaram suas canções. Meu nome não está na lista, infelizmente, mas isso não me impede de tomar sua obra como um tesouro só meu. Amar Chico é um afeto particular, um segredo íntimo, quase um pacto silencioso entre eu e ele.

No auge dos seus 80 anos, Chico continua ativo em sua carreira e nas trilhas sonoras de muitos amores. Das relações longas aos encontros fugazes, há sempre uma canção sua que se encaixa no enredo. Escolher apenas dez músicas caracterizadas em minha visão e gosto pessoal como as mais sensuais entre tantas, é uma missão ingrata, mas me permito essa ousadia. São letras que não apenas excitam, mas provocam e seduzem, porque sensualidade não está apenas no que é dito, mas no que se insinua nas entrelinhas.

O meu amor

O meu amor tem um jeito manso que é só seu
De me fazer rodeios, de me beijar os seios
Me beijar o ventre e me deixar em brasa

Composta por Chico e imortalizada nas vozes de Marieta Severo e Elba Ramalho, O Meu Amor é um sussurro quente, um desejo dito sem meias palavras.

João e Maria

Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz

Um conto de fadas às avessas, onde amor e posse se misturam, evocando uma inocência quase perigosa.

Eu te amo

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

A despedida mais indecente e dolorosamente bonita da MPB.

Olhos nos olhos

E tantas águas rolaram
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você

É a revanche feminina em forma de música, um jeito doce e cruel de mostrar que a fila andou.

Tatuagem

E também pra me perpetuar
Em tua escrava
Que você pega, esfrega nega, mas não lava

A entrega absoluta ao desejo, sem medo de marcas, de nódoas ou de vínculos.

Valsinha

E ali dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda cidade se iluminou

O amor, quando sincero, transcende os corpos e ilumina até os vizinhos.

Folhetim

E eu te farei as vontades
Direi meias verdades
Sempre à meia luz

A personagem que se entrega, mas dita as regras do jogo. Sensualidade vestida de astúcia.

Trocando em miúdos

Trocando em miúdos, pode guardar
As sobras de tudo que chamam lar
As sombras de tudo que fomos nós

O fim de um caso contado em fragmentos, com a poesia cortante de quem ainda sente o gosto da despedida.

Sem fantasia

Vem, por favor não evites
Meu amor, meus convites Minha dor, meus apelos

Um chamado urgente e sem rodeios. Um pedido que não admite negativa.

Atrás da porta

Eu te estranhei, me debrucei, sobre teu corpo
E duvidei, e me arrastei, e te arranhei

É o amor que fere, que implora, que se revira. Que arde e não se apaga.

Eu já escrevi sobre Chico outras vezes por aqui. Pode soar repetitivo? Sim, mas pessoalmente acho que ele tem essa maneira peculiar de falar de amor, que às vezes fere, às vezes consola, mas quase sempre seduz.

Algumas canções são explícitas, outras apenas insinuam. Algumas se declaram, outras se despedem. Mas todas têm em comum esse jogo de palavras e sensações que fazem dele um dos maiores compositores brasileiros. E honestamente, meu favorito da vida.

E para você, qual a canção de Chico Buarque mais te transmite sensualidade?