A palavra "velho" muitas vezes tem uma conotação negativa, de algo usado, gasto e desgastado. Eu cresci com essa noção de que o novo é bom e o velho é ruim. Com raras exceções, como algumas bebidas alcoólicas, como o vinho e o whisky, e as panelas ("panela velha é que faz comida boa"), que são considerados melhores quando envelhecidos.

A noção de que o progresso e o desenvolvimento são algo bom é histórica. Lembro, quando era pequena, de todo o movimento para a construção de Brasília, que passaria a ser a capital do Brasil, além dos investimentos em siderúrgicas, montadoras de carros e na indústria em geral, voltada para o desenvolvimento através da exploração de recursos naturais. Foi um movimento importante, mas que se definia como algo bom, e ponto. Não me lembro de nenhum tipo de relativização ou ponderação sobre eventuais prejuízos desse desenvolvimento desenfreado.

Em minhas redes de amigos, em minha família, na imprensa e no governo da época, não se via nenhuma discussão sobre a complexidade do desenvolvimento.

Mais recentemente, ao circular por cidades fora do Brasil, principalmente em países europeus, como Itália, Holanda e Dinamarca, é impossível não se surpreender com a preservação do que é antigo. As construções, os palácios e as edificações em geral são absolutamente preservadas, muitas vezes fazendo referência ao ano de construção, às reformas etc.

Isso sem deixar de dar lugar ao novo, com edificações mais recentes e transporte coletivo de última geração. É impressionante como o que é antigo tem seu lugar, é preservado e cuidado, assim como o novo, que também tem seu lugar e está presente na cidade e na vida da população.

Na cidade onde moro atualmente, São Paulo, há hoje uma guerra das construtoras contra as edificações mais antigas de diversos bairros. Há uma corrida para a demolição de muitas casas e a construção de prédios altíssimos com apartamentos minúsculos. A procura por moradia na cidade grande e a ganância das construtoras, sem regulamentação e escrúpulos, promove a destruição do antigo em detrimento do novo.

A lei de zoneamento tenta proteger áreas residenciais e outras áreas de preservação, mas o lobby das construtoras é fortíssimo. Recentemente, houve um movimento de alteração da lei de zoneamento e o movimento do bairro onde moro se mobilizou para garantir a preservação da região. Os moradores mais antigos têm uma sabedoria importantíssima, pois nos contam sobre os movimentos que já ocorreram na história do bairro, os projetos que já foram apresentados à prefeitura, a história do bairro e de seus moradores. Uma verdadeira preciosidade.

Recentemente, li o livro do Nego Bispo1, A Terra dá, a Terra Quer, onde ele fala sobre a importância de descolonizar as palavras e propõe que a palavra "desenvolvimento" tem uma conotação colonial, ou seja, que promove a desconexão do ser humano com a Terra, os seres vivos e suas cosmologias.

A palavra "desenvolvimento" pode ser vista como algo positivo e bom, uma melhoria, um avanço, um progresso, mas qual foi o caminho trilhado para esse desenvolvimento? Esse caminho contempla a diversidade, promove a conexão e uma relação justa com as outras formas de vida?

O autor propõe que usemos a palavra "envolvimento" e que estejamos envolvidos e implicados em nossa existência, em nossa relação com os recursos naturais e em nossas relações com a vida.

Não são os discursos dos maquinistas nem dos passageiros e tampouco as políticas de viagens que fazem os trens mudarem de rumo… Um trem só muda de rumo quando muda de trilhos. Então, o que as sociedades, através de todos os seus aparelhos, precisam mudar são os seus conceitos. Em outras palavras, ao invés de desenvolver… envolver! Ao invés de produzir políticas… rever e/ou reeditar seus modos de vida.2

Se considerarmos os avanços das tecnologias digitais, vê-se um "desenvolvimento" desenfreado, que segue a lógica econômica de acumulação de capital, sobrevivendo da exploração de recursos naturais, explorados e retirados, em sua maioria, de países colonizados do sul global. A estrutura que sustenta atualmente o digital não é sustentável. Os recursos naturais necessários para a produção de chips, placas e componentes das CPUs (Central Processing Units), cabos, celulares, servidores e equipamentos diversos de acesso à internet vêm da exploração de recursos, em sua maioria, de países do continente africano.

Os trabalhadores, muitas vezes, estão sujeitos a condições precárias de trabalho, denunciadas em vários canais de mídia e documentários.

Um desses documentários começa com a narrativa do início do desenvolvimento de computadores pessoais, na década de 1970, nos Estados Unidos, que contaminou o lençol freático de uma cidade e provocou doença e morte de parte da população. Depois disso, toda produção foi transferida para a China. "O custo do vício digital", de Sue Williams3, aborda o consumo da tecnologia digital na sociedade contemporânea, destacando a profunda dependência, especialmente dos smartphones.

Nele, é exposto o ciclo de produção e descarte desses dispositivos, evidenciando os impactos ambientais e as condições precárias de trabalho nas fábricas chinesas. Ao enfocar a obsolescência programada e a falta de durabilidade dos produtos eletrônicos, o filme ressalta as práticas nocivas das grandes corporações. Enquanto revela a cadeia de consumo que vincula as pessoas a produtos de curta vida útil, o vídeo busca caminhos para a necessidade urgente de uma indústria mais sustentável e consciente.

A diretora chama a atenção para a durabilidade dos dispositivos, o descarte responsável e os sérios danos à saúde dos trabalhadores e ao meio ambiente global causados pelo descarte irresponsável, ressaltando a importância de se repensarem os padrões de consumo tecnológico.

Por fim, a urgência dos desafios da atualidade em relação ao clima, ao avanço das tecnologias e da inteligência artificial, à desigualdade e tantos outros, exige maior envolvimento, a valorização do antigo, a preservação do que já foi criado e a abertura para o novo, com o devido zelo com a história que já foi construída pela humanidade.

Notas

1 Santos, A. B. dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora, 2023.
2 Santos, A. B. Entrevista com Antônio Bispo dos Santos. Concedida a Thiago Mota Cardoso. Coletiva, Recife, abr. 2020.
3 Williams, Sue. O custo do vício digital (Death By Design). [Documentário]. EUA, 74’, 2016.