Durante a era medieval, Florença enfrentou guerras contra quase todas as cidades litorâneas da Toscana. Principalmente Pisa e Lucca, que ajudavam no comércio marítimo. O trauma na cidade de Lucca foi tão grande que grandes muralhas de pedra cercam sua área até hoje.

Durante um dos primeiros finais de semana de primavera na Itália, aluguei um carro Peugeot 2012 e descemos para a costa. As cidades litorâneas estão a apenas 2 horas de Florença, descendo por uma rota de curvas apertadas e montanhas verdejantes. As estradas italianas são excelentes: largas, com o asfalto novo e sem buracos. Os diversos túneis que cortam montanhas enormes são bem iluminados e sinalizados.

Porém o trânsito é caótico, não existem tantos caminhões pois o sistema de trens é o mais usado, mas ônibus e carros diversos fazem com que o caminho seja muito concorrido. Descer a cadeia de montanhas em alta velocidade e pelos túneis acaba sendo muito estressante. Chegar em Lucca é como poder respirar pela primeira vez em horas.

A cidade de Lucca é pequena e cercada pelas grandes muralhas, talvez por isso não seja preciso passar tanto tempo ali. É um local muito bem conservado, andar por dentro dela é reviver a época medieval um pouco. Logo depois dela, continuamos subindo até nossa atração principal: Porto Fino.

O que não te contam de Porto Fino: É belíssimo, mas na encosta de montanhas que apertam estradas mínimas entre um rochedo e o par pedregoso. Nas tardes o lugar fica tão cheio que é preciso escolher quem vai passar na rua: O ônibus, as motos, os pedestres ou o seu carro. Engarrafamentos, buzinas e xingamentos são muito comuns. Mas tudo bem, porque com a vista é até um pouco poética.

A cidade é super pequena e fica em volta de uma única praia pedregosa e o mar lhe tira o fôlego. A água é verdejante, cristalina e gelada. Ao fundo é possível ver ao menos uma centena de yachts e barcos de pesca, aproveitando a Riviera italiana. Os restaurantes ali ficam lotados e os preços são bem caros, na minha viagem tive a chance de experimentar apenas uma pizza sem pesar nas minhas finanças.

Porto Fino é, sem dúvidas, um sonho. A noite a atmosfera ainda é quente, leva muito tempo até que as pessoas se retirem e admirem o mar escuro e as estrelas brilhantes enquanto artistas de rua tocam é uma sensação poderosa.

Infelizmente só pude passar um dia e uma noite nesta linda cidade, pois logo após os primeiros raios de sol, antes que as estradas fossem inundadas pelos turistas novamente e tomando um café da manhã comprado em supermercado, pegamos o velho Peugeot e iniciamos nossa viagem a Cinque Terre.

Cinque Terre é na verdade um conjunto de 5 vilas centenárias na costa pedregosa da Itália, suas cidades são, em ordem: Monterosso, Vernazza, Corniglia, Manarola e Riomaggiore. Para chegar até Monterosso é necessário deixar os carros em um enorme estacionamento gratuito em cima da encosta e depois esperar com vários grupos por vans autorizadas que fazem o transporte pelas ruas estreitas, cercadas de vinhedos. Evitar o trânsito exacerbado é a melhor solução, mantém as vilas limpas, seguras para se caminhar e com menos poluição sonora.

Visitamos primeiro Monterosso, que é a mais plana e larga de todas as vilas, com uma praia de pedras que corre por alguns metros, a praia Fegina. Esta mesmo é sempre vigiada por uma estátua gigante do deus Netuno, cravada na colina em 1910 e espia os banhistas até hoje. O mar é mais verde na região de Ligúria, e a praia e os restaurantes ficam abarrotados de pessoas do mundo inteiro.

Crianças de todos os lugares brincam mesmo com o céu meio nublado, às vezes nem entendendo umas às outras, mas brincando. Homens e mulheres aproveitam o mormaço da praia, ou descansam na sombra das árvores típicas. O preço dos restaurantes é mais em conta, e comer uma pizza olhando para o mar é esplendoroso.

Como havia ainda quatro vilas para se conhecer, não consegui ficar muito tempo em Monterosso. A melhor maneira de visitar toda Cinque Terre é pelo sistema de trens que conecta o complexo. Os trens são vermelhinhos, as passagens são relativamente baratas e a viagem não chega a durar dez minutos. A linha férrea foi construída em meio a pedra maciça, entre colinas e o mar verdejante, passando por túneis enormes construídos por dentre pedras, é uma viagem inesquecível.

Como nosso tempo era pouco, resolvemos apenas conhecer Manarola, pois foi uma das inspirações para o filme Lucca, da Pixar. Chegando na vila é possível ver quase todos os frames do filme. A vila foi construída sobre as pedras, prédios lindos e altos à beira mar com janelas enquadrando a paisagem estonteante.

A praia é inexistente, uma baía de pedras perto da vila em formatos pré-históricos, de modo que as pessoas se amontoam sobre as pedras para pegar o pouco de sol ali. A água é gelada e reflete as pedras, tendo uma coloração bem escura, mas alguns corajosos pulam dos penhascos menos perigosos na água. A vila é tão famosa que estava lotada, todos os restaurantes cheios, pessoas dormindo, comendo ou lendo nas pedras pois era onde havia mais espaço.

Estranhamente foi ali que encontrei paz, sentada nas pedras, tomando gelato italiano e fazendo um pouco de people watching. Atualmente penso que devo ter perdido alguma coisa importante por não ter visitado as outras três vilas, mas não me arrependo nem um segundo de ter ficado ali durante a tarde.

A viagem de volta foi um pouco mais caótica, com muitas pessoas entrando no trem de uma só vez e uma correria para chegar à ponta de Monterosso antes que as vans parassem a circulação às 18h30. Ao deixar Cinque Terre durante o pôr do sol, só consegui pensar o quanto aquele lugar, aquela região da Itália, é realmente magnifica.