Para aqueles que desejam recordar a raiva e a liberdade de ser uma criança - ou para os que estão simplesmente à procura de um belo próximo livro - a minha recomendação deste mês é um favorito de longa data, Os Meninos da Rua Paulo, do autor húngaro Ferenc Molnar.

Na sua terra natal, o livro de Molnar é legitimamente considerado um clássico, e é leitura obrigatória do ensino secundário. Os jovens protagonistas do livro até já ganharam uma estátua na capital do país. Fora da Hungria, infelizmente, é um livro menos conhecido.

Os Meninos da Rua Paulo segue um grupo de jovens estudantes em Budapeste durante a primeira metade do século XX. O protagonista principal é Erno Nemeczek; um rapaz magricelo e pequeno, que constantemente corre atrás da aprovação de seus colegas. Todos os dias, depois das atividades escolares, Nemeczek e seus amigos se encontram em um terreno baldio na rua Paulo. Fazer parte desse grupo tão exclusivo dos Meninos da Rua Paulo é uma honra; não só porque eles tem um espaço tão bacana para brincar, mas porque se trata de um exército (nas palavras dos meninos). Se ser soldado já é muito bom, ser elegido capitão ou até coronel, é uma honra.

Os meninos são liderados por Boka, um garoto alto, moreno e justo. Nemeczek se esforça para seguir as regras estabelecidas pelo exército, e valoriza mais do que tudo o olhar positivo de seu platão, mas não passa de um soldado raso.

A história se intensifica quando um grupo de meninos mais velhos -um exército rival- ameaça invadir o terreno baldio e tomar o território deles. Esse exército tem como pátria uma parte do jardim botânico - um terreno interior ao ver deles. Os garotos se encontram em uma situação inimaginável: devem botar em prática seu treinamento e lutar para defender sua terra. Para Nemeczek, é o momento de mostrar que é um soldado exemplar. Ao longo desta guerra brutal, vemos os meninos passando por um momento de colisão: entre a infância - o mundo das brincadeiras e da liberdade - e o mundo de adultos em que estão ingressando, em que alguns assuntos predominam sobre outros; família, perda e lealdade adquirem significados novos e permanentes.

A compreensão de Molnar sobre a psique da criança é única - ele escreve sobre a necessidade pela amizade e a vontade de pertencer à algo de uma forma que soa familiar a todos. Embora o tema do livro seja "infantil", a forma como é escrito é tudo menos isso. Aos 11 anos de idade, existe alguma coisa mais importante do que ser aceito pelos amigos? Aliás, existe qualquer outra coisa? Lição de casa, horário de dormir, um interesse ou outro compartilhado com o pai… nada se compara. Esse era o caso em Budapeste no século XX, é o caso hoje em dia em São Paulo e Pequin, e seguirá assim sendo em qualquer momento, para qualquer criança, em qualquer canto do mundo.

Como adultos, tendemos a olhar para brincadeiras de crianças como simples e sem importância. No contexto de um país que em breve seria atingido por uma guerra "real", Molnar lembra-nos de ter uma olhar empático para as lutas de uns e de outros. Para Nemeczek, o pequeno de 11 anos, perder o lugar onde brinca com os seus amigos, onde ele pode ser uma criança, bem como um soldado, não é muito diferente de um homem adulto que luta pela sua pátria.

Os Meninos da Rua Paulo é uma obra sobre o ato doloroso de crescer, e força seus leitores a lembrarem de um momento da vida que tendemos a esquecer. É engraçado, triste e amoroso de uma só vez - não muito diferente da sensação que todos nós sentimos ao deixarmos inevitavelmente a nossa a infância para trás.