Nossas sociedades e nosso cotidiano se caracterizam por exercício de controle em tudo o que se faz. Conhecer leis, entender protocolos e seus desdobramentos cria capacitação para lidar com o sistema. Grandes aliados são encontrados no mundo digital. O Google é um manancial de informação que permite tudo atingir, basta saber teclar.

Esse mundo digital é asséptico, rápido e eficiente para controladores tanto quanto para controlados. Cada escolha, cada caminho é roteirizado, medido, vigiado. Os cookies, o desenho de nossas trajetórias na web, existem, funcionam e são devolvidos a nós, usuários, sob a forma de sugestões para consumo. Nossos perfis são elaborados, nossas preferências motivacionais resenhadas e assim ampliados os mercados. Nossa digitalização alimenta e é verdadeiramente controlada pelo mercado. O controle que exercemos é, em última análise, o que possibilita a captação de dados que são oferecidos para continuidade de controle. As interfaces se confundem.

Controlador e controlado são identificados enquanto faces da mesma moeda: são os dados que alimentam o nosso sistema atual, que amortecem e ampliam espetáculos submetidos a protocolos de lucro e consumo. As principais redes sociais planejam seus algoritmos a partir desse referencial - o lucro. Mesmo que o que apareça seja um suposto controle de cunho ideológico, esse é apenas um referencial identificador para classificações mercadológicas. Como manter as pessoas, o maior tempo possível, dentro da mesma plataforma, sem irritá-las com postagens antagônicas a suas crenças, sem que elas pensem em sair ou se desligar? Pelas classificações temáticas, por exemplo, de acordo com as questões mais polarizantes em cada sociedade que rapidamente organizam os dados, e o próprio usuário facilita e participa dos mecanismos de controle cada vez que assume uma bandeira de luta ou posicionamento em seu perfil: #elenão, #lulalivre, #orgulhogay, #orgulhohetero, #feminismo, #machismo, #proarmamentismo, #abaixoasarmas, #immigration, #HealthCareForAll, #AgainstTrump, #AgainstBrexit, etc. etc.

Dentro das “bolhas” maiores, que são cada rede/plataforma, e dentro das “bolhas” menores, que são os agrupamentos forjados pelos algoritmos e compostos por pessoas afins em valores e posicionamentos, o mercado se mantém e floresce; pensamentos circulam repetidamente, sem oposições, consequentemente sem conflitos e sem novidades.

O exercício fácil do controle no mundo virtual fortalece e amplia o controle já há tempos estabelecido na sociedade, nas casas, nas escolas, nos escritórios etc. via manipulação de valores, crenças e diluição de lutas, antíteses resultantes de processos, agora substituídos por palavras de ordem que em última instância remetem ao lucro, como por exemplo: “a globalização é inevitável”, “o crescimento da produção beneficia a todos”, “as mega empresas geram empregos”, “direitos das minorias são importantes”, “se não fosse a superpopulação…” etc.

Numa sociedade baseada no lucro não interessa excluir ninguém, basta controlar a diversidade, o excesso improdutivo, direcionando-os ao consumo. A liberdade de ir e vir, de decidir, de se posicionar, se opor, de criar e até mesmo de parar, é previsível e controlável, a menos que questionamentos sejam exercidos constantemente, contextualizados nas próprias motivações individuais, para assim neutralizar controles opressivos e vivenciados como ilusão de liberdade, de poder agir, de gerir a própria vida e dar condições para que seus filhos tenham uma vida melhor.