Este artigo aborda sobre uma zoonose bacteriana provocada através de bactérias do tipo Leptospira, sendo amplamente disseminada em ambientes urbanos, especialmente em locais com condições de higiene delicadas. Sua transmissão ocorre principalmente através da exposição a águas ou solos contaminados pela urina de roedores infetados, como Rattus norvegicus.
A análise espacial tem-se mostrado uma ferramenta essencial para identificar áreas de risco e planejar intervenções eficazes. Este artigo apresenta uma emenda a respeito dos fatores ambientais relacionados a leptospirose, destacando a importância da vigilância epidemiológica com vista a deteção de hotspots de transmissão. Além disso, discute-se a aplicação de metodologias de classificação de risco por setor censitário, com base em estudos realizados em contextos urbanos brasileiros e moçambicanos. A abordagem integrada entre saúde humana, animal e ambiental (One Health) é fundamental para enfrentar essa doença negligenciada.
Introdução
A leptospirose é uma enfermidade infeciosa emergente que esta sendo negligenciada porem, afetando muitas pessoas anualmente ao redor do mundo (Ahmed, Grobusch, Klaster, & Hartskeerl, 2012). Embora possa ocorrer tanto em ambientes rurais quanto urbanos, nos últimos anos tem ganhado destaque nas cidades, particularmente em comunidades vulneráveis com infraestrutura insuficiente.
Sua transmissão está diretamente ligada à exposição ambiental à bactéria Leptospira spp, eliminada na urina de roedores infetados, especialmente Rattus norvegicus (Costa, et al., 2014). Fatores como chuvas intensas, enchentes, deficiência no saneamento básico, acúmulo de lixo e infestação de roedores potencializam o aumento da infeção.
Todavia, a análise espacial tem sido cada vez mais utilizada para mapear a distribuição de casos e identificar áreas de maior risco de transmissão. Técnicas como SIG permitem cruzar dados epidemiológicos e ambientais, facilitando o direcionamento de recursos de saúde pública com maior precisão - (Brasil, 2006); (Pfeiffer, et al., 2008).
Este artigo busca explorar a relação entre leptospirose e fatores ambientais urbanos, enfatizando a relevância das análises espaciais na vigilância da doença e na formulação de políticas públicas integradas.
Epidemiologia e impacto global
Projeta-se que por ano surjam cerca de um milhão de casos da doença no universo com cerca de 50000 óbitos (Costa, et al., 2014). Esses números são provavelmente desconsiderados, uma vez que a maioria dos casos não são identificados ou notificados corretamente, especialmente em países em desenvolvimento (Adler, 2015).
A forma clínica da doença pode variar desde sintomas leves, como febre e dores musculares, até complicações graves, incluindo hepatite hemorrágica, insuficiência renal e síndrome pulmonar, com taxa de mortalidade que pode ultrapassar 70% em casos não tratados (Costa, et al., 2014). Além disso, a similitude clínica com outras arboviroses, como dengue e Zika, contribui para a subnotificação e diagnóstico tardio (Larocque, Luckai, & Riopel, 2005).
Fatores ambientais associados ao risco
A leptospirose está intimamente ligada a fatores ambientais e sociais. Entre os principais estão:
Chuvas intensas e enchentes frequentes: facilitam a contaminação de corpos hídricos e solos.
Deficiência no saneamento básico: aumento do contato humano com águas contaminadas.
Infraestrutura urbana inadequada: falta de pavimentação e drenagem eficiente promove alagamentos frequentes.
Acúmulo de lixo e resíduos sólidos: cria ambientes propícios para a proliferação de roedores.
Baixa qualidade das habitações: moradias próximas a córregos e lixões favorecem a exposição.
Em áreas urbanas, esses fatores são mais comuns em assentamentos informais, onde a densidade populacional elevada e a carência de serviços básicos potencializam o risco de surtos.
Papel dos roedores na disseminação da doença
Os ratos urbanos, especialmente Rattus norvegicus e Rattus rattus, são tidos como os vetores primários na transmissão da leptospirose. Estudos realizados em Salvador, Bahia, revelaram que mais de 60% dos ratos capturados eram portadores de Leptospira spp. (Costa, et al., 2014). Esses animais excretam a bactéria na urina por longos períodos, mantendo-a viável no ambiente por semanas ou meses, dependendo das condições climáticas (Levett, 2001).
Como os roedores são assintomáticos, métodos sorológicos podem ter baixa sensibilidade. Nesse contexto, técnicas moleculares, como PCR, têm-se mostrado mais eficazes para detetar a presença da bactéria nos rins desses animais (Picardeau, 2013).
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico da doença é feito através dos métodos abaixo indicados:
Soroaglutinação microscópica (SAM): considerado padrão ouro, mas requer amostras pareadas (Bharti, et al., 2003).
PCR: técnica molecular rápida e precisa, útil na fase inicial da doença.
Cultura bacteriana: embora específica, é lenta e pouco sensível.
O tratamento envolve antibióticos, como penicilina e doxiciclina, e, em casos graves, suporte hospitalar com monitoramento renal e respiratório (Waggoner & Pinsky, 2016).
Análise espacial e identificação de áreas de risco
A análise espacial tem sido uma ferramenta valiosa para identificar áreas de alto risco de leptospirose. Técnicas como SIG (Sistemas de Informações Geográficas) permitem mapear a distribuição de casos humanos e fatores ambientais associados, facilitando intervenções específicas e direcionadas (Brasil, 2006).
Ao cruzar dados sobre infraestrutura, saneamento, ocupação urbana e presença de roedores, é possível identificar "hotspots" de transmissão e planejar ações preventivas mais eficazes (Pfeiffer, et al., 2008).
Metodologia de classificação de risco por setor censitário
Um método recentemente utilizado divide setores censitários em áreas de alto e baixo risco com base em indicadores ambientais. Em Quelimane, Moçambique, foram utilizados nove fatores:
Pavimentação.
Presença de córrego.
Acúmulo de lixo.
Esgoto a céu aberto.
Arborização.
Cobertura verde.
Reclamações de roedores.
Amostras de rim de ratos capturados nesses locais foram analisadas por PCR, revelando uma correlação direta entre a presença de Leptospira spp. nos roedores e a incidência da doença na população humana (Paulino, 2023).
Considerações finais
A leptospirose apresenta-se como uma enfermidade negligenciada e que afeta maioritariamente a população em situação de vulnerabilidade social. Seu controle requer políticas públicas integradas, com melhorias no saneamento, manejo de roedores e educação da população. A utilização de tecnologias espaciais pode auxiliar na priorização de áreas críticas e na redução da morbimortalidade associada à doença.
Investir em abordagens multidisciplinares, como a Saúde Única (One Health), é essencial para enfrentar esse problema de saúde pública de forma sustentável e eficaz. Além disso, a validação de metodologias de classificação de risco por setor censitário pode transformar a gestão local de saúde, tornando as intervenções mais precisas e direcionadas.
Referências bibliográficas
Adler, B. (2015). Current Topics in Microbiology and Immunology and Leptospirosis. Berlin, Germany.: Springer Berlin Heidelberg.
Ahmed, A., Grobusch, M. P., Klaster, P. R., & Hartskeerl, R. A. (2012). Molecular Approaches in the Detection and Characterization of Leptospira. Journal of Bacteriology & Parasitology., 2155-9597.
Bharti, A. R., Nally, J. E., Ricaldi, J. N., Matthias, M. A., Diaz, M. M., Lovett, M. A., & Vinetz, J. M. (2003). Leptospirosis: A zoonotic disease of global importance. The Lancet Infetious Diseases., 757-771.
Brasil, M. S. (2006). Abordagens Espaciais na Saúde Pública. Brasília.: Editora do Ministério da Saúde.
Costa, F., Ribeiro, G. S., Felzemburgh, R. D., Santos, N., Reis, R. B., Santos , A. C., & Ko, A. I. (2014). Influence of Household Rat Infestation on Leptospira Transmission in the Urban Slum Environment. PLoS Negleted Tropical Diseasses., 2579.
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Levett, P. N. (2001). Leptospirosis. Clinical Microbiology Reviews., 296-326.
Paulino, G. T. (2023). Prevalência e Fatores de Risco Associados à Leptosirose na Saúde das Comunidades Próximas ao Aterro Sanitário Municipal da Cidade de Quelimane: Os perigos associados aos ratos. Dissertação de Mestrado em Saúde Pública., Universidade Católica de Moçambique.
Pfeiffer, D. U., Robinson, T. P., Stevenson, M., Stevens, K. B., Rogers, D. J., & Clements, A. C. (2008). Spatial Analysis in Epidemiology. Reino Unido.: Oxford University Press.
Picardeau, M. (2013). Diagnosis and Epidemiology of Leptospira Infections. Interdisciplinary Perspectives on Infectious Diseases., 1-10.
Waggoner, J. J., & Pinsky, B. A. (2016). Multiplex Molecular Assays for the Diagnosis of Leptospira Infection: An update. Expert Review of Molecular Diagnostics., 11-25.















