É muito comum que as famílias se preocupem com a escola que seus filhos frequentarão no Ensino Fundamental e no Médio, pois estas “os prepararão para a universidade e para o mundo do trabalho”. Pois bem, antes de mais nada, a noção de que a educação básica está sempre a preparar apenas é complicada: ela é a própria vida acontecendo e não somente uma eterna preparação para o futuro.
Outro ponto, e já trabalhado em outro texto meu por aqui, é que as escolas deveriam muito mais ser espaços de transformação do mundo do que de preparação para enfrentá-lo a qualquer custo. No mais, considerando que a escola pode e deve ser também um espaço de construção do ser, assim como a família e a comunidade, a preocupação com a educação infantil deveria ser muito mais profunda do que os níveis posteriores, não sendo apenas um lugar para deixar os bebês enquanto trabalhamos.
A educação infantil é a base do desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças, desempenhando um papel fundamental, por exemplo, na aquisição da leitura e escrita. Esse estágio educativo, que abrange a faixa etária de zero a seis anos, é essencial para a construção das habilidades linguísticas e alfabetizadoras que acompanharão o indivíduo ao longo de toda a vida.
Desde o nascimento, as crianças estão imersas em um ambiente de aprendizado contínuo. A educação infantil deve oferecer estímulos apropriados para cada etapa do desenvolvimento cognitivo e linguístico: crianças expostas a um ambiente rico em palavras, histórias e conversas tendem a desenvolver habilidades linguísticas mais robustas. Esse ambiente propício é cultivado através de práticas pedagógicas que incentivam a curiosidade, a exploração e a interação, além do livre brincar.
O ambiente escolar, cuidadosamente planejado, é fundamental para a aquisição da leitura e escrita. Nas salas de aula da educação infantil, as crianças têm acesso a uma variedade de materiais didáticos, como livros ilustrados, jogos educativos e atividades de leitura compartilhada. Um ambiente preparado e pensado para a criança é fundamental: espaço livre, solar, seguro.
Infelizmente essa nem sempre é a realidade das escolas brasileiras, públicas e particulares. Além disso, é de extrema importância a presença de educadores capacitados que utilizam estratégias lúdicas e interativas que facilitam a compreensão dos conceitos básicos da leitura e escrita e que conseguem perceber inclusive quando o desenvolvimento daquela criança não está dentro do esperado, para que possíveis intervenções precoces possam ser realizadas. É urgente pensar em política de valorização, inclusive salarial, dos profissionais que atuam nesse segmento.
A alfabetização não é um processo que começa apenas quando a criança entra no ensino fundamental; ela se inicia muito antes, nas experiências cotidianas da educação infantil. As atividades realizadas nessa fase ajudam na construção das habilidades prévias à alfabetização, como a consciência fonológica, o reconhecimento de letras e a familiaridade com o formato e o funcionamento dos livros. Uma educação infantil que não explora suas potencialidades pode deixar lacunas que por sua vez, se transformam em dificuldades de aprendizagens – e muitas vezes é necessário intervir retomando a construção dessas mesmas habilidades, mesmo na vida adulta.
A leitura compartilhada, onde o educador lê em voz alta para as crianças, é uma prática essencial na educação infantil. Essa atividade não apenas expande o vocabulário e melhora a compreensão auditiva, mas também desperta o interesse pela leitura. A interação durante a leitura, com perguntas e discussões sobre a história, promove habilidades críticas de pensamento e interpretação.
Histórias interativas, utilização de livros com ilustrações atrativas e histórias envolventes, onde as crianças são incentivadas a participar ativamente, respondendo perguntas e antecipando acontecimentos, são exemplos de práticas eficazes. Realizar leituras em grupo, onde cada criança tem a oportunidade de interagir com o texto e com os colegas, promove a socialização e o aprendizado colaborativo. Projetos de leitura que envolvem leitura e atividades correlacionadas, como dramatizações e desenhos, reforçam a compreensão e o prazer pela leitura.
A educação infantil também desempenha um papel crucial no desenvolvimento emocional e social das crianças. As competências emocionais e sociais adquiridas na educação infantil influenciam diretamente a aquisição da leitura e escrita. Crianças que se sentem seguras e confiantes são mais propensas a se engajar em atividades de leitura e escrita. Além disso, a capacidade de trabalhar em grupo e de compartilhar ideias contribui para um ambiente de aprendizado colaborativo e enriquecedor.
A educação infantil é uma etapa crucial na formação das bases para a leitura e escrita e principalmente para leitura do mundo. As práticas pedagógicas desenvolvidas nesse período, que incluem atividades lúdicas, leitura compartilhada e desenvolvimento de habilidades prévias à alfabetização, são fundamentais para o chamado “sucesso escolar”, mas muito além disso, e o que é realmente importante: ampliam repertório para que sejam seres que pensam e interagem com o mundo, cada um à sua maneira.
Investir na educação infantil é, portanto, investir no futuro de nossas crianças e de nossa sociedade, mas não somente. É garantir que estes pequenos, em seu processo de formação, tenham espaço propício para vivenciar o mundo hoje.