O quanto importa a representatividade em lugares de grande destaque na sociedade não indígena? Como ocupar os espaços das instituições museológicas?
A experiência de compor um projeto de curadoria compartilhada pode ser uma forma de responder a essas questões. Nós, estudantes indígenas, juntamente com a equipe do museu, apresentamos a exposição Mejtere: histórias recontadas. Nela, buscamos maneiras de reinventar uma narrativa sobre os povos indígenas – que por muitos anos foi controlada por não indígenas –, reforçar a importância da representatividade em museus e outras instituições e também afirmar nossa existência dentro de uma sociedade ampla, desmistificando os estereótipos sobre nós disseminados nos livros de história.
O projeto curatorial partiu de um encontro aprofundado com o acervo do Museu Paranaense e foi enriquecido com a aquisição de novos objetos e obras. Com essas escolhas, buscamos ressignificar a história dos povos indígenas do Brasil a partir do olhar, da escrita, da oralidade, da arte, do canto e das diversas produções culturais de cada povo.
Nesse direcionamento, a exposição reconta histórias através de cinco núcleos que estão ligados entre si, como é a própria cultura indígena – conectada em todas as suas maneiras de existir. “Todas as coisas são pequenas”, “Fiandeiras guardiãs: carregando histórias”, “Tessituras da terra”, “Coração na aldeia, pés no mundo” e, por fim, “Resistências: nada para nós sem nós” são os núcleos que formam a exposição. Objetos e textos demarcam a linguagem dos diferentes povos, nossos modos de vida, riqueza étnica, artes, nossas diferentes formas de conduzir os ritos cosmológicos e as relações com os não indígenas. As histórias de massacres e apagamentos existem, como também existem outras: histórias das resistências, das afirmações identitárias e das múltiplas estratégias de manutenção das culturas, apesar de cinco séculos de ataques.
O que propomos é o despertar do pensamento crítico, a desconstrução de imaginários construídos e impostos historicamente em nossas mentes e sobre nós. Entendemos que descolonizar a mente dos efeitos da colonialidade do ser, do poder e do saber colabora com a ampliação da reflexividade e encaminha as discussões sociais na direção em que elas devem ser construídas.
No Brasil existem 305 povos indígenas enraizados em todas as regiões do país, falantes de 254 idiomas, detentores de filosofias, saberes e histórias únicas, que muitas vezes envolvem relações com mundos diferentes. Mundos em que animais, vegetais e espíritos, por exemplo, fazem parte da sociabilidade humana.
A terra é uma árvore e nós, os seres, somos as sementes. Estamos deixando outras sementes ressignificando a história (des)contada ou/e não contada. Agradecemos aos nossos ancestrais, pois o mérito não é individual e nunca será. O caminho tem várias marcas, suor, vermelho, jenipapo, gritos e ritos – nele ficaram as pegadas dos nossos velhos, as nossas próprias pegadas e outras que virão.