Convidei-o para fazer um passeio na Floresta da Tijuca, uma das maiores florestas urbanas do mundo, que fica na cidade do Rio de Janeiro. Ele aceitou na hora. Completamente apaixonado pela natureza, nunca recusaria um convite destes.

Eu havia conhecido ali uma trilha leve, quase toda plana, sombreada, excelente para caminhar, respirar, escutar e usufruir de uma pausa na vida de cidade grande.

Num desfile de moda a beleza está em quem caminha na passarela, mas naquela trilha quem caminha é que desfruta da beleza. Uma alternância de árvores e vegetações menores, pássaros e pequenos animais, riachos murmurantes e um cheiro perfumoso, inigualável, que vai mudando com a paisagem numa deliciosa miscelânea. Ventos e sopros vindos sabe-se lá de onde, provocando um frescor na alma.

Desde o dia em que estive lá pela primeira vez, só me ocorria trazê-lo para conhecer este pedacinho de mata, milagrosamente ainda virgem e intocado em meio ao gigantismo e aridez da cidade.

Numa manhã de sábado do mês de abril, o mais belo do ano no Rio de Janeiro, ingressamos na trilha. A minha expectativa era muito alta: eu o conhecia há muito tempo e sabia que sua marca mais forte era o amor à natureza. Lembrei-me dele várias vezes olhando a lua cheia, com os braços abertos feito um Cristo, agradecendo a Ele por aquela criação divina. Ou como se desejasse entregar-se àquele brilho prateado e ir até lá para conhecer de perto.

Fomos caminhando lado a lado e desde os primeiros passos os olhos dele brilhavam mais que os reflexos do sol no riacho que passava ao lado.

— Que maravilha — disse ele. — Respire fundo para limpar seus pulmões com este ar puro, cheio de oxigênio. Inspirava barulhentamente enquanto abria e elevava os braços. Em seguida expirava quase assobiando, como se estivesse eliminando acúmulos indesejáveis.

Depois de alguns metros, apontou-me duas árvores:

— Está vendo estes eucaliptos? São da mesma espécie, mas diferem entre si. Um tem o tronco retilíneo e mais elevado; o outro tem uma suave inclinação para o lado. As copas também diferem em galhos e folhas: uma mais frondosa e ramificada e a outra quase redonda. Não existem duas árvores da mesma espécie que sejam iguais. Você pode plantar do mesmo lote de sementes, no mesmo dia, no mesmo local, centenas delas, regá-las da mesma forma e no final terá árvores diferentes. As árvores são como os seres humanos: irrepetíveis!

Eu que nunca tinha olhado as árvores sob esta perspectiva, depois daquele dia, nunca mais olhei as árvores sem esta perspectiva.

Vale aqui uma breve interrupção neste passeio, que ainda não chegou ao seu auge. Dias depois, passando pelas ruas da cidade, fui vendo pela janela do carro a uniformidade dos prédios construídos. Os envidraçados então parecem ser sempre o mesmo em locais diferentes. Será que beleza e diversidade andam juntas? Nunca gostei de Shopping e neste dia descobri que é porque são absolutamente idênticos: as mesmas lojas, com a mesma arrumação de vitrines, banheiros com o mesmo cheiro, corredores com o mesmo piso. Tudo igual. E ainda centralizam a venda de comida num local que têm a coragem de chamar de “praça” de alimentação. De praça não há nada; não existe praça sem graça.

Na sequência ele quis molhar as mãos no riacho e passar na nuca aquela água fresca. Fomos seguindo e ele parava para cheirar as plantas, aguçava o ouvido para reconhecer cantos de pássaros, catava folhas no chão apenas para tocá-las e observar seu desenho. Enfim, ali estava ele por inteiro, feliz como uma criança num espetáculo de circo, com seus sentidos saciados por aquela orquestra de cores, texturas, sons e aromas.

Após uns 30 minutos, já nos aproximando do trecho final, a trilha alargava-se um pouco e, alguns passos à frente, formava-se, aí sim, uma pequenina praça, cheia de graça. Ao centro reinava uma árvore alta, de tronco liso, com uns 60 cm de diâmetro. Ele parou! Olhou a árvore de cima a baixo algumas vezes. Depois, sem vacilar, abraçou-a apertando os braços e colando o rosto e o corpo. Ali ficou imóvel, de olhos fechados, num silêncio de catedral. Pareciam uma coisa só. Dois irrepetíveis...

Isso eu nunca tinha visto. Lembrava-me de alguma foto em que as pessoas davam as mãos e rodeavam uma grande árvore para deixar evidente o seu tamanho. Mas aquele abraço carinhoso, terno e emocionado nunca mais saiu da minha lembrança. Só depois de uns dois minutos ele soltou, lentamente, acariciando-a e afastando-se aos poucos, como quem quisesse ficar.

Abriu os olhos. Sua expressão era de quem acabou de fazer uma oração profunda e fervorosa. Quebrou o silêncio:

— A árvore é um ser vivo. Abraçando a gente sente a energia dela. E ela gosta...

Ele faleceu há poucos anos.

Desde então tenho vontade de voltar lá e, chegando à mesma árvore, abraçá-la amorosamente por dois minutos e dizer-lhe:

— Sabe quem te mandou este abraço? Meu pai!