O conceito protagonismo infantil é recente no Ocidente, no decorrer do período considerado historicamente como Idade Média, a própria ideia de infância, como é concebida atualmente inexistia, sendo que as crianças exercitavam o mundo como miniadultos. De acordo com Oliveira1, o conceito mais contemporâneo de infância vem se consolidando a partir do século XVII, quando os cuidados e a atenção às crianças começam a ser avaliados de maneira mais precisa.

Conta-nos Boto2 que, no Brasil, a situação começa a se transformar a partir da segunda metade do século XIX, no período da abolição da escravatura quando surgem pequenas inciativas de proteção à infância, com o olhar voltado para a alta taxa de mortalidade infantil. A princípio, os jardins de infância tinham o objetivo de ajudar as crianças mais pobres; em 1875, no Rio de Janeiro, e em 1877, em São Paulo, sob o cuidado de entidades privadas, surgiram os primeiros jardins de infância para as crianças de classe social mais alta.

Com o tempo, o desenvolvimento da indústria e a consequente urbanização ensejaram grandes mudanças, transformando as estruturas familiares: as mulheres vão trabalhar nas fábricas, deixando seus filhos com cuidadoras sem preparo, quaisquer cuidados ou higiene. A pesquisa de Oliveira3 veicula que em 1922, no Rio de Janeiro, ocorreu o Primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, tratando de assuntos como educação moral e higiênica, e foram se desenvolvendo as primeiras regulamentações do atendimento de crianças pequenas em escolas maternais e jardins-de-infância.

O movimento das escolas novas incorreu na Associação Brasileira de Educação, em 1924, e com a evidência do tema, divulgado pelas mídias, mais tarde, Lourenço Filho, um grande educador e pedagogista brasileiro conhecido, sobretudo, por sua participação no movimento dos pioneiros da Escola Nova, publicou a obra Introdução ao estudo da escola Nova (1931), compartilhando com outros educadores ideias renovadoras. A partir de então, surgiu o Movimento dos Pioneiros da educação Nova, em defesa da educação como função pública, da existência de uma escola única, da coeducação de meninos e meninas, e da necessidade de um ensino ativo, laico, gratuito e obrigatório, reitera Oliveira.4

Na continuidade de sua pesquisa, Oliveira5 informa que em 1923 foi fundada a Inspetoria de Higiene Infantil, com o intuito de amenizar a mortalidade infantil transformada, em 1934, em Diretoria de Proteção à Maternidade e à Infância. Ao mesmo tempo, o Governo Vargas reconheceu alguns direitos dos trabalhadores através da legislação, Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, de 1943, facilitando, assim, a amamentação durante a jornada de trabalho. No entanto, as creches da época acessíveis às crianças mais pobres eram espaços concebidos como um local de cuidados à saúde, e possuíam setores como lactário, além de contarem com auxiliares de enfermagem preocupados a higiene das crianças.

Em 1942, o Departamento Nacional da Criança, parte do Ministério da Educação e Saúde, desenvolveu a Casa da Criança. Algumas alterações foram realizadas, tirando um pouco o foco em um discurso médico, ampliando-se ao discurso social, para evitar a marginalidade e a criminalidade das crianças mais carentes. Posteriormente, o departamento Nacional da Criança, foi substituído, em 1970, pela coordenação de Proteção Materno-Infantil. A partir de então, algumas exigências foram estabelecidas: tanto para as creches como para os jardins de infância foi criado um material de apoio apropriado, mas, ainda assim, o formato assistencialista permanecia fortemente.

Este breve panorama demonstra uma gradativa ampliação do olhar para a infância, para suas famílias, e para as mulheres de classe média baixa. As escolas passaram a ver a infância de forma mais ampla, enquanto estudos científicos foram se desenvolvendo acerca da relação ensino-aprendizagem, e da própria ideia de infância.

As ideias de integração e de protagonismo infantil, muito mais recentes, como referido, são geradas, nessa esteira, pela necessidade de aproximar a escola de novas fontes de conhecimento; para que o educador tenha uma postura atenta, observadora e acolhedora, é necessário que haja estudo, troca de experiências e pesquisa.

O ponto chave está em como possibilitar às crianças, com a mínima intervenção do educador, liberdade de expressão para que possa se sentir provocada com novos desafios, indo além do que já conhece, penetrando em novos sentidos, reconhecendo-os e ampliando-os.

Nesse contexto, é importante, ainda, mencionar a importância do envolvimento de toda comunidade escolar – funcionários, crianças de outros grupos, famílias –, pois a construção coletiva fortalece e estimula a troca de ideias, inspirando ações. Edwards6 trata-se de valorizar o processo de aprendizagem no qual as crianças sentem, pensam e constroem, progredindo junto com outras pessoas.

Notas

1 Oliveira, Zilma Ramos de. Ed Infantil: Fundamentos e métodos. São Paulo, Ed. Cortez editora, 2007.
2 Boto, C. O. Desencantamento da criança: Entre a renascença e o século das luzes. São Paulo, Ed. Cortez, 2002.
3 Oliveira, Zilma Ramos de. Ed Infantil: Fundamentos e métodos. São Paulo, Ed. Cortez editora, 2007.
4 Oliveira, Zilma Ramos de. Ed Infantil: Fundamentos e métodos. São Paulo, Ed. Cortez editora, 2007.
5 Oliveira, Zilma Ramos de. Ed Infantil: Fundamentos e métodos. São Paulo, Ed. Cortez editora, 2007.
6 Edwards, C., Gandini L., Forman G., As cem linguagens da Criança. Porto Alegre, Ed. Artmed, 1999.