Nas artes visuais, o mundo lembra os 50 anos da morte do mais francês dos espanhóis, o pintor Pablo Picasso. O mundo lembra Guernica: onde a política marca encontro com a arte.
O mundo lembra a obra artística de Pablo Picasso “A mulher no espelho”, cuja técnica, através do cubismo, nos dá a nítida dimensão de um corpo fragmentado, da fragmentação pela ciência, que deixa de fora a subjetividade, mas também da fragmentação pulsional, do descompasso entre o que se vê e o que se é.

Picasso vai ao encontro da psicanálise na medida em que ambos nos falam de um antinaturalismo do corpo, de um eu que não equivale ao corpo biológico, do Um que não cabe na imagem refletida. Mas, ao mesmo tempo, é através desse Outro, enquanto lugar para onde o sujeito dirige a sua questão, que faz regressar sobre o eu a pergunta: “quem sou eu?”. O corpo, esse contorno necessário, ao menos pode nos dar uma dimensão de quem somos.

O mundo lembra Picasso, nos seus primeiros anos em Paris, quando trabalhava no ateliê da Bateau-Lavoir, foi um grande usuário de ópio, fumado em grandes cachimbos. Woody Allen celebra-o no seu grandioso e inesquecível filme: Meia-noite em Paris!
O mundo lembra Picasso enquanto diretor do Museu do Prado, lar de obras de grandes mestres como Goya e Velázquez e onde o jovem pintor encontrara inspirações no começo de sua jornada, nas suas primeiras visitas a Madrid.

Em 1905, o mundo lembra o feliz encontro de Picasso com Gertrude Stein, americana de Paris, escritora de fundamental originalidade, que lhe visitou o atelier, e encontrou Matisse em sua casa, no meio de uma insólita coleção de pinturas em que se via já representado — quando Matisse passava largamente a ser preferido por um irmão de Gertrude, colecionador também. Dicotomia, dicotomia da história… Foi nas salas desta americana rica e original, no 27 da Rua de Fleurus, a par do Jardim do Luxemburgo, que Hemingway, Ezra Pound, Scott Fitzgerald ou Man Ray frequentariam, que Picasso 19 «encontrará» uma nova expressão plástica, retratando a anfitriã, ao cabo de noventa sessões de pose, em novembro de 1905.

Ou depois, em agosto, subitamente, tendo apagado a cabeça pintada e repintando-a de cor, como uma máscara estilizada. Parecido o retrato? "Ela acabará por se parecer com ele", respondeu o pintor às críticas, conforme conta Gertrude Stein, na sua obra-prima, The Autobiography of Alice B. Toklas (1933). Porque, para a romancista, num texto famoso de criação sintáxica, «parecença» e «exatidão» é uma «exigência» outra: Porque isto é assim. Porque...

Obra de transição, o retrato de Gertrude Stein (Metropolitan Museum, Nova Iorque, por testamento da escritora, em 1946) anuncia a obra que, nos fins desse ano de 1906, Picasso começou a preparar, como porta de entrada para um novo mundo da pintura ocidental. "No seu grande esforço para pintar Gertrude Stein, Picasso passou dos arlequins, encantadora fantasia italiana do princípio da sua carreira, para esta forma de combate que será chamada cubismo" — escreveu ela própria, resumidamente.

“Eu não pinto as coisas como as vejo, mas como as penso”.

Em 1907, Picasso apresentou a alguns amigos mais próximos, e também artistas, como Braque, a pintura que consolida o cubismo: Les Demoiselles d’Avignon.
Com isso, chocou os colegas, que consideraram o trabalho “uma coisa louca e monstruosa” e ao mesmo tempo, “uma revolução”.

O encontro com o Cubismo é sinónimo de descobertas, uma fase na qual não se encontra o aporte teórico, mas sim experimentos fundamentais na arte... Por isso, se compara o resultado com “o reflexo em um espelho quebrado” ou com a visão através de um caleidoscópio.
O clímax do cubismo analítico aconteceu em 1911, quando Picasso e Braque completaram sua formatação, produzindo algumas de suas demonstrações extraordinariamente belas.