O cerne da superação do capitalismo nunca foi a luta de classes, mas a lógica da mercadoria. É aqui que reside toda a potência do capital. No nascedouro das diferentes estratégias conceituais no final dos anos 1950 e ao longo da década de 1960, um ponto em comum entre elas é a superação da obra de arte enquanto um objeto que se tornava, na época, cada vez mais uma mercadoria. Já era perceptível que a exposição de uma obra tendia a ser um meio de fazer da mesma um produto para a venda, com toda uma estrutura de marketing contextualizando e agregando não apenas valor simbólico, mas também monetário, ao produto – que, no caso, era a mercadoria Arte. Daí decorre o desejo de desmaterialização do objeto; da obra de arte como forma de comunicação direta com o mínimo de perda de informação durante esta troca. Do ponto de vista formal de produção e distribuição, tanto nos grandes centros artísticos produtores hegemônicos quanto na periferia do Terceiro Mundo, este é um ponto em comum. Mas pára aí.

Nas muitas Américas Latinas que compõem a América Latina, outras forças perpassam a nova forma de produzir arte, cada qual dentro de contextos específicos locais, mas também com intenções mais abrangentes. Se, por um lado, o contexto político, histórico e linguístico de cada região definia um território de luta e emancipação do seu passado colonial, o próprio colonialismo e a exploração do sistema capitalista transnacional que se impunham pressionavam na direção de uma experiência comum de resistência. Uma tendência ao coletivo versus o artista individual; uma busca incessante de inserção direta sem passar por meios institucionais ou mercadológicos pré-estabelecidos; e uma nova pedagogia em que a obra de arte fosse um meio de conscientização e um instrumento de emancipação e superação da opressão política de uma cultura patriarcal e autoritária, além dos meios de reprodução econômica – tudo isso perpassa a produção conceitual da época na região.

Colocado este contexto, não me escapa a ironia de agora propor em uma galeria de arte comercial a exposição da produção daquela época. Superar a lógica da mercadoria do capitalismo se prova mais uma vez, senão utópico, algo muito difícil. No entanto, com o liberalismo flertando cada vez mais com o autoritarismo desde a crise de 2008, é justamente nas estratégias de produção daquela época que podemos talvez buscar novas formas de resistência. Mas como fazer isso em uma galeria de arte?

“Estratégias Conceituais” não se propõe a fazer uma revisão histórica, muito menos definir genealogias claras e estáticas. Mesmo porque a galeria não é suficiente para dar conta de um material vasto, contraditório, e de fato experimental na sua essência. A exposição se propõe, no entanto, a pecar propositalmente pelo excesso. São mais de 40 artistas representados por mais de 80 obras. São diversas estratégias de produção e disseminação, por vezes de matizes ideológicos opostos. A exposição será o resultado do confronto com o contexto do espaço expositivo de uma galeria de arte comercial no início do século XXI. O excesso na apresentação contamina os objetos que hoje tendem a se transformar em mercadorias prontas para serem postas em circulação. É um experimento de inserção.

Lista de artistas: 3NÓS3, Adolfo Bernal, Anna Bella Geiger, Anna Maria Maiolino, Antonio Caro, Antonio Dias, Antonio Manuel, Artur Barrio, Augusto de Campos, Beatriz González, Bené Fonteles, Carlos Zilio, Cildo Meireles, Clemente Padín, Edgardo Antonio Vigo, Eugenio Dittborn, Graciela Carnevale, Guillermo Deisler, Hélio Oiticica, Hudinilson Jr., Ivens Machado, Jac Leirner, Jorge Caraballo, Julio Plaza, Lenora de Barros, León Ferrari, Letícia Parente, Liliana Porter, Lotty Rosenfeld, Luis Camnitzer, Luiz Alphonsus, Lygia Pape, Marcelo Brodsky, Mario Ishikawa, Montez Magno, Paulo Bruscky, Regina Silveira, Regina Vater, Roberto Jacoby, Umberto Costa Barros, Victor Gerhard, Victor Grippo, Waldemar Cordeiro e Waltercio Caldas.