No presente artigo, dedicar-nos-emos à abordagem sobre o contributo dos trabalhos de Zaida Chongo (doravante Chongo) para o activismo social em Moçambique, tendo como escopo as músicas “Sibo” e “Drenagem”, que fizeram e fazem muito sucesso, desde quando em vida Chongo a esta parte.

Chongo é conhecida pela sua forma ímpar de compor as suas músicas e, principalmente, pelo seu entrosamento na dança, com as bailarinas. Para além deste viés, é conhecida, igualmente, por compor as suas músicas maioritariamente em XiChangana, e por abordar questões sociais de Moçambique, levando os ouvintes ou admiradores de suas músicas à reflexão e/ou mudança de comportamento. Não deixa(va), igualmente, de criticar as práticas antiéticas e/ou anti deontológicas por parte da sociedade e do Estado moçambicano, respectivamente.

Ora, para Pereira (2006), o activismo é um conjunto de actividades e de comportamentos destinados à mudança das condições sociais, que não passa apenas pela participação e pela modificação das esferas políticas, mas actua nas esferas económicas, sociais e culturais de uma sociedade.

Em “Sibo”, Chongo institui-nos um sujeito poético que remata uma série de perguntas a Sibosise, seu parceiro, um homem que gosta de mulheres, mesmo tendo esposa em casa, pedindo-lhe que inscrevam o seu casamento no notário, pois que não acabaria as mulheres bonitas, formosas, com corpo bonito (ou avantajado?) no mundo. Tal como se pode depreender na primeira estrofe, quando diz:

Sibosise, se sviyoyini, wena?! (…) nga nibyela juro nkata, se sviyoyini, wena?! Ahi tsalisi a mutxato, hiku mina nitatxata nawena (…) – Sibosise, como é, então? (…) Diz-me, meu amor, come é, então? (…) Não vamos inscrever o nosso casamento? Porque eu (decerto) me casarei contigo.

(Chongo, s/d)

[Sibosise, como é, então? (…) Diz-me, meu amor, come é, então? (…) Não vamos inscrever o nosso casamento? Porque eu (decerto) me casarei contigo.]

O sujeito poético inicia o seu exórdio transmitindo a certeza e segurança de que se casará com Sibosise, apesar de tudo. Mas, para frisar os pesares, remata, logo a seguir:

A vavasati vakuxonga ungevaheti, wena (…) avavasati vamamecha ungevahete, wena, a vavasati vamaancas, ungevahete wena (…)

[Mulheres bonitas não as vais acabar (…) mulheres de mechas (formosas) não as vais acabar, mulheres “ancudas” não as vais acabar (…)]

subvertendo, assim, a ideia de que Sibosise é aquele tipo de homem com esposa, porém que vive se envolvendo e procurando por mulheres formosas, bonitas, ancudas e muito mais lá fora. Na continuidade, assevera:

Naminawu nilava kutxata, nitafana nivan'wani vavasati (…) ahitsalisi a mutxatu, hiku mina nitatxata nawena (…)

(Chongo, s/d)

[Eu também me quero casar, para ser como outras mulheres (as casadas); vamos, portanto, inscrever o nosso casamento, porque (decerto) me casarei contigo]

Secunda-se, aqui, a convicção do sujeito poético em casar-se com este homem (apesar do seu comportamento), para que passe a cuidar de si e a valorizá-la como esposa.

Aliás, para frisar a perda de tempo de Sibosise, o sujeito poético, em segunda dose, remata:

A vavasati vakuxonga ungevaheti, wena, a vavasati vamamecha ungevaheti, wena, a vavasati vamabundas ungevaheti, wena (…)

(Chongo, s/d)

[Mulheres bonitas não as vais acabar, mulheres com mechas (hodiernamente, com tissagens, perucas, extensões e/ou “touch my bumbs”) não as vais acabar, mulheres ancudas, não as vais acabar]

Portanto, pode-se afirmar, com esta intervenção musical, que Chongo, ao retractar, em seu “Sibo”, a história de uma mulher que clama por cessação de brincadeiras por parte do seu marido e casar-se consigo, dedicar-se mais a si, estamos perante uma intervenção social, para que haja mais responsabilidade e/ou valorização da mulher, das esposas, por parte dos homens.

Já em “Drenagem”, para mostrar que a sua causa é para com a sociedade em geral, não apenas para com os homens, Chongo ataca as mulheres, instituindo-nos um sujeito poético que repudia a prática do aborto, instando-as a abandonarem aquela prática social que estava, quiçá, em construção ou recrudescimento.

Para Goffman (1980), existem dois conceitos fundamentais: por um lado, a identidade social, que é constituída com base nas categorias sociais da colectividade a que o indivíduo pertence e, por outro lado, a identidade pessoal, que se relaciona com as características pessoais dos indivíduos que são mais ou menos constantes.

Tal como o título atesta, “Drenagem”, seleccionado(a) como o lugar em que, por normalmente servir de via de escoamento de águas residuais e não só, as mulheres dela se servem para descartar os seus fetos e, pela corrente das águas residuais, não se saber em que zona poderiam ter sido descartados, tal como se pode depreender logo no princípio: “(…) himani anga teka svivanana ayasvipeta drenagem? (…) [Quem levou as crianças e as colocou na drenagem (quem fez o aborto)?]” (Chongo, s/d).

Na continuidade, remata: “Angana tingana lweyi wamamani (…) atiya aya kuma a nyimba aya yipeta drenagem (…) [Não tem vergonha, essa mãe? Levar um feto e colocá-lo numa drenagem (ou fazer aborto)?]” (Chongo, s/d).

Ora, estamos perante um claro desencorajamento e repúdio veemente ao aborto, à interrupção de gravidezes, movida por uma identidade pessoal que se relaciona com as características pessoais dos indivíduos que são mais ou menos constantes (das mulheres que praticam o aborto), pelo que os secunda com a seguinte interrogativa:

Ayikumeli yini yó nyimba? Nha asvitiva swaku ata kuma nyimba leyo ayayipeta drenagem? A pfumeleli yini yó nyimba, nha asvitiva swaku atasusa nwana lweyo aya mupeta drenagem? (…)

[Por que ela engravidou sabendo que iria abortar? Por que ela aceitou a gravidez, sabendo que a iria abortar?]

Como assevera Dubar (2006), a socialização é um processo de (des) construção e (re) construção de identidades ligadas a diversas esferas de actividade, principalmente profissional, que cada um encontra durante a sua vida e das quais deve aprender a se tornar actor.

Ademais, a socialização encontra-se subjacente nas formas identitárias acima referidas, ou seja, o indivíduo identifica-se com o grupo social do qual faz parte, no caso, a comunidade, ou se define pela posição social que ocupa numa organização profissional (no caso, arte – música).

À guisa de conclusão

Portanto, estes trabalhos são, para nós, dois exemplos claros de que Chongo, coadjuvada pelas temáticas, dança e a língua sobejamente falada na zona sul de Moçambique (XiChangana), é não só uma Diva da Marrabenta, mas, também, uma exímia activista social, numa era em que muito se discute sobre o activismo social e/ou ser ou não “influencer” em Moçambique.

Bibliografia

Dubar, (2006). A crise das identidades: a interpretação de uma mutação. Porto: Afrontamento Edições, sm/ed. Goffman, (1980). Estigma: notas sobre manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar Editores, sm/ed. Pereira, (2006). Activismo Social. Lisboa: ISCTE.