Era uma vez um lugar no norte de Marrocos conhecido pela «long right» e pela «happy bay», ou seja, pela mais comprida onda “direita” do continente africano, possível de surfar. Nesse lugar, distrito de Agadir, em Marrocos, milhares de pessoas por ano fazem surf, apanham sol e vivem um ambiente absolutamente indiscritível.

Em 1960, Agadir sofreu uma catástrofe natural, um sismo enorme que destruiu o pequeno centro da cidade. Desde essa altura, todos os edifícios foram reconstruídos, passando a ser um destino de férias e de enormes residências e edifícios de hotelaria como o Club Med, procurados principalmente por franceses e espanhóis, durante a década de noventa. No entanto, nunca ninguém imaginaria a evolução de Agadir nestes últimos anos. O turismo mudou, o surgimento dos hostels, o aumento dos viajantes em caravanas, e principalmente o crescimento da prática de surf na região, fizeram com que a paisagem se alterasse por completo. Mais recentemente, a possibilidade de trabalhar à distância, e até os chamados «nómadas digitais» passaram a procurar lugares como o norte de Marrocos, onde o ambiente é totalmente diferente das grandes cidades.

Quando conversei com turistas que frequentam Agadir desde os anos oitenta e noventa, todos mostram-se incrédulos com a quantidade de novos «surf camps» e de casas e edifícios pré-fabricados no geral, muitos deles sem qualquer legislação. A cidade está sem dúvida a crescer imensamente, sem que isso contribua necessariamente para a população local.

Tendo tido a sorte de visitar o norte de Marrocos este ano, pude reconhecer que felizmente várias destas vilas de surfistas perto de Agadir, como Tamgraht ou Tagahzut, têm de facto uma paz indiscritível. De alguma forma que é muito difícil de explicar, o respeito pelo silêncio, pelo deserto tão perto e por alguns dos costumes locais é mantido. Por outro lado, surge um novo ambiente que o surf traz, de descontração, de vida mais calma e de uma energia boa que vem do mar, da natureza.

Durante os dias que passei em Tamgraht, tive o privilégio de surfar com pessoas de Agadir, que conhecem os lugares e as condições adequadas. Tive ainda a sorte de passar dez dias numa rotina absolutamente calma e saudável, de acordar cedo e passar o dia no mar, de ver o pôr-do-sol todos os dias e de ter jantares com uma gastronomia absolutamente maravilhosa, rodeada de óptimas pessoas e energia pura.

No dia um de janeiro de dois mil e vinte e três, eram oito e meia da manhã e já estávamos no mar. A alegria que senti nesse dia é difícil de descrever. As palavras serão sempre muito pequeninas para descrever a paz, o ar e o silêncio que encontrei num desses lugares de surf, em Tiznit. Numa praia deserta, a quase duas horas de Agadir, vive uma energia que é muito difícil de se explicar.

De costas para as dunas, agradeci a vida e tudo aquilo em que acredito: o respeito absoluto de saber olhar em silêncio, e o equilíbrio frágil entre seres humanos e natureza. Em toda a viagem, apenas foi possível neste preciso lugar. Todo o resto foi sobre a sorte imensa que é a amizade plena, e que tantas vezes não precisa sequer de uma única palavra. Saber procurar a beleza, a alegria e a coragem, mesmo quando não é fácil.

No cimo de uma rocha, depois do sol ter desaparecido, os olhos encheram-se de lágrimas e de abraços que nem sempre conseguimos dar: «Olha ali, somos só isto: pontinhos escuros ao fundo, a remar em direção ao horizonte.»

Em Berbere, a forma como poderia agradecer a Agadir seria algo assim: Leihamardic Albahar Sahrrebi.