A arquitetura não é apreendida como experiência intelectual, mas como sensação - como emoção. As construções deverão tornar-se presença - são como enormes monstros apocalípticos ou suaves e pairantes albatrozes.

A arquitectura será inventada para que seja lembrada eternamente, como os templos da Índia ou as pirâmides do Egito.

A arquitetura ficcional compreende a imaginação dos artistas e a realização visual de estruturas, moradias ou ambientes urbanos não construídos.

Sabemos que a arquitetura não é feita de técnicas, materiais, contabilidades, estatísticas, mas de sonhos, razões secretas e obsessões sombrias.

A arquitetura que incorpora narrativas de ficção pode ser alcançada, além das restrições de função, propósito e contexto. Dentro de um quadro narrativo fictício, as ideias podem ser desenvolvidas e expressas livremente, como ocorre na forma do romance na literatura.

«Procuro aquela qualidade, há muito perdida entre arquitetos, que resulta numa Arquitetura espontânea de intensidade mágica.

»Anseio nos edifícios pela profunda e miteriosa sombra, pelo equivalente à magia de uma pintura Chirico. Tirei o telhado onde estava mais escuro e abri-o ao sol.

»Pedi à natureza que invada a arquitetura exuberantemente como se já fosse uma ruína. Aproveitei os motivos universais dos primitivos para decorar superfícies e pintei paredes em rosas e vermelhos cujos reflexos enaltexem as carnes e algumas vezes alcatroei uma parede a preto para a dignificar e silenciar.

»Concebi edifícios que aparentam ter sido executados e ampliados durante tempos, volumes que se opõem a outros com a suave e casual angularidade de velhas cidades.

»Por vezes quiz fazer blocos massivos como fortalezas e outras vezes volumes leves e transparentes; Chaminés cortando os céus como obeliscos; luzes coloridas através de telhados envidraçados ou filtradas através de velas pulsando nas brisas como se estivessem vivas».

(Pancho Guedes em «Manifestos, Ensaios, Falas, Publicações»)

O homem que ousou fundir arquitetura com outras artes.

Ele queria que os seus edifícios fossem "estranhos e teatrais", mas "fáceis de ler". Porque "a arquitetura não precisa de ser chata, triste e cinzenta". E a dele, nunca foi.

Pancho não vê a arquitetura como uma profissão, mas como um tipo de ambiente artístico total no qual ele mergulha inteiramente, atraindo colegas, empresas e clientes com ele.

O trabalho de Pancho Guede é, em muitos aspectos, um lembrete da possibilidade de um fluxo de criatividade não adulterado que pode existir fora do mundo de intenso escrutínio e patrocínio de reputação que pode bloquear certos talentos.

Os projetos não são apenas edifícios, ou grupos de edifícios, são fábulas feitas de linhas, materiais de construção, de palavras: cada edifício deve descobrir a sua própria ideia.

Muitos vêem o seu trabalho como excêntrico e idiossincrático. É a redescoberta de atitudes e valores arquitetónicos que a história muitas vezes insiste em esquecer ou destruir.

Influenciado por mestres como Corbusier, Gaudí ou Wright, Pancho olha para cada um deles, pelos aspectos orgânicos que se opõem às tendências mais racionalistas do Movimento Moderno. Por essas conexões, o apetite voraz e aberto pela informação e a vocação artística criaram a predisposição para uma criatividade atípica.

Dentro do universo arquitetónico, Pancho Guedes é, por excelência e circunstância, um verdadeiro modernista alternativo.

Na sua descoberta da diversidade cultural africana, Pancho congratula-se com a dimensão simbólica e ritual da cultura material, abraça o animismo das superfícies e das formas, e dá-se a liberdade de experimentar o que quiser.

Pancho atravessa o racionalismo e o rigor estrutural da cultura ocidental com a dimensão mágica e orgânica da simbologia africana. No início da era moderna, o ornamento foi condenado como um crime, mais tarde retornou como uma dimensão simbólica praticamente perdida da arquitetura ocidental. Esta dimensão simbólica é simplesmente para fornecer referências para uma criação de identidade, para uma apropriação pelos destinatários, que, no entanto, se dissipou na especialização a que as linguas arquitetónicas foram conduzidas.

Na sua hibridização de culturas, Pancho Guedes sugere, ainda, um outro retorno importante: o retorno do Outro. Imerso na cultura do verdadeiro Outro da cultura ocidental – aquele sob cuja repressão se dá grande parte do crescimento da modernidade europeia – Pancho Guedes é dos primeiros a abrir-se à cultura africana e a deixar que ela coloque em questão as certezas da cultura eurocêntrica. Como um antropólogo que não resiste a amar o objecto da sua atenção, Pancho torna-se permeável aos aspectos mágicos e aos feitiços da cultura africana e, com isto, rompe a própria aura racional e estruturalista da sua cultura de origem. O Outro é aqui o espelho deformante perante o qual se estilhaça a imagem pristina que a cultura ocidental faz de si própria.

O trabalho de Pancho é o de um homem solitário que trabalhou praticamente num ambiente próprio, mas que conseguiu criar ao seu redor um ambiente quase místico. O seu trabalho nem sempre pode ser completamente concluído, mas a busca de formas e texturas é sempre muito pessoal e a sua originalidade é incontestável.

Podemos ver no seu trabalho uma mudança da compreensão limitada da arquitetura para o design de estruturas discretas, a uma noção ampliada de que arquitetura e urbanismo podem incorporar uma forma de cultura crítica ou ainda um canal mais decisivo no domínio da ação política e social.

Pancho progrediu por meio da afirmação de uma "maneira", uma versão totalmente pessoal num momento em que outro buscava o consenso, a uniformidade do estilo moderno. Ele desejava abertamente ser um artista, enquanto que os arquitetos do continente queriam ser "técnicos" e cumprir um programa disciplinar. Ele não estava interessado na arquitetura como um remédio, mas como evasão: "tu também, se sonhares o suficiente - também podes fazer a metade do teu sonho tornar-se realidade". Possuía uma linguagem arquitetónica em progresso: visual, crítica, irónica e cáustica.