Como se configurariam os restos do reino vegetal se ele fosse extinto? Essa premissa ficcional dá o tom de Anima, individual de Marcelo Zocchio na Galeria Bolsa de Arte. Com abertura no dia 7 de outubro, das 11h às 16h, a exposição traz cerca de dez obras, entre inéditas e produzidas pelo artista nos últimos cinco anos em técnicas diversas (escultura, instalação, fotografia), tendo como matéria-prima a fotografia, a madeira bruta e peças reaproveitadas. Essas também dão corpo à instalação Somente o Necessário, que Zocchio apresenta paralelamente no MAC USP (até 26 de novembro).

O universo conceitual de Marcelo Zocchio contém sempre um dado de inquietação quanto aos excessos da ação humana sobre o mundo, compreendida em sua conformação mais cotidiana. As marcas materiais da existência humana sobre o planeta estão no foco do artista paulistano, sejam elas as falhas da urbanização e as construções inúteis realizadas pelas diferentes gestões políticas ou os rastros deixados pela passagem do tempo (como a obsolescência de aparelhos eletrônicos e a má conservação de prédios e ambientes públicos).

Em Anima, uma distopia natural serve como base para o jogo de intervenções sobre madeira, vinda em estado bruto ou reaproveitada. Parte-se do pressuposto ficcional de que, se a vegetação do planeta cessasse de existir, seus restos seriam reconfigurados pela ação do tempo ou por uma força interna remanescente. Mas pela manipulação de Zocchio, estabelece-se um jogo paradoxal entre intervenção natural e humana.

Dessa maneira, galhos comuns de pitangueira perdem sua aparência orgânica na reconfiguração de contornos construtivos em Transformer Stenocalyx (2012). Esse jogo formal externo internaliza-se em Transformer Cedrela (2012). Aqui, troncos de cedro e outras árvores são escavados e ganham enxertos geométricos: pequenos cubos de madeira reaproveitada de diversos tipos, encaixados nos ocos de suas extremidades. Numa instalação no teto da galeria, inverte-se a relação entre ação natural e artificial. Diversas vigas de madeira, encontradas em caçambas de construção ou nas calçadas da cidade, ganham em suas extremidades perpendiculares ao chão a imagem impressa de uma árvore (como em fotos da série Biometria, 2015, que também figuram na mostra). Marcelo Zocchio menciona a forma orgânica original naquilo que no presente tornou-se artificial, moldado utilitariamente para servir à empresa humana.

Utilizando o mesmo jogo de remissão ao natural, trabalhos da série Réplica exibem fotos de árvores ladeadas por esculturas inspiradas em suas formas, confeccionadas em madeira processada de construção. Seja no orgânico manipulado ou no artifício que tem sua origem exposta, em Anima Marcelo Zocchio faz refletir sobre a velocidade e a inconsequência da intervenção humana sobre a natureza no espelhamento dos diferentes estados da matéria orgânica no tempo.