Viajar é concretizar e consolidar o conhecimento. Viajar é ter diante dos olhos o que antes só estava no imaginário criado por experiências intermediadas por aulas na escola, livros, relatos de viajantes, timelines, filmes, reportagens escritas, gravadas e pela navegação em sites de busca que tentam recriar o lugar através de imagens, como se naquele lugar estivéssemos. Porém, a meu ver, nada pode substituir o que se experiencia ao vivo in loco. Já tinha sentido isso, mas agora estou convicta de que estar em um lugar é fundamental para se conhecer em uma maior totalidade, pois nunca se pode conhecer o todo.

A vida é um “recorte” que vamos fazendo ao longo de nossa caminhada. Recorte inevitável e inexorável, pois estamos sempre dentro de um contexto sócio-cultural-geográfico que vai moldando o que somos e o que pensamos. Viajar é sair de tal contexto e explorar o que não é costumeiramente nossa zona de conforto, muito embora o turismo praticado por nós seja de acordo com os nossos gostos, que, por sua vez, são parte do nosso recorte. Enfim, mesmo sendo algo que já estamos mais ou menos acostumados, viajar sempre nos transforma.

Quando me chegou a notícia de um evento acadêmico em Manaus, grande foi a minha alegria por vários motivos. Um deles era poder conhecer o estado do Amazonas, lugar que sempre ocupou a minha curiosidade pelas lendas indígenas e pela exuberância de fauna e flora. Outro motivo era ver um movimento de descentralização dos eventos do eixo Rio- São Paulo, o que incentivo e acho importante catalizador para impulsionar os estudos clássicos no âmbito nacional.

Mas voltemos ao Safari Amazônico. Soou muito estranho aos meus ouvidos esse termo em um primeiro momento, pois para nós a palavra safari tem o sentido de caça ou passeio de contemplação dos animais no continente africano. Era dissonante, mas diante da comercialização do turismo, o nome era chamativo e, etimologicamente, pertinente, já que o vocábulo originário do árabe tem o sentido de viajar. Não me apetece fazer pacotes turísticos, mas dessa vez, pelas possibilidades e pelo tempo, me rendi, já ajustando o meu filtro para descartar o que é ‘para turista ver’.

A descrição do safari, sucinta e cheia de adjetivos fisga-turistas, realmente não daria conta do que eu estava por viver. Quando no mapa vemos o Rio Negro e o Rio Solimões rasgando a terra do Amazonas de fora a fora e se encontrando, não se sabe o que realmente os dois são. Muito me surpreendeu não poder enxergar a largura dos dois rios, o pretume do Rio Negro, que infelizmente comparamos a uma bebida americana, e o tamanho da Ponte Rio Negro.

A imensidão do Rio Negro, por onde navegamos desde o porto de Manaus, não está no mapa e muito menos a sensação de atravessar a mata já quase na altura da copa verdíssima das árvores de igapó. E as ilhotas de vegetação hidrófila? Essas não são cartografadas! Mergulhar no Rio Negro e não enxergar nada e apenas sentir os botos passando e enxerga-los apenas quando saem d’água são sensações indescritíveis que palavras não descrevem. Por fim, o encontro das águas do Rio Negro e do Rio Solimões longe de suas margens e longe de tudo. Tais cores também o mapa não traz. Quer dizer, não trazia, pois agora o meu mapa do Brasil se materializou ainda mais, já que agora tenho vivo em mim, apesar da escala micro, o que de fato é a Amazônia. Tenho, portanto, um mapa concreto com cores, cheiros, sabores, sons e sensações. E assim vou colorindo as memórias da minha terra e me sentindo cada vez mais brasileira.

Minha terra tem rios onde os botos vêm nadar!
Os peixes que aqui comemos têm mais sabor do que os de lá!