Ando farto do futebol moderno. Não é apenas a quantidade absurda de dinheiro que circula nas transferências, nem as somas astronómicas que enchem os bolsos de jogadores, agentes e clubes. O que me cansa verdadeiramente é a perda da alma do jogo, que antes parecia nascer da pureza e da relação direta entre jogadores e adeptos.

Sinto que o futebol que tanto me apaixonou, com as suas histórias épicas, rivalidades históricas e figuras míticas, já não existe da mesma forma. A mudança no mercado, especialmente com a entrada de investidores árabes e a crescente globalização do desporto, aceleraram uma transformação que, ao meu ver, está a matar a verdadeira essência do futebol. O espetáculo deixou de ser o coração de tudo, e o que mais me incomoda é que, ao longo do tempo, perdemos muito mais do que alguns contratos milionários.

O que me faz falta, e muito, é a parte romântica do futebol, como também da criatividade dos jogadores. Aquele momento em que um jogador, que cresceu num clube, tornava-se o emblema vivo da sua história. Falamos de figuras que, com os seus feitos e conquistas, estavam lá, ano após ano, representando mais do que uma camisola, mais do que um contrato. Eram referências, verdadeiros heróis dos balneários, capazes de inspirar os companheiros de equipa e criar uma ligação profunda com os adeptos, ou aquele jogador que sabemos que pode mudar o rumo do jogo “sozinho”.

Hoje, as grandes figuras desapareceram. Já não vemos jogadores que se identifiquem com os valores de um clube, que o defendam com a alma e o coração. A lealdade ao clube, aquela que se constrói com o tempo, parece ter sido substituída pela busca incessante de novos desafios, e muitas vezes, de maiores salários. O futebol, em muitos casos, tornou-se um negócio em que a única constante é a mudança de jogadores e clubes, e a paixão que antes alimentava as bancadas foi sendo relegada para segundo plano.

O futebol de antigamente tinha uma magia única. E digo antigamente não por estar a fazer uma comparação nostálgica, mas sim porque havia uma genuinidade no jogo que já não se vê. Era mais humano, mais visceral. Cada jogador tinha uma história, uma identidade que transcendia os 90 minutos em campo. A figura do líder dentro de campo, o capitão que não só dava tudo pela sua equipa, mas que se tornava o reflexo do clube, tinha um peso significativo.

Esses jogadores não estavam apenas preocupados com a próxima transferência ou com o valor da sua imagem no mercado. Eles estavam preocupados com o legado que deixavam, com o vínculo com os adeptos e com a história que ajudavam a escrever. A rivalidade entre clubes, por exemplo, não se limitava a números e estatísticas. Era algo orgânico, alimentado pela paixão genuína de ver o seu clube lutar pela vitória. Hoje, as coisas parecem diferentes. Em muitos casos, já não existe espaço para essa conexão verdadeira. O jogo tornou-se uma mercadoria, e a lógica dos contratos e das comissões dos empresários transformou o futebol num cenário em que a emoção já não tem tanto valor quanto a conta bancária.

Não é que o futebol de hoje seja desprovido de méritos – muito pelo contrário. O aumento da visibilidade, as novas gerações de talentos e a profissionalização do desporto trouxeram muitas coisas boas. Mas o que me inquieta é a forma como a evolução fez com que o futebol se distanciasse daquilo que o tornava especial. Hoje, a paixão parece ser um acessório e não o combustível que movia o jogo.

Eu sinto falta das tardes de domingo, daquela sensação de que um jogo de futebol era muito mais do que uma competição. Era uma espécie de cerimónia, algo que unia amigos, famílias, bairros, que fazia o coração bater mais forte. O futebol era vivido de uma forma visceral, e cada golo, cada vitória ou derrota, era uma questão de honra, não apenas de lucro. Hoje, o que vemos são contratos bilionários que diluem a emoção, o valor das transferências que transformam os jogadores em produtos e a cada mudança de clube uma nova marca a explorar, a prioridade das emissões televisivas, o conteúdo nas redes sociais. Os clubes, em muitos casos, parecem mais empresas do que representações de uma cultura ou uma comunidade.

Eu sei que a nova geração tenta adaptar-se ao futebol moderno, mas eu, pessoalmente, continuo a pensar: o que realmente se perdeu ao longo dos anos? O que aconteceu ao futebol mais humano, mais emotivo, aquele que se vivia com paixão? O futebol não precisa ser desprovido de modernidade, mas sim de uma essência que sempre o tornou especial.

Há algo profundamente triste na ideia de que, ao longo do tempo, as coisas que nos faziam verdadeiramente apaixonar-nos pelo jogo, aquelas que tocavam no nosso interior, se foram perdendo. Não falo só da nostalgia do "antigamente", falo da saudade do que o futebol era, da sua capacidade de emocionar, de conectar pessoas de diferentes partes do mundo, não pela sua rentabilidade, mas pela sua verdadeira magia.

E isso, no fundo, é o que me falta: aquele futebol genuíno, aquele que nos fazia chorar, sorrir e vibrar com cada movimento em campo, como se as nossas vidas estivessem, de algum modo, ligadas ao jogo. O futebol de hoje é imenso, global, mas sinto que a sua alma, aquela que dava sentido ao espetáculo, foi-se desvanecendo. E, sinceramente, essa é a maior perda de todas.

PS: Será que os novos de hoje, vão dizer o mesmo daqui a 20 anos?