Em 2024, a Victoria’s Secret deu um passo ousado para tentar retomar seu lugar de destaque na moda, relançando seu icônico desfi le de lingerie, suspenso desde 2018. Essa pausa foi o reflexo de críticas intensas à marca, acusada de perpetuar um padrão de beleza excludente e ultrapassado, enquanto o mercado e o público exigiam diversidade, inclusão e autenticidade. O retorno foi cercado de expectativas e polêmicas, mas também trouxe à tona perguntas sobre o quanto a empresa realmente evoluiu.

Por décadas, a Victoria’s Secret foi uma potência no mundo da moda íntima. Seus desfiles anuais eram um espetáculo aguardado globalmente, reunindo as maiores modelos do mundo e performances de artistas renomados. Entretanto, o sucesso estava enraizado em uma visão limitada de beleza: magreza, eurocentrismo e um apelo sexual que começou a destoar dos valores contemporâneos.

O desgaste da marca começou a se manifestar de maneira mais evidente no final da década de 2010. Em 2018, uma entrevista com Ed Razek, então chefe de marketing, acendeu uma polêmica. Ao descartar a inclusão de modelos trans e plus size no casting, Razek afirmou que o desfile era uma "fantasia", não um espaço para diversidade. A repercussão foi instantânea e severa, levando a uma onda de críticas e boicotes que aceleraram o declínio da relevância da Victoria’s Secret.

Enquanto isso, marcas como Savage X Fenty, liderada por Rihanna, redefiniram o mercado de lingerie ao adotar uma abordagem inclusiva e empoderadora. Seus desfiles celebravam a diversidade de corpos, etnias e gêneros, conectando-se diretamente com um público ávido por representatividade. A comparação com a Victoria’s Secret tornou-se inevitável e implacável, colocando a marca icônica em uma posição desconfortável de obsolescência.

O anúncio do retorno do desfile da Victoria’s Secret em 2024 gerou curiosidade e cautela. A marca prometeu renovação, buscando abraçar a diversidade e se reconectar com o público que perdeu ao longo dos anos. No entanto, o resultado final foi recebido com opiniões divididas.

A inclusão de modelos como Paloma Elsesser, conhecida por representar corpos fora do padrão tradicional, e Valentina Sampaio, a primeira modelo trans a desfilar pela marca, foi um avanço importante. Porém, críticos apontaram que essas escolhas pareciam mais um esforço de relações públicas do que uma transformação genuína. A maior parte do casting ainda era composta por modelos que seguiam os antigos padrões da marca, criando a sensação de que a mudança foi apenas superficial.

O evento em si, com referências aos anos 2000 e uma produção mais simplificada, trouxe um tom nostálgico, mas deixou a desejar em termos de inovação. A nostalgia, embora atraente para alguns fãs antigos, foi vista por outros como um sinal de que a Victoria’s Secret ainda está presa ao passado, incapaz de apresentar algo verdadeiramente novo e relevante para a cultura contemporânea.

Para que a Victoria’s Secret se reinvente de forma autêntica, mudanças profundas são necessárias. Primeiramente, a marca precisa expandir sua visão de beleza, celebrando corpos reais, em todas as suas formas, idades e histórias. Isso deve ir além de escolhas pontuais de casting, permeando todas as suas campanhas, coleções e estratégias de marketing.

Além disso, a comunicação da marca precisa ser transparente e coerente. Movimentos simbólicos, como incluir modelos trans e plus size, não serão sufi cientes se não forem acompanhados de ações que demonstrem um compromisso genuíno com a inclusão. O público atual é exigente e sabe diferenciar entre gestos de marketing e mudanças reais.

Outro ponto crucial é a sustentabilidade. Em um mercado onde consumidores estão cada vez mais atentos ao impacto ambiental das marcas, a Victoria’s Secret precisa adotar práticas responsáveis, desde a escolha de materiais até a produção e o descarte de produtos. Isso não é apenas uma questão ética, mas também uma exigência estratégica para se manter relevante.

O retorno da Victoria’s Secret é um reflexo do poder da nostalgia e da luta das marcas tradicionais para se adaptarem a um mundo em rápida transformação. Ele representa um marco para a indústria da moda, destacando os desafios enfrentados por empresas que precisam equilibrar sua herança com as demandas contemporâneas por inclusão e responsabilidade.

Por outro lado, também expõe os riscos de uma abordagem que não evolui de maneira profunda. Apenas prometer mudanças não basta; é essencial concretizá-las de forma significativa. O desfile de 2024 mostrou que a Victoria’s Secret ainda está tentando encontrar seu caminho, mas precisa agir com mais ousadia e autenticidade para reconquistar a confiança do público.

O ano de 2025 será um teste definitivo para a Victoria’s Secret. A marca precisará demonstrar que as mudanças prometidas são reais e contínuas. Isso inclui ampliar a diversidade em seus castings, tornar seus produtos mais acessíveis a diferentes corpos e criar campanhas que realmente celebrem todas as mulheres.

Além disso, espera-se que a marca invista em inovação, tanto no design quanto na comunicação. O público atual valoriza histórias genuínas, e a Victoria’s Secret tem a oportunidade de reescrever sua narrativa. Ao abraçar de forma autêntica a diversidade e a sustentabilidade, a empresa pode não apenas recuperar sua relevância, mas também se tornar um exemplo de transformação na moda.

No entanto, a concorrência continuará pressionando. Marcas como Savage X Fenty seguirão liderando o mercado com sua abordagem inclusiva e criativa, elevando continuamente os padrões de representatividade e inovação. Para a Victoria’s Secret, o desafio será não apenas alcançar essas marcas, mas encontrar uma maneira de se destacar em um mercado cada vez mais saturado.

O retorno da Victoria’s Secret é um lembrete poderoso de como as marcas icônicas podem se tornar reféns de suas próprias histórias. Ele destaca a importância de ouvir o consumidor, acompanhar as mudanças culturais e agir com autenticidade. Embora o desfile de 2024 tenha sido um passo na direção certa, ele também revelou que ainda há um longo caminho a percorrer.

Se a Victoria’s Secret conseguir superar seus desafios e abraçar a diversidade de forma genuína, terá a chance de recuperar sua relevância e inspirar uma nova geração. Caso contrário, corre o risco de se tornar um símbolo de tempos passados, incapaz de evoluir para os novos padrões do mundo da moda.

Esse momento de transição não é apenas crucial para a marca, mas também para a indústria como um todo, que observa atentamente como a Victoria’s Secret lida com suas falhas e oportunidades. Em um mercado onde autenticidade, representatividade e responsabilidade são as novas regras, o futuro da Victoria’s Secret dependerá de sua capacidade de se reinventar de verdade.