Recordo claramente, quando nos anos 1970 lá no Santo Antônio daquela ilha ao sul, as elites optavam por ter casas de praia e veraneio, nas praias distantes dentro da mesma ilha mas não, nenhuma em Santo Antônio de Lisboa, a original. Sequer sabiam que o nome das cidades portuguesas também são longos, precedidos pelo nome de seus padroeiros: São João do Porto, São Sebastião do Rio de Janeiro e, a tal ilha que era a Nossa Senhora do Desterro.

Os adultos, falavam com um sotaque original português que parecia-nos aos miúdos, alguma fala interiorana do continente. Ou, inclusive no interior da ilha, era um sotaque ligeirinho Açoriano, já hoje visto como o d'algum Mané. Era algo diferente dos noticiários e novelas, dos programas das TVs ou, dos sotaques reconhecidos nos discursos populares. E, dos sotaques que se tinha acesso, como os futebolísticos também.

Iam-se os anos 1970 do século passado... mas vieram os 1980, quando então repetiram do lado oeste Atlântico, um retorno à democracia republicana que, uma revolução dos cravos já a tinha executada no outro lado Oriental deste oceano. As coisas foram mudando repentinamente e, já nos anos 1990, a ilha Ocidental do Sul com sua freguesia de praia de mesmo nome - a secular antiga capital imperial - deu um salto econômico-turístico, que os locais desacreditaram e não reconheciam.

Por vezes, afirmavam que aquele paraíso, não daria em nada. Era um momento de empolgação, temporário. De Curitiba, já se percebia a trajetória e o futuro promissor daquele litoral abençoado do meio, que os dois Estados vizinhos não dispunham nem parecido sequer. Era inclusive o maior receptor de turistas estrangeiros no Brasil, porque recebia muitos dos vizinhos hispânicos do Mercosul.

Juntamente com as colonizações italiana e alemã, estava aí preparada a receita dos outrora administradores portugueses, para aurora. Os da Europa curiosamente, já em 2016, ainda continuavam a acreditar que a portuguesa Santo Antônio de Lisboa, a Oriental, jamais seria algo além! Conformados com a apatia política, econômica e empresarial, padeciam da mesma desconfiança genética cultural, naquela única capital praieira, soalheira, a original e em que os fundadores ainda estavam como foi uma vez a outra, de costas para o mar.

Desaforadas com as águas, depois de tanto orgulho e futuro que o oceano lhes deu. Um trauma, frustração ou arrependimento desconexo da realidade, mas temporário, inclusive porque como fronteira marítima que sempre aberta a qualquer invasor, turístico ou refugiado, resultam reveses que se cierran por el medio, num hiato de progresso...

Os imigrantes de cá e os emigrantes de lá, vão para acolá usufruir e fornecer o seu conteúdo ímpar, atemporal e exclusivo, mal reconhecido e pouco respeitado, como uma cultura “vira-latas”, recalcada em breves experiências imperfeitas, de grandes leigos, na sua maioria. Nepotismo, reserva de mercado, proteção matriarcal e “paitrocínio” que favorece o tal hiato, de retrocesso ou estagnação. As terras do “já teve”, que destronadas ou envergonhadas dos insucessos provocados e subsidiados, numa ignorância momentânea de duas três ou mais gerações, ficarão na história, descritas como fases de um processo. Como os retrocessos anteriores, comprovadamente retrógrados e improdutivos, são desmentidos pela volta do caminho pujante, na ciência comprovada e atualizada, que acelera ao moderno. Todos mudos, sem reconhecer o verdadeiro novo, por vergonha de terem insistido no falso antigo.

Finalmente vêm as empresas turísticas e suas sociedades fazerem a ligação hemisférica lógica entre estas duas irmãs lisboetas que, em ambas as margens atlânticas, de uma vez por todas se encontrem e simultaneamente transformem as suas modernidades próprias. As intelectuais, as empresariais, econômicas, linguísticas, culturais e, gastronômicas até...

Em épocas de incertezas diplomáticas bélicas, daquelas de novo retrocesso para reformular um processo, o antigo império português se reúne, por iniciativa própria, evitando assim quaisquer riscos externos. Uma sólida unidade reformada poderá garantir, seja lá qual substituição o sistema capitalista moderno sofrerá. Mercados novos se fundem, transversalizam e internacionalizam-se, como nas conexões telegráficas e ferroviárias observadas pelo Dom Pedro II, naquela grande transformação do século XIX descrita em 'Os Magnatas'1 dos EUA, com a grande feira mundial da Modernidade.

Agora, a ligação aérea moderna logo levará também à novas conexões marítimas de passageiros, que além de incrementar os setores turístico e imobiliário, também estimulará os setores exportadores e importadores. A distribuição de commodities, produtos industrializados, serviços e até das sucursais multinacionais, intercontinentais. Cinquenta anos depois, de um lado e, trinta anos depois do outro, espelharam-se finalmente estas irmãs atemporais, que se enxergam agora nos reflexos dos grandes modelos seguros, hospitaleiros, soalheiros e de bem viver, algum resto que aos seus povos, lhes falta e lhes sobra! Com todos os bem-vindos convidados, vizinhos de algures e alhures, respeitem as histórias nativas e não as burlem. Ou de novo, correm risco de serem terras do já era, e do já teve.

Notas

1 Morris, Charles Richard; Editora LPM, 5 de Janeiro, 2009.