Necessariamente, coisas, situações, pessoas, processos são comparados. A comparação leva ao clássico A = A, 1 = 1 ao se falar em igualdade. Estabelecer um ponto, um aspecto ou qualquer outra coisa, é o que leva a comparar. É a busca e o encontro de um denominador comum que, enfim, resulta da comparação. Tudo se inicia no arbitrário, desde que é um redutor de infinitas configurações, a comparação é sempre resultado de sobreposição de inúmeros contextos.

Tudo é átomo, tudo é matéria, tudo é energia são noções que permitem falar em igualdade, entretanto esses conceitos nada definem se não forem configuradas suas estruturações. O igual, o semelhante é sempre arbitrário visto que configurado por pontualizações. É mágico extrair interseção, pontos de encontro tanto de sistemas quanto dos processos vitais. Imaginar como começa uma doença, sua etiologia, desvincula inúmeros processos de seus contextos, embora também os evidenciem: são identificados padrões comuns ou prognósticos, mas também a evidência das idiossincrasias, das reações individualizadas de cada doente. Deter-se na história dos grandes encontros, dos grandes amores e a partir daí tudo entender, afirmar ou negar, é, às vezes, criar uma caixa de lembranças na qual processos vividos são rotulados e guardados. A lembrança, a memória é também um imobilizador de vivências. São as interseções desconfiguradoras.

O igual é sempre o diferente, desde que não é o mesmo. O outro, o idêntico, o semelhante ocupa outro espaço, outro tempo. As linhas homogeneizadas são responsáveis pelo estabelecimento de igualdades. A magia que as estabelece como padrão, estabelece também inúmeras diferenças. Sobrepor, acomodar como função são as tessituras da igualdade e da desigualdade também por deslocamento. Imaginar o igual e o diferente em um sistema cria hierarquias, tanto quanto desejos realizadores ou fantasias. As comparações revoltam (por exemplo, os clássicos dramas familiares dos filhos do meio - filhos sanduíche - comparados ora com o padrão A, ora com o padrão B) e despersonalizam, criando metas: vencer na vida, não viver mais, ser tão poderoso quanto o próprio patrão, ser igual ao sem teto que anda pelas ruas etc. são alguns exemplos.

Quando o ser humano se compara, busca ser igual ou ser diferente, o que primeiro acontece é a negação ou a aceitação do existente, da própria situação dada pela substituição dessa inclusão, ou não, como critério definidor de seu estar no mundo.

No contexto de negação da própria situação, o ser preto, ser branco, ser rico, ser pobre, feio, bonito, capaz, incapaz são sempre aderências, sempre adjetivos negadores e não configuradores da própria individualidade. Amparar-se em uma rede, estar seguro em seus nós de coesão é uma forma de privilegiar apoio e referenciais em lugar de aberturas, caminhos e possibilidades vivenciais.

Admitir que a base de igualdade é necessariamente a diferença, vai configurar surpresas: liberdade, ruptura de padrões, de critérios de ajuste e de realização valorizada pelos diversos sistemas mecanizadores e destruidores da individualidade humana.

Só é possível entender igualdades quando são equacionadas as diferenças, pois desse modo vários padrões igualitários possibilitam realização de diferenças, quebras de ajustes e de acomodações, e assim não mais é necessário arbitrar igual ou diferente.

Poder exercer suas possibilidades, exilando comparações - independente de classificações normativas - transforma todos os seres humanos em iguais no estar no mundo com o outro, na satisfação de necessidades, sobrevivência e vida. A identificação, a constatação da individualidade, da unidade é o que permite realização, é o que permite à família, à empresa, à sociedade o mundo dos iguais, tanto quanto os números, os tons, as cores, a luz, os processos físicos-químicos permitem as transformações, o descobrimento e as invenções.