Num ambiente que evoca facilmente o atelier de um pintor renascentista, vários artesãos tratam de refinar meticulosamente os últimos detalhes de uma reprodução em tamanho natural de um quadro de Goya. Do brilho da sua superfície ao jogo de sombras, passando pelas microfissuras do verniz, o fac-símile é visualmente tão perfeito que é quase impossível distinguir o «verdadeiro» do «falso».

Este exemplo levanta muitas questões, particularmente no que diz respeito à habitual presunção de que a cópia é necessariamente uma versão menor do original. As tecnologias da «rematerialização» das obras de arte, assim como os seus dispositivos expositivos, foram aperfeiçoadas a tal ponto que é legítimo que nos interroguemos se esta hierarquização continua a ser pertinente. Em todo caso, é esta a questão colocada por Adam Lowe e Bruno Latour num artigo provocador a propósito da colocação bem conseguida de uma reprodução do quadro As Bodas de Canaã no lugar do original : Queremos aprofundar a trajetória ou a carreira da obra de arte, para que seja possível passar de uma questão equívoca: «É um original ou apenas uma cópia?» a uma interrogação que consideramos decisiva, sobretudo no contexto atual da reprodução digital: «A obra está bem ou mal reproduzida?».

Seguindo este raciocínio, não há original sem cópias na era das tecnologias da reprodução digital. É, em grande parte, a nossa capacidade para distinguir e produzir cópias que confere originalidade a uma obra. De alguma forma, este desejo de questionar a natureza equívoca das reproduções ecoa as célebres análises de Arthur Danto sobre o papel desempenhado pelos fac-símiles no contexto da Pop art. De acordo com o autor, a originalidade de trabalhos como as Campbell's Soup Cans (1962) ou, mais especificamente, Brillo Box (Soap Pads) (1964) advém da sua capacidade de «transfigurar» objetos completamente banais em suportes artísticos.

Apresentados no contexto de uma exposição, totalmente desligadas da sua funcionalidade, estas cópias permitiam que Andy Warhol exprimisse uma visão original do mundo, especialmente sobre os hábitos de consumo na América do Norte dos meados do século XX, que desafiava as convenções estéticas da época. Estes fac-símiles em madeira e estas serigrafias apresentavam-se como demonstrações materiais de que os meios de reprodução implicam maneiras de fazer e ver as obras de arte que são intrinsecamente ambivalentes. Por um lado, estas obras dão a ver, de forma totalmente evidente, a materialidade dos objetos originais. Por outro lado, a sua simples presença num espaço expositivo desencadeia toda uma série de questões sobre o estatuto e significado destes objetos. Simultaneamente transparentes e opacas, a originalidade destas obras está precisamente nas tensões e nos paradoxos proporcionados pela sua semiopacidade.

Esta observação toma um rumo particular quando evocamos as imagens produzidas utilizando técnicas contemporâneas de reprodução e visualização. Quando comparadas com as imagens fotográficas originais, que eram vistas como garantia de transparência e de autenticidade, a fotografia digital só adquire a sua objetividade a partir do momento em que ocultamos que ela existe sob a forma de expressões algorítmicas, que ela não tem original. Sempre à mão e fácil de manusear, elas parecem destinadas a existir unicamente no imediatismo da sua aparição. Reveladas sobre um ecrã ou impressas sobre papel, a sua omnipresença equilibra a opacidade luxuriante do mundo contemporâneo: À medida que as nossas máquinas leem e escrevem cada vez mais sem a nossa intervenção, à medida que as nossas máquinas se tornam cada vez mais indecifráveis ao ponto de que ver já não é garante de saber (se alguma vez o foi), a nós, os denominados utilizadores, é oferecido cada vez mais para ver, mais para ler. À medida que as nossas máquinas desaparecem, ficando cada vez mais finas, a densidade e opacidade da sua computação aumenta. Toda a utilização comporta um ato de fé: acreditamos que estas imagens e sistemas nos tornam transparentes, não por motivos tecnológicos, mas sim por razões metafóricas e fortemente ideológicas.

Hoje, é a difusão de um grande número de fac-símiles — e o número de globos oculares que eles conseguem mobilizar — que confere às imagens o seu nível de originalidade.

Esta relação muda quando uma fotografia digital é apresentada num espaço expositivo no qual um fac-símile pode ser facilmente autenticado ou certificado como sendo original. Consideradas no contexto deste contrato estético, as fotografias convidam-nos a formas de contemplação que nos permitem, por vezes, entender níveis de realidades difíceis de alcançar. É esse o caso da exposição Cópia Original que, graças a uma série de replicações quase automáticas, revela a trajetória de uma ordinária tigela chinesa. Este trabalho oferece uma análise das realidades complexas e contrastantes que podemos encontrar inscritas num objeto banal que temos sempre «à mão». Olhamos; a nossa atenção declina. Olhamos novamente; outras coisas aparecem. Quanto mais focada é a concentração, mais os significados se soltam, como se o objeto existisse apenas naquela modulação repetida entre opacidade e transparência. Da alvorada ao crepúsculo, a nossa atenção gravita em torno dessa semiesfera como se ela fosse um planeta. No tempo das «fake news» e do «deep fake», Daniel Blaufuks recorda-nos que as relações que se tecem entre o original e a cópia têm os seus alicerces num sistema de crenças. Examinando a trajetória desta tigela, ele convida-nos para uma viagem meditativa através das zonas equívocas, ou «semiopacas», da verdade.

Texto de Joël Vacheron